Arquivo

Agricultores de Mali lutam por suas terras

Cheickné Bah, um agricultor de Yelimané na região Kayes do sudoeste do Mali. Foto: PAM/Daouda Guirou.

 

Bamako, Mali, 25/9/2012 – Em meio à grande instabilidade política de Mali, um grupo de pequenos agricultores recorre à justiça para recuperar suas terras, porque, segundo dizem, foram adquiridas por grandes investidores privados. A iniciativa legal coincide com a perda de interesse dos investidores estrangeiros neste país africano, devido à insegurança causada pela rebelião armada no norte.

“Apresentamos uma demanda pela monopolização de terras agrícolas que prejudicou muitos agricultores”, disse Lamine Coulibaly, membro da Coordenação Nacional de Organizações de Camponesas (CNOP), que luta contra a agroindústria. A próxima audiência será no dia 27, na cidade de Markala. Com esta iniciativa esperam colocar um freio na monopolização das terras que cultivam há várias gerações.

“Já houve várias audiências sem verdadeiras deliberações, mas confiamos no sistema judicial. Estamos convencidos de que temos razão e que podemos ganhar”, destacou Coulibaly. O processado é o Serviço de Níger, órgão estatal encarregado do desenvolvimento de uma área alagadiça de um milhão de hectares quadrados na região central.

O enorme potencial agrícola de Mali pode ser atribuído a uma represa construída pelas autoridades coloniais francesas em 1932. Porém, quando chegaram os investidores estrangeiros em 2008 só estavam desenvolvidos cem mil hectares. A região se abriu aos capitais privados em detrimento dos agricultores locais, que denunciam que perderam suas terras. “As expropriações foram feitas para dar lugar a projetos agropecuários. O governo assinou acordos destinando terras a investidores para enormes iniciativas, como a líbia Malibya, que cobre cem mil hectares”, detalhou Coulibaly à IPS.

Os agricultores afirmam que cerca de 800 mil hectares são afetados por este problema. A demanda objetiva outro projeto, o da açucareira de Markala (Sosumar), à qual foram entregues 25 mil hectares para plantar cana-de-açúcar. “Trinta e três povoados em Sana (região de Ségou) foram vítimas da empresa”, disse Massa Koné, um dos que apresentaram a demanda. Segundo a CNOP, da vasta extensão de terras destinada à Sosumar, foram criadas apenas duas plantações de cana-de-açúcar, de 140 hectares cada.

Os pequenos agricultores aplaudiram a partida da Illovo Sugar, um dos principais participantes da Sosumar. O site da CNOP diz que a companhia sul-africana se retirou do projeto devido à crise sociopolítica que sofre o país. “Mas os pequenos agricultores não podem cultivar”, reclamou Koné à IPS. “Os investidores privados cercaram os campos e mantêm as plantações”, ressaltou.

O processo judicial complica um ambiente já difícil para o investimento na região. O projeto Malibya ficou paralisado desde a queda do líder líbio Muammar Gadafi em 2011, apesar do fim das obras viárias e um canal de 40 quilômetros. Os agricultores estão preocupados pela segurança alimentar e pelo futuro dos produtores familiares que vivem de seus cultivos em todo país. No entanto, Bubacar Sow, diretor-adjunto do Serviço de Níger, afirma que seus temores são infundados.

Com ajuda de investidores privados, na verdade, o governo está desenvolvendo terras para distribuir entre os agricultores. “Os cem mil hectares desenvolvidos pelo governo foram colocados à disposição dos operadores familiares, que produziram 564 mil toneladas de arroz no ano passado”, afirmou.

Segundo Sow, a oposição dos pequenos produtores aos investidores privados só serve para entorpecer os esforços do governo para ampliar a área desenvolvida. Também disse que as zonas oferecidas aos capitais estrangeiros estavam desocupadas. “As pessoas foram convidadas a viver e se assentar na área com as melhorias realizadas pelo Serviço de Níger”, acrescentou. Enquanto defendem seu caso na justiça, os agricultores mantêm o diálogo com grandes investidores do Serviço. Em algumas aldeias, puderam negociar o direito de cultivar em campos que haviam perdido há três anos. Envolverde/IPS