Nas manifestações pelas ruas do Rio de Janeiro e no colorido da Cúpula dos Povos as pessoas e as organizações da sociedade civil gritaram, desenharam e sonharam palavras de ordem contra quase tudo. Enquanto isso, no Riocentro sucederam-se enfadonhos discursos de chefes de Estado que, por horas, ocuparam a tribuna para ler textos que pereciam ter sido escritos pelo mesmo ghost writer. O colorido das ruas substituído pelo monocromático das gravatas em discursos acanhados, como a explicar porque não tinham a coragem de sonhar com um amanhã menos cinzento.
As ausências de Barak Obama, Angela Merkel, David Cameron e Wladimir Putin, que juntos representam a maior parte do poder de decisão do planeta mostrou, ainda antes da conferência começar, que a diplomacia brasileira teria problemas em costurar um documento capaz oferecer alternativas ousadas para o futuro. Até mesmo o secretário geral da ONU, Ban Ki-Moon chegou a criticar a ausência de ambição do documento aprovado por 188 países, recuou após reclamações do governo brasileiro.
Uma das principais constatações sobre a reunião do Rio de Janeiro é que o multilateralismo talvez esteja enfrentando uma de suas maiores crises desde a criação da ONU após a Segunda Guerra Mundial. O documento “O futuro que queremos” não limita a ação dos países, mas deixa claro que faz quem quiser, ninguém será obrigado a ser sustentável.
No entanto, é sempre bom lembrar que o documento da Rio+20 representa apenas o piso, o mínimo que se pode fazer, mas não o máximo. O recado das ruas também foi confuso, sem nenhuma objetividade e, de forma generalizada, contra tudo e contra todos. É importante que se tenha em mente que cada governo individualmente, cada organização e cada pessoa pode avançar, ir além, trabalhar pelas utopias que sempre são as sementes de grandes realizações da humanidade.
Milhares de pontos de vista foram expressos durante os mais de 3 mil eventos paralelos realizados no Rio de Janeiro. Muitos deles pedindo atitudes enérgicas de governos para estabelecer a sustentabilidade por decreto, talvez até, atropelando a democracia. Outros argumentaram sobre a impossibilidade de mudanças dentro do sistema capitalista, sem levar em conta que os modelos socialistas também não ofereceram alternativas menos predatórias em relação ao meio ambiente.
A Rio+20 deixa um legado de discussões, talvez não com a urgência imposta pela crise ambiental, nem com o pragmatismo exigido pela crise financeira ou pela indignidade imposta pela miséria de milhões. No entanto, nunca tantos estiveram presentes em debates sobre estes temas, seja presencialmente pelas ruas e salões do Rio de Janeiro, ou pelas redes sociais, que amplificaram essas milhares de vozes milhões de vezes.
* A equipe da Envolverde, parceira de Carta Capital no projeto Carta Verde, atuou nesta conferência junto com 19 jornalistas de 9 países, que formaram o time de profissionais do Projeto TerraViva, uma iniciativa da agência Inter Press Service. Os textos e fotos deste especial contam com o apoio e a participação desses profissionais.
** Dal Marcondes é jornalista especializado em jornalismo econômico, diretor e editor responsável da Envolverde – Revista Digital e presidente do Instituto Envolverde.
*** Conteúdo produzido pela Envolverde e publicado originalmente no suplemento Carta Verde, na revista Carta Capital.