Jerusalém, Israel, 10/6/2013 – Majda El Batsch tinha oito anos em junho de 1967 quando ficou sabendo da Guerra dos Seis Dias. “Não sabia o que significava guerra”, recordou. Mais de quatro décadas depois, esta palestina, agora jornalista, ainda tenta decifrar o significado do conflito. O israelense Yaki Chetz tem 68 anos, mas de certa forma continua sendo aquele paraquedista que lutou na guerra. O veterano realiza diante da IPS uma demonstração de uma situação de combate corpo a corpo.
Chetz e Batsch não se conhecem. O primeiro lutou na guerra, enquanto a segunda cresceu com ela. Ambos são claros exemplos de como o conflito bélico deixou marcas indeléveis em israelenses, palestinos e inclusive em outros povos da região.
No dia 5 de junho de 1967 Israel lançou uma guerra preventiva contra exércitos árabes que haviam se reunido em suas fronteiras. Em apenas seis dias os israelenses tomaram Jerusalém oriental, Cisjordânia, Faixa de Gaza (se retirou unilateralmente deste último território em 2005), o Deserto do Sinai (que devolveu ao Egito pelo acordo de paz de 1979) e as Montanhas de Golã, na Síria.
“Nós ouvíamos o rádio. Os homens pintavam as janelas e as mulheres faziam pão”, contou Batsch. Do terraço da casa de sua família, no bairro muçulmano da amurada Velha Cidade, se tem uma vista panorâmica, que revela o intrincado do conflito. Desse ponto pode-se ver inúmeras bandeiras israelenses, a mesquita de Al Aqsa, sagrada para os muçulmanos, a Cúpula da Rocha, local venerado por seguidores de Maomé e por judeus, e o Muro das Lamentações, vestígio do antigo Templo de Jerusalém.
Batsch não pode escapar nem de sua história nem de suas lembranças. Ainda mantém vivas na memória várias passagens engraçadas, como aquele esperançoso boato que percorreu a Cidade Velha no começo da guerra. “O exército do Iraque chegou para nos salvar”, diziam na época, equivocados, os palestinos. Chetz é mais frio. “As pessoas religiosas têm sentimentos por Jerusalém, mas, para nós, os soldados, é apenas uma cidade fronteiriça”, afirmou.
Depois da guerra de independência de Israel, em 1948, Jerusalém oriental foi conquistada e anexada pelo Reino Hachemita da Jordânia. O nascente Estado judeu estabeleceu sua capital no setor ocidental da cidade, situação que se manteve por duas décadas. Contudo, em 6 de junho de 1967, um batalhão de paraquedistas israelenses recebeu a missão de tomar o controle de uma pequena colina estratégica que dominava a terra de ninguém que dividia Jerusalém em duas. “A missão era a Colina da Munição, não Jerusalém, nem a Cidade Velha”, destacou Chetz.
Após cinco horas de combate corpo a corpo, 105 jordanianos e 35 israelenses estavam mortos, 18 deles do grupo de Chetz. “Tinha muito medo”, reconheceu. “Eu pensei: me restam apenas cinco metros para me salvar. Era pura sobrevivência. Morreram tantos soldados, tantos amigos. Me sentia desesperado. Não pensava em Jerusalém”, detalhou. Como um dos últimos sobreviventes do batalhão, Chetz se converteu em um herói acidental da batalha que selou o destino de Jerusalém.
Quando os paraquedistas entraram na Cidade Velha, as defesas jordanianas de Jerusalém oriental já estavam vulneráveis, e por isso houve poucos combates. “Entramos sem dar um único tiro”, recordou. Os palestinos estavam tão confiantes na vitória, que a derrota foi um duro golpe. “Lembro que minha irmã mais velha me dizia ter visto um soldado israelense, e os vizinhos a acusavam de mentir”, contou Batsch. Os palestinos “haviam escutado o presidente egípcio Gamal Abdel Nasser preparando-os para uma vitória. Não podiam aceitar ser derrotados duas vezes: a catástrofe de 1948 e novamente em 1967”, acrescentou.
Por outro lado, a certeza da derrota era tão grande entre os israelenses que o triunfo militar causou uma euforia nacional, exceto em muitos soldados. “Fomos rezar no Muro das Lamentações, mas, na verdade, me sentia muito mal”, disse Chetz. “As pessoas estavam impactadas. Os israelenses estavam ébrios da vitória, exibindo seus tanques e aviões”, pontuou Batsch.
Duas gerações mais tarde, crianças israelenses de sétimo grau cantam um hino patriótico que glorifica a abnegação de Chetz e seus camaradas, enquanto o antigo campo de batalha na Colina da Munição se converteu em santuário visitado por estudantes e recrutas. Chetz detém um grupo de soldados e lhes pergunta: “O que significa Jerusalém para vocês?”, e eles respondem em uníssono: “Alabada seas, Jerusalém, capital de Israel por toda uma eternidade. Nós, povo de Israel, te honramos”. Chetz concluiu que “eles lutarão por Jerusalém”.
Chetz e Batsch têm vidas e expectativas diferentes, mas com alguns pontos em comum. “Os judeus podem celebrar suas tradições, mas nós, cristãos e muçulmanos, temos que pedir permissão para irmos aos nossos lugares de oração. Essa é a lógica da ocupação”, lamentou Batsch. Nem Chetz nem Batsch são religiosos praticantes, mas provavelmente coincidam em que o conflito palestino-israelense por Jerusalém seja essencialmente nacionalista. Ambos desejam que a chamada solução dos dois Estados acabe com o conflito. Os dois querem a paz.
Porém, as diferenças não desaparecem. Chetz destaca que “há três mil anos de história” vinculados ao Muro das Lamentações, enquanto Batsch tem outra visão. “Para mim não importa a história nem a mitologia. Não se trata de quem viveu primeiro aqui, mas se posso viver com meus direitos em meu próprio Estado soberano”, enfatizou. Por sua vez, Chetz disse que “hoje, Jerusalém está unida e anexada, e essa é uma realidade”. E Batsch afirmou: “Os israelenses devem aprender com a história. Nenhum poder que domina outro dura para sempre”. Envolverde/IPS