Além de causar destruição e desastres, as mudanças climáticas vão afetar a nossa saúde, quase sempre de maneira negativa. O recém-lançado relatório sobre “Vulnerabilidades das Megacidades Brasileiras às Mudanças Climáticas” traz um resumo detalhado de como será esse impacto para os paulistanos. Embora os pesquisadores não tenham conseguido ainda quantificar os danos, eles desenharam um cenário bem preocupante:
– aumento da concentração de poluentes – a fumaça dos carros e caminhões enche o ar de substâncias tóxicas. Além disso, essas partículas microscópicas flutuando no ar impedem a formação de nuvens e diminuem as chuvas – daí a garoa, que já foi marca registrada da cidade, estar desaparecendo. Sem garoas, o ar não limpa, e a concentração de poluentes aumenta mais ainda. A situação fica crítica nas estações mais frias, quando as condições meteorológicas da cidade impedem que os poluentes se dispersem. A mistura de frio com alta concentração de poluentes é especialmente letal, principalmente para pessoas mais frágeis, como bebês e idosos. Os mais pobres também tendem a ser mais impactados que os mais ricos, porque têm resistência mais baixa e, por usar transporte público, ficam mais expostos aos poluentes. “Quem emite mais é quem é menos impactado”, diz Paulo Saldiva, coordenador do Laboratório de Poluição Atmosférica Experimental da USP. Espera-se que milhares de pessoas a mais morram de pnemonia, bronquite e outras doenças respiratórias (mais sobre poluição e saúde aqui).
– variações bruscas de temperatura – pessoas abaixo dos 5 anos e acima dos 65 são mais vulneráveis a variações de temperatura, quando saem da “zona de conforto térmico”. Essa “zona” não é fixa para todos os humanos: depende da temperatura com a qual se está acostumado. Um dos efeitos das mudanças climáticas é que teremos variações mais bruscas e imprevisíveis na temperatura. Isso afeta a arquitetura do sono, desregula a produção de hormônios, afeta a pressão arterial e aumenta o estresse. No limite, pode matar – geralmente por enfarte. A cidade de Santos, a 80 quilômetros de São Paulo, enfrentou em fevereiro uma onda de calor letal: a temperatura chegou a 39 graus e 32 idosos morreram. Espera-se que episódios assim tornem-se cada vez mais comuns.
– chuvas e tempestades – além de provocar invernos mais secos (e poluídos), as mudanças climáticas estão tornando os verões mais chuvosos, com maior ocorrência de grandes tempestades. Os efeitos mais óbvios à saúde são os imediatos: mortes por afogamento, impactos de árvores que desabam e, principalmente, soterramento. Há também um outro risco grave que a cidade ainda não aprendeu a medir com precisão: o aumento nos atropelamentos, quedas de motocicletas, batidas de carros, tombos.
– doenças infecciosas – outro efeito das enchentes é a mair probabilidade de contrair doenças de veiculação hídrica nas semanas após as chuvas. Parasitoses intestinais, hepatites virais, leptospirose e enteroviroses devem se tornar mais frequentes. Além disso, a chuva e o calor criam condições perfeitas para a reprodução de mosquitos, que podem transmitir febre amarela, dengue e malária.
– alergias – o aumento na concentração de CO2 aumenta a liberação de pólen pelas plantas e a proliferação de fungos, fatores que disparam as alergias. As partículas provenientes do diesel, cuja concentração é cada vez maior no ar paulistano, agrava o problema, porque elas se ligam ao pólen e aos fungos e os levam aos pulmões. É de se esperar um aumento considerável nos casos de rinite alérgica e asma e na intensidade como essas doenças se manifestam.
– escassez e migrações – as mudanças climáticas deverão aumentar a aridez de várias regiões do Brasil, inclusive a do sertão nordestino, cuja precipitação pode cair abaixo do mínimo para sustentar vida. Quando isso acontecer, é de se esperar uma retomada das migrações para as periferias das grandes cidades, inclusive São Paulo (embora as capitais nordestinas devam ser mais afetadas). A chegada de uma população vulnerável deve colocar pressão no sistema de saúde de São Paulo.
Os autores do estudo também apontam para o fato de que a baixa qualidade do espaço público – muito trânsito, tempo demais se deslocando, falta de convívio, alto risco de desastres – podem afetar a saúde psicológica da população, aumentando a incidência de alcoolismo, depressão e suicídios.
*Publicado originalmente no site !sso Não é Normal