“Qualquer medida que se for tomar a respeito da Amazônia, tem de ser deliberada a partir de decisões que vêm de alta complexidade científica”, é o que concluiu o professor Marcos Buckeridge [biologista vegetal especialista em mudanças climáticas, atualmente é diretor científico do Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE)], um dos autores do próximo relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC). Segundo ele, a biodiversidade encontrada na região amazônica é tão variada que não permite que os estudos a seu respeito se limitem somente a pesquisas isoladas em cada campo do conhecimento.
Há muito tempo o debate acerca da interação entre os diversos fatores que permeiam a vida humana vêm sendo objeto de estudo entre muitos pesquisadores. Nesse sentido, para entender o funcionamento da natureza encontramos ao menos duas maneiras desenvolvidas: as pesquisas multidisciplinares, que executam trabalhos em paralelo, mas sem interação direta e que se encontram no chamado “modo 1”; porém, também existem as pesquisas transdisciplinares (ou de “modo 2”), que mantêm uma relação de paralelismo entre seus objetos de estudo, porém com interação entre eles e pressupõe participação da sociedade.
“A ciência no modo 1, chamada ‘normal’, é aquela em que alguém propõe uma hipótese, acha um resultado, descobre um mecanismo e consegue descobrir um determinado funcionamento da natureza”, aponta Buckeridge. Já no modo 2, continua, ela é chamada “transdisciplinar”, pois é voltada diretamente à sociedade, propondo uma nova visão cultural e sugerindo uma unidade entre os diversos campos do conhecimento.
Conectar campos do conhecimento
Ele explica que “à medida que a sociedade passou a compreender os produtos da ciência, ela passou a também interferir diretamente”. Dessa forma, as consequências são não apenas a compreensão mais completa da realidade concreta, mas também o aumento das complexidades para o entendimento de determinados sistemas.
Porém, esse avanço nas fronteiras da ciência não pressupõe um abandono das formas de pesquisas sem interação direta ou sem participação da sociedade. Buckeridge esclarece que “a ciência de modo 1, tem de continuar, pois se não tivermos este tipo de informação não conseguiremos fazer a ciência de modo 2”. Para ele, existe uma relação de necessidade de uma para outra, já que este tipo de avanço é uma ampliação do conhecimento especifico para o conhecimento geral.
O professor não hesita em afirmar que as muitas áreas de estudos podem e devem interagir diretamente. Sejam as ciências naturais, sociais, humanas ou aplicadas, ele aponta que “o que nós precisamos fazer para ‘nos tornarmos transdisciplinares’ é conectar os diferentes campos do conhecimento”.
O momento certo
Buckeridge, que é casado com uma jornalista, acredita que a imprensa tem papel fundamental nesse processo, já que ela é a responsável por realizar a “catarse de transferência de informação” – como ele define – entre cientistas e sociedade. Na avaliação estrutural do professor, tudo que é relacionado à ciência faz parte de um processo, e dessa forma, para que estejamos em contato, “temos de convencer empresas, igrejas, OSCs etc., e o conhecimento cientifico tem de ser digerido de forma particular por cada um destes sujeitos”. Daí a necessidade de um profissional de comunicação que leve estas informações de forma a dialogar corretamente com cada público.
“Existe um problema muito sério que é o da incerteza do dado cientifico e isso faz com que a confiabilidade na comunidade cientifica caia”, reconhece. Ocorre que, comumente quando o conhecimento científico é produzido existe uma forte tendência à sociedade depositar crença imediata por se tratar, supostamente, de uma nova descoberta e somente em um momento posterior é que se dá a fase da análise crítica. “Esse é um momento em que o nível de confiabilidade (na ciência) sobe, depois desce e então estabiliza”, define.
Buckeridge afirma que esta é uma grande responsabilidade que os jornalistas carregam: o momento certo de publicar a informação. “Se um texto científico não acabado vaza para um jornalista e este o divulga, começam a surgir decisões (baseadas no que foi publicado) e se tiver um erro na pesquisa isso pose trazer consequências sérias e irreversíveis”, alerta o especialista. “A ânsia do jornalista é sempre o furo, mas às vezes esse furo pode nos trazer sérios problemas”, finaliza.
* Alexandre Maciel é estudante de Jornalismo pela PUC-SP.
** Publicado originalmente no site Observatório da Imprensa.