Imagine uma cidade em que não existam caminhões de lixo passando pela rua nem se vejam, em nenhum lugar, lixeiras. O lixo passaria por tubos subterrâneos, desembocando num centro de reciclagem. Esta imagem está prestes a ser realidade em Barcelona, onde a experiência começou em 1992 com a Olimpíada. Desde então, o projeto vem sendo expandido.
Acontece nesta semana em São Paulo (onde ainda existe muito lixo na rua) o encontro dos prefeitos das 40 maiores cidades do mundo, ideia que surgiu em Londres e Nova York para compartilhar projetos ambientais e traçar uma ação conjunta.
É uma chance de conhecer alguns desses projetos, que revelam como a criatividade e a ousadia estão produzindo cidades mais inteligentes e saudáveis.
Mesmo quem não se importe com a sustentabilidade vai reconhecer que essas experiências são formidáveis exemplos da inventividade.
Por coincidência, Londres e Nova York, as cidades criadoras do encontro batizado de C-40, chamaram na semana passada a atenção mundial para ações que visam manter o ar mais limpo.
Nova York já tinha sido pioneira em banir o fumo de lugares fechados, inclusive bares e restaurantes. Agora, numa ofensiva ainda mais radical e polêmica, proibiram o cigarro em parques e na praia.
Para ser a cidade mundial do carro elétrico, Londres lançou oficialmente no dia 26 o projeto de instalar até 2013 uma rede de 1.300 postos de recarga. Este número supera o de postos de gasolina. Os indianos, aliás, estão prometendo o carro elétrico mais barato do mundo e imaginam que as ruas londrinas venham a ser o seu, digamos, grande test drive.
Londres prepara-se para projetar uma imagem de sofisticação ambiental, aproveitando o fato de, no próximo ano, receber a Olimpíada. A cidade teve a ousadia de lançar o pedágio urbano e está estimulando seus moradores a criar fazendas urbanas, plantando hortas em todos os lugares possíveis, especialmente sobre os prédios e as casas. O objetivo, nada modesto, é fazer com que a cidade produza o que consome ao mesmo tempo em que dissemina áreas verdes por todos os lados.
Tudo isso serve de inspiração para o mundo em geral e, em particular, para o Brasil, que vai receber a Olimpíada seguinte. Assim como ocorreu em Barcelona, a Olimpíada pode ser uma chance não apenas de melhorar uma cidade mas de elevar o seu patamar civilizatório.
O que essas cidades inovadoras fazem é justamente melhorar nossa percepção de civilidade. É o que sentimos quando vemos o prefeito de San Francisco, nos Estados Unidos, indo de bicicleta para o trabalho. Ou, no caso brasileiro, a Lei Cidade Limpa, em São Paulo, ou o sistema de transporte público de Curitiba. Poucas coisas são importantes para a imagem do Brasil como a disseminação do etanol, que acabou pondo o país na vanguarda tecnológica da indústria automobilística e química (produção do plástico verde, por exemplo). Em nenhum lugar do planeta existe um museu de arte tão ecológico como o de Inhotim, em Brumadinho (Minas Gerais), uma reserva florestal que virou um templo de arte contemporânea.
Na cidade de Calgary, no Canadá, graças a uma rede de energia eólica, o abastecimento do transporte público vem do vento. Na Dinamarca, as famílias que produzem sua própria energia ganham dinheiro do governo. Surgiram assim cooperativas de energia eólica. Por isso, Copenhague virou um modelo admirado mundialmente.
Na cidade de Linköping, na Suécia, todo o transporte público é movido com o que sobra das cantinas e restaurantes.
Colocar a inteligência no lixo é hoje uma das grandes e maravilhosas fontes da inventividade humana.
PS – Estou tendo a maior experiência ecológica da minha vida. Cambridge, onde moro, é um imenso jardim, onde podemos fazer quase tudo a pé ou de bicicleta. Aqui é um lugar em que o compartilhamento de carro deu certo e estimulou a invenção de chaves digitais. Prédios emprestam ou alugam suas garagens para as pessoas deixarem os carros compartilháveis. Coincidência ou não, minha gastrite crônica deu um tempo. Quanto mais inteligente a cidade, mais podemos usar a mais antiga das trações: a tração humana. Preparei uma seleção de projetos inovadores para as cidades, postos no Catraca Livre (www.catracalivre.com.br), além do detalhamento dos casos citados nesta coluna.
* Gilberto Dimenstein é colunista e membro do Conselho Editorial da Folha de S.Paulo e comentarista da rádio CBN, e fundador da Associação Cidade Escola Aprendiz – [email protected].
** Publicado originalmente no Portal Aprendiz.