Recentemente os cientistas brasileiros, representados pela SBPC e ABC, lançaram um manifesto contra a aprovação, no Senado, do Código Florestal da Câmara. Independentemente do fato de o conteúdo do documento dos cientistas pertencer ao mundo das ideias, isto é, não propor mediações ou acordos entre o ideal e o real, ele vem assinado por 34 cientistas, pelo que contei. Só! Onde estão os outros? Porque os cientistas ainda não se mobilizaram e não fizeram um abaixo-assinado na internet com a assinatura de, digamos, 32% dos cientistas brasileiros?
No contexto da ebulição social que ocorre em todo o mundo, facilitada pelas redes sociais, acho que foi uma manifestação pobre, a dos cientistas brasileiros. Eles podem perder a chance de contribuir mais (com mobilização) para a construção de uma sociedade mais sustentável. A obrigação dos “sacerdotes da ciência” é apontar os caminhos e falar com autoridade.
Cito os cientistas como exemplo, mas todas as categorias, que hoje fazem o mundo se mover, precisam acordar para a fragilidade e seriedade do momento atual. É preciso perceber clara e inequivocamente que há um desequilíbrio econômico, social e ambiental, em escala internacional, e oferecer contribuições capazes de indicar o caminho para o equilíbrio. Incluo aí os jornalistas, pela centralidade do papel que desempenham.
Algumas lideranças e analistas internacionais têm apontado para uma ausência de governança global, atualmente, capaz de administrar a crise financeira internacional, nem ao menos paliativamente. O mundo sempre foi governado por algum império, algum poder central, em geral sustentado por forças econômicas e bélicas. Forças essas, geralmente substituídas em processos traumáticos, como a guerra.
Atualmente, há uma clara falência daquilo que se constituía na força de coesão da ordem internacional, que era o mercado financeiro, capitaneado pela maior economia do mundo. A quebra do sistema bancário coloca em xeque a governança global e obriga o mundo a debater quem ficará com o prejuízo. O problema é que o sistema financeiro vigente, ditado pelas regras do mercado, só poderia ser regulado por uma iniciativa de governança global, que já não temos de forma unívoca, como tínhamos há 30, 40 anos, nos áureos tempos para o FMI.
Não acredito que haja saída tranquila para a crise sem o engajamento de toda a sociedade, em movimentos como a Democracia Real (Ocuppy Wall Street), Avaaz e outros. Além de estudantes e militantes naturais de movimentos transformadores da sociedade, é preciso que empresários, juízes, políticos, professores, jornalistas e profissionais de todo tipo participem, debatam, pensem sobre as questões levantadas pelo movimento e proponham soluções. É preciso pensar teórica e praticamente, de forma coletiva, um novo modelo de governança global.
Temos pelo menos duas razões muito fortes para tomarmos as rédeas da história. Primeiro, não é mais possível que o mundo se submeta a impérios, que os povos sejam dominados pela força bélica ou econômica. Precisamos de uma governança global democrática, onde nenhum país ou nação seja excluído dos mecanismos de decisão, para mostrar que, afinal, a raça humana pode evoluir.
Ou seja, precisamos de juízes pensando e debatendo o direito internacional de forma profunda e justa, precisamos de políticos desenvolvendo mecanismos de governo internacional, professores debatendo e transmitindo o conhecimento de forma justa e equitativa, empresários desenvolvendo modelos de negócios éticos e transparentes, enfim, precisamos encontrar rapidamente um modelo que impeça a tomada do poder global pela força, como tem acontecido até hoje.
Em segundo lugar, é preciso lembrar que estamos vivendo um momento propício para isso, como nunca ocorreu na história da civilização. Há pouco tempo, me lamentava de nossa geração ter perdido o bonde da história, com o “fracasso” da geração 68. Mas hoje começo a achar que a oportunidade bate à nossa porta, novamente, com a incrível capacidade de mobilização que a nossa sociedade descobriu na internet, assim como com a fantástica capacidade tecnológica e científica da humanidade para propor soluções. O que nos falta?
* Celso Dobes Bacarji é jornalista e colaborador da Envolverde.