Johannesburgo, África do Sul, 22/8/2013 – Enquanto a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) discute qual é a melhor maneira de fazer a região avançar, um manejo eficiente da água é fundamental para alcançar esse objetivo, segundo o professor Anthony Turton, um dos principais especialistas em políticas hídricas da região.
A SADC tem um ambicioso plano de desenvolvimento regional de US$ 500 bilhões, que aspira para desenvolver as rodovias, ferrovias e portos desta área africana. A geração de eletricidade e a criação de linhas de comunicação e sistemas meteorológicos também são considerados pontos importantes para o crescimento destes países. Em conversa com à IPS, Turton enfatizou a importância da cooperação regional em matéria hídrica.
IPS: Quais antecedentes de cooperação existem que, por um lado, sejam expressão de êxito e, por outro, de ineficiência e corrupção?
ATNHONY TUTON: Frequentemente, a África austral é citada no setor da água como o melhor exemplo de cooperação hídrica em manejo de recursos transfronteiriços no mundo. O Protocolo da Água da SADC é o documento principal para a integração regional do bloco, e tem o mesmo papel que os acordos originais sobre carvão, ferro e aço tiveram na criação da Comunidade Econômica Europeia e, depois, da União Europeia. Daí que a cooperação em matéria de água compartilhada na SADC seja alta. Quanto à corrupção, o melhor caso foi o de Masupha Sole, alto executivo do programa hídrico das Terras Altas do Lesoto, que foi condenado e preso por fraudes envolvendo importantes empresas construtoras nas décadas de 1980 e 1990, algumas delas sul-africanas. Esse caso se converteu em um dos primeiros no mundo a receber uma condenação, por isso suponho que, na realidade, é uma boa notícia.
IPS: Em termos práticos, lhe vem à mente algum projeto futuro ou potencial sobre água na região?
AT: Em grande escala há importantes projetos de transferência entre bacias, com o das Terras Altas do Lesoto, entre Lesoto e África do Sul, o Norte-Sul em Botsuana, o Oriental na Namíbia, e o Cunene-Cuvelai entre Angola e Namíbia. Outro projeto interessante é a primeira grande usina dessalinizadora em Trekopje, na Namíbia. Creio que esta será a primeira de muitas na região da SADC.
IPS: Acredita que a mudança climática seja uma ameaça real para a região? Se for, como pode ser o seu impacto?
AT: Em poucas palavras, sim. É provável que a concentração de gases-estufa eleve as temperaturas do ar até quatro, e talvez seis graus em algumas partes da África austral, assumindo que um aumento mundial de dois graus é o “aceitável”. Isto alterará de modo fundamental a conversão de chuvas em resíduos líquidos, mas também aumentará as perdas por evaporação das represas. Uma estratégia adequada de mitigação é o Armazenamento e Recuperação de Aquíferos (também conhecido como Recarga Administrada de Aquíferos), que agora é uma tecnologia predominante em lugares como os estados norte-americanos da Califórnia e do Texas e a Austrália, mas que ainda não tem um uso generalizado na região da SADC. Atualmente, trabalho com um fornecedor australiano de tecnologia para introduzir isto em Botsuana: armazena-se água sob o solo em lugar de represas, o que impede a perda por evaporação, melhorando muito o rendimento sustentável de um determinado sistema.
IPS: Por que é necessário que os países da SADC cooperem em matéria hídrica?
AT: Os quatro países mais diversos economicamente na África austral estão muito limitados hidricamente (África do Sul, Botsuana, Namíbia e Zimbábue), enquanto em alguns dos Estados vizinhos há água em abundância (Angola, República Democrática do Congo e Zâmbia). A água é para a SADC o que o carvão, o minério de ferro e a energia foram para a criação da Comunidade Econômica Europeia (que se converteu na União Europeia). A cooperação hídrica na África austral habilitará que a integração regional mitigue estes riscos, permitindo que a segurança hídrica, alimentar e energética estejam garantidas no âmbito regional mais do que no nacional. Envolverde/IPS