Manter os povos vivos, controlar o clima e esculpir a superfície da Terra são uns dos mais importantes usos da água. A água é primordial para a vida dos seres vivos. Sem a mesma, planeta onde vivemos, certamente estaria morto, a exemplo de alguns outros do sistema solar.
Sabe-se no entanto, que o volume de água de nosso planeta é finito, havendo apenas um processo de reciclagem de todo esse volume, de responsabilidade do Ciclo Hidrológico, que não pode aumentar nem diminuir. Acontece que os seres vivos ao contrário da água, se multiplicam cada vez mais e portanto necessita-se de maior volume deste precioso líquido para a manutenção dos mesmos, o que é reconhecidamente impossível.
Atualmente somos cerca de 7 bilhões de pessoas na superfície da Terra, em 2050 seremos um total de 9 bilhões ou mais. Desse modo, a medida que a população cresce, há cada vez menos água disponível por indivíduo. Países como o Brasil e o Canadá, até então, não têm essa preocupação. Ao contrário da maioria de outros países, como acontece aos continentes Africanos, Asiáticos e Caribe, a situação chega a ser alarmante. Por volta do ano 2050, estima-se que mais de 4 bilhões de pessoas, portanto quase metade da população mundial, estarão vivendo em regiões com carência crônica de água.
Para muitos analistas, a escassez da água existente em diversas regiões do planeta, aliada a perda da biodiversidade e da mudança climática, são os problemas ambientais mais graves que o mundo encara neste século.
dispõe aproximadamente de 1,39 bilhões de km³ de água, conforme alguns estudiosos, que são distribuídos pelos mares, lagos, rios, lençóis subterrâneos, geleiras das regiões polares, neves e vapor d´água. Desse total, apenas 2,6% é o volume de água doce, do que dispõe os seres vivos do planeta, e destes 2,6%, as calotas polares e geleiras retém 1,984%, ficando apenas 0,59% com os aquíferos, e o restante 0,024%, que inclui as bacias hidrográficas, a biota, o vapor d´água e a umidade dos solos. Portanto fica bem claro que do volume de água total do planeta, 97,4% fica com os oceanos e outros mananciais salinos.
Ocorre que a poluição de nossos recursos hídricos é considerável, reduzindo ainda mais a água disponível ao ser humano e a outras espécies viventes. Assim, não há dúvida de que a poluição das águas ameaça grande parte do volume de água limpa que está disponível para a vida. A poluição principal e o desperdício vêm da Agricultura e da Industria e ainda dos dejetos dos seres humanos e de outros seres vivos.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, estima-se que hoje mais de 1,7 milhões de mortes anuais dos seres humanos, sejam causadas pelas águas poluídas. As crianças representam o universo que mais sofre com o problema dessa poluição, seja em consequência das diversas doenças adquiridas, como a diarreia p.ex. que provoca a desidratação, e a seguir a morte.
Estima-se que entre a década passada e esta em que estamos vivendo, ou seja, até 2020, praticamente, haverá o mesmo número de mortes de seres humanos pela Aids, quanto pelas doenças disseminadas pelas águas poluídas.
Ocorre que os problemas relativos à água, não estão somente relacionados a poluição e em consequência aos males provocados aos seres humanos. Não, os problemas são diversos, pois no caso da agricultura as situações aparentes são também muito graves. Sabe-se que a irrigação efetuada por métodos não satisfatórios, não só acabam por contaminar o solo com concentrações consideráveis de sal, mas também pelo fato de se perder um grande volume do precioso líquido. O desperdício da água com a agricultura chega em muitos casos a 60%, onde a irrigação é realizada pelo método de alagamento, o tradicional e o mais barato. Existem outros método mais eficientes como o pivô central que tem um aproveitamento em torno de 80%, mas que provoca ainda um desperdício muito grande de energia elétrica; outras tecnologias mais eficientes são usadas em países com melhor recurso financeiro, como é o caso da irrigação por gotejamento, que chega a mais de 90%, sua eficiência, no entanto isto ainda é muito pouco. No Brasil, na localidade de Ibiúna, em São Paulo, este método tem sido experimentado, e quiçá, poderá ser estendido para outras regiões agrícolas brasileiras. É bom frisar que apesar dos grandes problemas advindos com a irrigação, a agricultura não pode prescindir de seguir por estes caminhos, pois ela é fundamental para alimentar o mundo. Sabe-se que apenas 17% das lavouras mundiais são irrigadas, porém há necessidade de melhor atenção e cuidados por parte das autoridades, no sentido de dirimir essas consequências danosas. Por exemplo, porquê não investir massiçamente no reuso das águas para esta finalidade. Países mais ricos, já o tem experimentado, porém ainda é muito pouco, é o caso de Israel que desde 1987, tem usado águas tratadas na utilização da irrigação. Como pode se perceber, o segredo está no manejo mais eficiente da água, na reciclagem, e melhoria da drenagem, para que também o solo fique livre das impurezas deixadas por essas tecnologias.
E por que não atentar para a água das chuvas? Nas regiões tropicais, como é o caso do Brasil, ainda não se deu conta do tamanho do desperdício da precipitação pluviométrica, principalmente nos ambientes urbanos, já que no meio rural a situação é vista de outro modo. A água que cai generosamente sobre os telhados ainda é pouco aproveitada, lamentavelmente. Esta que no mínimo, pode ser usada para regar os jardins, lavar carros, pisos, etc. Para dirimir um pouco o descaso, em Curitiba, no Paraná, por exemplo, foi sancionada algum tempo atrás uma lei que obriga todos os novos condomínios residenciais a incorporar no projeto de construção, a captação, o armazenamento e a utilização da água da chuva para múltiplos usos, em substituição a água clorada. Como se vê, este é um grande passo que deve ser seguido por outras unidades da federação.
Para ilustrar os problemas danosos das irrigações mal planejadas, não é demais lembrar a situação que condenou a morte o grande mar de Aral, em uma área da antiga União Soviética, onde o clima é o mais seco da Ásia Central. Lá, desde os anos 1960, enormes quantidades de água para irrigação foram desviadas do mar de Aral, para fertilizar uma das maiores áreas do mundo para plantações de algodão e arroz. O resultado é que o canal de irrigação, o de maior extensão do planeta, de 1300 quilômetros, provocou altas taxas de evaporação e seca na região, causando assim um enorme desastre ecológico, econômico e de saúde. A partir daí a salinidade do mar triplicou, sua área retraiu quase 60% e perdeu mais de 80% de seu volume de água. Assim, milhares de pessoas que viviam da agricultura na região, empobreceram mais ainda e migraram para outras regiões. Este é um dos maiores exemplos do mal planejamento na área da agricultura que as autoridades mundiais e brasileiras inclusive, certamente de já, há muito devem estar atentas.
A propósito destes problemas, o saudoso e iminente Prof. Aldo Rebouças, um dos maiores especialistas do mundo, em água, já dizia que “mais da metade da água usada nas lavouras do Brasil é desperdiçada”.
Ainda assim parece que somos os maiores exportadores de água do planeta, a água que conhecemos como água virtual, aquela que não percebemos no simples olhar, mas que encontra-se retida em todos os produtos produzidos no Brasil. Por exemplo, na indústria do aço, para cada ton. produzida, são necessários 15 mil litros de água; na agricultura, para produzir um quilo de arroz gasta-se em média 1500 litros de água, e assim por diante. No final de todo o processo, essa água virtual representa um bom desempenho do Brasil, na balança comercial
Ainda com relação a agricultura, esta apresenta-se cada vez mais industrializada, e assim muitos produtos químicos são utilizados na melhoria e progresso da mesma. Com isso, os resíduos deste processo acabam por se introduzir no solo e posteriormente, a lixiviação sem outra alternativa, termina levando parte destes resíduos para os mananciais de água doce, contribuindo para a contaminação dos mesmos. É bem conhecido o fato do fosfato e do nitrato serem espalhados pelo solo, para acelerar o progresso das plantações, mas no final acabam por produzir efeitos desastrosos nos lagos, onde permitem a proliferação de algas, privando a oxigenação da água que é essencial para a vida aquática. Muitas vezes a água aparentemente limpa, pode conter um índice elevado de nitrato, que ao ser ingerido pelo ser humano pode produzir, principalmente, nas crianças a “síndrome do bebê azul”, que termina levando a asfixia e morte das mesmas. Quantidade microscópicas de muitos outros produtos químicos podem se concentrar na água que usamos para saciar a sede, depositando-se em nossos organismo, e produzindo assim, efeitos devastadores em relação a saúde.
A indústria por outro lado utiliza cerca de 20% de toda água doce consumida no planeta. Assim as indústrias químicas e de petróleo, bem como as de metal, madeira, papel, de processamento de alimentos, e outras, acabam por agravar também a contaminação das águas. Com isso, nos países em desenvolvimento 70% do lixo industrial é despejado “in natura” nas correntes fluviais e no solo, contaminando assim, os aquíferos, bem como as águas superficiais.
Dentre as substâncias lançadas pelas indústrias nos mananciais de água doce estão os poluentes orgânicos, que esgotam o oxigênio vital contido na água; metais pesados como chumbo, mercúrio e alguns outros produtos químicos mais perigosos, são os poluentes mais encontrados.
Muitas substâncias químicas são descartadas, caem nas águas superficiais ou acabam por penetrar no solo, e com o tempo, atravessam todas as camadas até atingir os lençóis subterrâneos. È muito comum acidentes do tipo: produtos petroquímicos dos tanques de postos de combustíveis vazarem e se alojarem em aquíferos. Em centros urbanos do Brasil, diversos casos desta natureza poderiam ser exemplificados.
Com relação as águas subterrâneas é importante dizer que os aquíferos são fontes renováveis, a menos que a água seja retirada mais rápido do que é reposta ou caso se torne contaminada.
Os aquíferos fornecem água para um quarto dos habitantes do mundo. Depender das águas subterrâneas tem vantagens e desvantagens. Por exemplo, são boas fontes de água para o consumo humano; é disponível praticamente o ano inteiro; é renovável, se não for bombeada em excesso ou se contaminada; e é mais barata para distribuição que a maioria das águas superficiais. Por outro lado, os aquíferos podem secar por excesso de bombeamento, casos mais graves têm ocorrido nos Estados Unidos, em grande parte do aquífero Ogallala, que atinge a região do Texas, também ocorrendo do mesmo modo no Central Valley californiano; podendo também provocar afundamento de terrenos quando a água é removida, caso já ocorrido no Brasil, em São Paulo, décadas atrás, levando várias residências à uma grande cratera; quando poluídos, não podem ser usados por décadas e até séculos; podem ainda sofrer intrusão de água salgada em regiões costeiras, como em algumas áreas do litoral brasileiro e inclusive no nordeste do Pará. Em poços profundos, exigem maior custo de energia.
Os lençóis freáticos estão diminuindo em muitas regiões do planeta, pois a velocidade com que a água é bombeada tem ultrapassado a velocidade de recarga natural. Para se ter uma ideia de tal problema, a China, a Índia e os Estados Unidos, estão passando por isto. Estes países são os maiores produtores de grãos do mundo, razão de tal situação.
O risco da falta global de água está levando vários cientista avaliarem aquíferos em profundidades de 0,8 quilômetros ou mais, como fontes futuras de água. Os resultados preliminares mostram que alguns contêm água suficiente para sustentar bilhões de pessoas durante séculos. Bom, isto é caso para um futuro, creio que ainda um pouco distante. Certamente o Brasil está longe de se preocupar com situação deste porte, pois aqui, apesar do excesso de perda de água, tanto de águas subterrâneas quanto superficiais, o caso passa por situação vergonhosa das autoridades. Não se concebe que em algumas cidades brasileiras as perdas cheguem a 60%, enquanto em termos internacionais não ultrapassa os 15% . Na Alemanha, isto fica pela ordem dos 8%, um exagero para aquele país que se pode considerar com excesso de preocupação com a sociedade.
Entre nós, os casos de perda excessiva de água, o mal uso, contaminação de aquíferos, a falta de abastecimento da população, o descuido dos mananciais superficiais que servem de fonte de abastecimento para o centro urbano, é muito preocupante. Espera-se da nova administração um pouco de maior respeito com a população, me refiro a nossa Belém do Pará.
* Oliver Brasil é geólogo.