Genebra, Suíça, 10/10/2011 – Os países menos adiantados (PMA), em sua maioria africanos, não são apenas vítimas de desastres naturais. Também sofrem pelas promessas comerciais esquecidas pelo Norte industrial. Há quase seis anos, na reunião ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC), em Hong Kong, foi assegurado aos PMA que seus produtos industriais poderiam entrar nos mercados das nações ricas livres de impostos e cotas.

Além disso, aos quatro produtores de algodão mais pobres da África ocidental – Benin, Mali, Chade e Burkina Faso – foi prometido que seriam reduzidos os subsídios algodoeiros dos países ricos, especialmente os dos Estados Unidos, que distorcem o mercado internacional. Outra promessa feita aos PMA falava em “isenções” comerciais em matéria de serviços, e foi sugerido que não se reclamasse deles novos compromissos. Todas essas promessas foram detalhadas na Declaração Ministerial de Hong Kong de 2005.

As negociações comerciais de Doha, no Catar, começaram em 2001 com o objetivo de reduzir as barreiras comerciais internacionais. Aos “daridra narayans” – termo criado pelo líder pacifista indiano Mahatma Gandhi para definir os mais miseráveis – do regime comercial mundial foi assegurado mais de uma vez que suas demandas seriam tratadas em cada reunião ministerial.

Lamentavelmente, há sérias dúvidas de que essas promessas sejam atendidas na oitava reunião ministerial da OMC, em dezembro próximo. “Os países africanos serão abandonados no encontro de dezembro, já que os temas centrais dos PMA, acesso a mercados livre de impostos e cotas, e algodão e serviços, não serão tratados”, disse um diplomata africano que pediu para não ser identificado.

Bangladesh, país coordenador dos PMA na OMC, continua acreditando que possa haver um avanço na reunião ministerial. “Ainda esperamos que nossas prioridades sejam adequadamente refletidas no resultado da oitava reunião”, disse o embaixador de Bangladesh, Abdul Hannan.

Liderando os países em desenvolvimento, Brasil, China, Índia e África do Sul, entre outros, repetidamente destacam a necessidade de se conseguir um acesso real a mercados livres de impostos e cotas para dar “credibilidade à OMC. Qualquer tentativa de encarar estes temas na organização carecerá de credibilidade se não se começar com os membros mais pobres”, disse o embaixador Faizel Ismail, enviado comercial da África do Sul à OMC.

“Os países em desenvolvimento da OMC concordam que a oitava conferência deve, ao menos, emitir um forte sinal de que os membros mais fracos devem ganhar alguma coisa do sistema comercial, mesmo com as conversações de Doha paralisada”, disse Martin Khor, diretor-executivo do Centro do Sul, com sede em Genebra, organização não governamental criada pelo ex-presidente da Tanzânia, Julius Nyerere (1964-1985).

As negociações comerciais de Doha estão bloqueadas devido às diferenças entre Estados Unidos e outros países industrializados, de um lado, e as potências emergentes Brasil, China, Índia e África do Sul, por outro. Washington quer que estes países em desenvolvimento assumam compromissos maiores, considerando seu atual crescimento econômico e status no sistema comercial mundial. Porém, as nações do Sul se negam a aceitar as demandas unilaterais, dizendo que proporcionarão acesso a mercados e outros compromissos apenas por meio da Agenda de Desenvolvimento de Doha.

Com vistas à próxima reunião ministerial, os Estados Unidos e outros países industrializados deixam claro que não serão tratados temas como acesso livre de impostos e de cotas, bem como a questão da redução de subsídios para o algodão, que leva à miséria países africanos, a menos que China e outras nações emergentes façam o mesmo.

“O pacote dos PMA, particularmente o acesso a mercados livres de impostos e de cotas, e o algodão, está paralisado”, disse o embaixador Luís Manuel Piantini Munnigh, da República Dominicana, presidente do grupo informal de países em desenvolvimento. “É lamentável que algumas nações insistam em discutir o pacote dos PMA somente se seus temas de acesso a mercados forem tratados primeiro”, disse à IPS.

Sob o mandato de Doha, depois ratificado pelo acordo marco de julho de 2004 e pela Declaração Ministerial de Hong Kong de 2005, os compromissos de abertura de mercados e de redução de subsídios estão claramente especificados. A Declaração diz que “os membros industrializados e em desenvolvimento que se declaram em posição de fazê-lo, acordam implementar um acesso a mercados livres de impostos e de cotas para os produtos dos PMA” até 2008.

Também afirma que os países industrializados “que tenham dificuldades neste momento para proporcionar acesso a mercados como consta mais acima, deverão fornecer um acesso livre de impostos e cotas a pelo menos 97% dos produtos originados nos PMA”. Com exceção dos Estados Unidos, todas as nações do Norte aderiram, mais ou menos, a este compromisso. Países em desenvolvimento como Brasil, China e Índia continuam proporcionando acesso a mais de 90% dos produtos industriais dos PMA. Envolverde/IPS