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“Agricultoras, heroínas da segurança alimentar”

Jane Karuku, presidente da Aliança para uma Revolução Verde na África. Foto: Cortesia Agra

Bulawayo, Zimbábue, 16/5/2012 – As mulheres são maioria entre os produtores, processadores e vendedores de alimentos da África, porém, seu papel nesse ramo de atividade é secundário devido a barreiras culturais e sociais. Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), elas são maioria na produção agrícola mundial e são responsáveis por mais de 50% dos cultivos. Na África subsaariana essa proporção é maior, pois as mulheres produzem entre 80% e 90% dos cultivos.

A FAO aponta que as mulheres são as provedoras de alimento da família em um contexto limitado e de atitudes que conspiram para subestimar seu trabalho e suas responsabilidades, e dificultam sua participação nos processos de decisão. Segundo Jane Karuku, presidente da Nova Aliança para uma Revolução Verde na África (Alliance for a Green Revolución in Africa – Agra), a situação deve mudar para que este continente tenha alimentos suficientes.

Karuku, empresária queniana com 20 anos de experiência, se converteu em abril na primeira mulher a presidir essa organização, dedicada a melhorar a segurança alimentar na África e promover a solidez econômica de milhões de pequenos agricultores e suas famílias, com cem projetos em 14 países. Antes, foi subdiretora executiva da Telkom Kenya, subsidiária da France Telecom-Orange.

IPS: Considera que sua designação seja um ponto de inflexão para as mulheres africanas?

Jane Karuku: Como primeira mulher a presidir a Agra, é uma honra defender a causa das incansáveis mulheres que trabalham no campo. São as verdadeiras heroínas desta história, e espero destacar suas importantes contribuições para a segurança alimentar no futuro.

IPS: As políticas de segurança alimentar reconhecem o papel das mulheres na produção, no processamento e na venda de alimentos?

JK: Há importantes indícios de avanços entre os pequenos agricultores, na maioria mulheres que constroem vidas prósperas para elas e suas famílias. Mas alguns êxitos são desiguais. As pequenas agriculturas e empresárias rurais do continente não participam nem se beneficiam igualmente da agroeconomia por problemas de gênero derivados de questões culturais e sociais. Isto deve mudar para transformar a capacidade de autoabastecimento da África e alcançar a qualidade de vida desejada para as famílias rurais e as comunidades da África subsaariana.

IPS: Quando assumiu, a senhora disse: “A pequena agricultura é um estilo de vida na África, cheia de desafios, mas também de grandes oportunidades”. Como conseguirá um equilíbrio em matéria de segurança alimentar?

JK: Meu objetivo é retirar os obstáculos que impedem que os pequenos agricultores melhorem a produtividade e sua renda de forma significativa, salvaguardar o meio ambiente e promover a igualdade de gênero. Estou comprometida em assegurar-lhes uma ampla variedade de opções para seu trabalho.

IPS: O que considera necessário fazer para melhorar a situação dos pequenos agricultores?

JK: Desejo um continente próspero no qual a segurança alimentar esteja garantida por um rápido crescimento agrícola sustentável, baseado nos cultivos básicos que produzem os pequenos agricultores. A missão da Agra é promover uma “revolução verde africana” única, que transforme a agricultura em um sistema altamente produtivo, eficiente, competitivo e sustentável, assegure a disponibilidade de alimentos e tire milhões de pessoas da pobreza.

IPS: O que a Agra deve fazer para ajudar os pequenos agricultores a enfrentarem o impacto da mudança climática sobre a produção de alimentos?

JK: A Agra e seus sócios procuram determinar o tipo de salvaguardas ambientais que os agricultores necessitam para aumentar a produção e melhorar sua qualidade de vida. Ao se concentrar em práticas de desenvolvimento sustentável, a organização pretende reduzir a degradação ambiental e conservar a biodiversidade. Recuperar os solos e contribuir para que os pequenos agricultores produzam mais em áreas reduzidas contribuirá para reduzir a pressão de limpar e cultivar em florestas e savanas, o que ajudará a preservar o meio ambiente e a biodiversidade. As práticas agrícolas sustentáveis da Agra incluem a melhoria do solo mediante uma gestão integrada de sua fertilidade. Utilizamos uma combinação de fertilizantes e insumos orgânicos, e técnicas apropriadas para os recursos e as condições locais. Ao fomentar o uso de enfoques agroecológicos na gestão de cultivos e solos, como a utilização de doses mínimas de fertilizantes em zonas áridas, a Agra evitará o possível abuso, que prejudica o meio ambiente.

IPS: O que pensa dos fundos destinados à pesquisa na África?

JK: A pesquisa é fundamental para conseguir o máximo da cadeia de produção agrícola. A produtividade aumentou 140% no mundo nas últimas décadas, mas na África subsaariana diminuiu. Isto se deve ao fato de a agricultura ter mudado pouco.

IPS: Qual impacto tem a Agra na África e quais as perspectivas de futuro?

JK: O enfoque da Agra para ajudar os pequenos agricultores a saírem da pobreza é único. Ao se concentrar em sementes, solos, acesso ao mercado, políticas e associações e um financiamento inovador, a organização faz com que a agricultura de subsistência seja uma atividade comercial, viável e sustentável que aumente a produção no continente. Espero continuar buscando oportunidades de inovar para melhorar a qualidade de vida dos agricultores. Envolverde/IPS