Ramalá, Cisjordânia, 3/6/2011 – O fator tempo é essencial para implementar a solução dos dois Estados para o prolongado conflito palestino-israelense, já que as mudanças demográficas a deixam cada vez mais difícil, e não restaria outra solução a não ser a integração, que pode derivar em duas situações. Uma, que Israel estenda o direito de voto aos palestinos nos territórios ocupados, o que levaria ao fim do caráter judeu do país, ou se negar a fazer isto e instalar um regime de segregação.
Numerosos analistas alertam que, na atual conjuntura, corre risco a solução dos Estados após as conversações em Washington entre o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, e o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu. O Estado judeu “pode ser como o Titanic rumo ao iceberg”, afirmou Gershon Baskin, diretor israelense do Centro de Pesquisa e Informação Israel-Palestina.
“A solução dos dois Estados continua sendo possível apesar da realidade no terreno. Os assentamentos da Cisjordânia e de Jerusalém oriental podem ser desmontados, evacuados e entregues aos palestinos como ocorreu em Gaza com a retirada israelense em 2005”, disse Baskin à IPS. “Além disso, ainda se pode forjar um acordo com a Autoridade Nacional Palestina (ANP). Continuará colaborando com a comunidade internacional e com Israel, se este país mostrar flexibilidade”, acrescentou.
“Mas, se não se chegar a um acordo com o governo israelense, a próxima geração de dirigentes palestinos abandonará a solução dos dois Estados e pedirá que se estenda o direito de voto aos territórios palestinos. A alta taxa de natalidade dessa comunidade instaurará, de fato, um só Estado e será o fim da prevalência judia em Israel”, acrescentou Baskin. Este viaja frequentemente para a Cisjordânia e filma manifestações pacíficas contra a contínua expropriação de terras palestinas e a expulsão de civis de suas casas para a construção de assentamentos israelenses na ocupada Jerusalém oriental.
“Os atuais dirigentes palestinos são os mais moderados que Israel jamais verá, me dizem jovens sem filiação política com os quais costumo conversar. Afirmam que esse país recebeu a oferta mais generosa já feita. Estão dispostos a ficar com 22% da Palestina histórica e aceitarão que Israel fique com os 78% restantes”, acrescentou Baskin. Os palestinos eram maioria na região até que centenas de milhares fugiram ou foram expulsos pelas forças israelenses em 1948, quando foi criado o Estado judeu.
A última oportunidade para a solução dos dois Estados pode ser a de setembro, quando a ANP apresentar o caso na Organização das Nações Unidas (ONU). Os palestinos obterão uma vitória moral com o reconhecimento da Assembleia Geral, ainda que o Conselho de Segurança não dê seu apoio à iniciativa. O assunto também pode ser levado ao Tribunal Internacional de Justiça da ONU, entre outros órgãos. O fato pode motivar sanções contra Israel enquanto potência ocupante ilegal.
Acaba o tempo para a solução dos dois Estados, concorda Samir Awad, da Universidade de Birzeit, perto de Ramalá. “Cada vez mais é problemático. A proposta apresentada pelos israelenses está destinada a ser rejeitada pelos palestinos. Querem um Estado palestino sem Jerusalém oriental, sem o Vale do Jordão, sem direito ao retorno dos refugiados, com a permanência de muitos assentamentos judeus e, ainda, manter os controles das fronteiras e do espaço aéreo”, disse Awad à IPS. “A situação poderia ser resolvida se os norte-americanos pressionassem os israelenses, mas eles não farão isso. Mas, não podem ser ignoradas as realidades históricas. A história se inclinará para o lado dos oprimidos e dos que foram privados de justiça histórica. As pessoas precisam se lembrar disso”, ressaltou.
A composição demográfica de Israel mudou drasticamente nas últimas décadas. Os haredi, ou ortodoxos judeus, quase representam um quarto da população devido à alta taxa de natalidade. Partidos haredi de extrema direita, como o Shas, integram poderosas coalizões nos governos israelenses e ditam uma grande parte das políticas. A comunidade se caracteriza pela falta de estudos formais de seus membros e pela grande quantidade de desempregados, o que prejudica a economia do país. Além disso, um em cada cinco israelenses é de origem russa. Habituados a anteriores regimes autoritários, não estão dispostos a aceitar os palestinos como iguais.
A taxa de natalidade da minoria palestina em Israel supera a da maioria judia. É outra bomba de tempo se considerarmos “a ameaça demográfica” que supõem os territórios ocupados. Alguns membros do parlamento israelense fazem eco a esse argumento e afirmam que a sobrevivência de Israel pode depender da solução dos dois Estados. “Se esta solução fracassar, Israel enfrentará uma luta pelos direitos políticos como a da África do Sul”, disse em 2007 Ehud Olmert, na época primeiro-ministro de Israel. “Quando isto ocorrer, o Estado de Israel estará acabado”, alertou. Envolverde/IPS