Aumento da temperatura já diminuiu produção de trigo e milho, o que pode alterar valor e reduzir a quantidade de comida consumida por habitantes de países mais pobres.
Já se imaginava que futuramente as mudanças climáticas poderiam ter efeito no rendimento de colheitas e plantações, mas cientistas das universidades de Columbia e Stanford descobriram que as reações às alterações ambientais podem estar mais perto do que se acreditava.
O estudo, realizado por David Lobell, professor de Sistemas Ambientais, Wolfran Schlenker, economista de Agricultura, e Justin Costa-Roberts, estudante de Computação, apontou que se, durante o período de 1980 a 2008, as mudanças climáticas não estivessem ocorrendo, as produções anuais de trigo e de milho seriam 33 milhões de toneladas (5,5%) e 23 milhões de toneladas (3,8%) maiores, respectivamente.
“Eu trabalhava com a possibilidade de que não conseguiríamos detectar mudanças até 2020 ou 2030”, declarou Gerald Nelson, economista de Agricultura do Instituto Internacional de Pesquisas em Políticas Alimentares, que não participou do projeto. “Estas coisas estão acontecendo agora”, enfatizou Lobell.
A temperatura média da terra aumentou menos de um grau nos últimos 30 anos, e à medida que as alterações climáticas continuam, agricultores terão que se adaptar, cultivando variedades de alimentos resistentes a um clima mais quente, e algumas plantações terão que ser deslocadas para regiões onde as temperaturas sejam mais baixas. O resultado do estudo sugeriu que há cerca de 5% de perda no rendimento das colheitas para cada grau de aumento.
Os pesquisadores concluíram também que essa perda contribuiu para o aumento no preço, de 20%, que os alimentos tiveram nesses 30 anos. Apesar de muitas análises anteriores apontarem para um mesmo cenário, o estudo de Lobell se difere de trabalhos prévios em alguns pontos importantes.
Um estudo publicado em 1994, por exemplo, indicava que o efeito fertilizante do dióxido de carbono provavelmente contrabalancearia os efeitos negativos do aumento das temperaturas em latitudes baixas nas próximas décadas. De acordo com o professor, “nosso trabalho não sugere isto”.
A mesma análise também apontou que o aquecimento do clima poderia atingir a produção de alimentos em países emergentes mais gravemente do que nas nações desenvolvidas, pois estas geralmente se localizam em regiões mais frias do planeta e poderiam se beneficiar com as temperaturas mais altas, além de serem mais adaptáveis às condições de mudança.
No entanto, o estudo de Columbia e Stanford indica outra direção. Em vez do panorama traçado pela pesquisa de 1994, a produção relativamente alta por unidade de área nos países industrializados significaria, na verdade, que as nações desenvolvidas são mais suscetíveis às adversidades climáticas. Países mais pobres, por outro lado, têm uma baixa taxa de produção e são mais afetados por outros fatores, como a disponibilidade de fertilizante.
Prejuízos para a saúde
Além dos prejuízos econômicos que a queda no rendimento das safras pode causar, há ainda as consequências que os efeitos do aumento da temperatura nas plantações podem causar à saúde da população. Sobretudo nos países emergentes, onde a variação no custo dos alimentos determina ainda mais a quantidade de mantimentos que os habitantes vão comprar, o aumento no preço da comida pode levar a desnutrição e doenças.
O problema se agrava ainda mais se for levado em consideração que, dos quatro alimentos que são as principais fontes de ingestão diária de calorias – milho, trigo, arroz e soja –, dois já apresentam uma perda de rendimento em suas colheitas. “Há milhões (de pessoas) que gastam uma grande parte da sua renda em comida, e um acréscimo no preço faria com que elas reduzissem o consumo de alimentos”, ressaltou Lobell.
Para o pesquisador, adaptar a agricultura às alterações climáticas é essencial para que se possa abastecer a crescente demanda de alimentos do planeta. “A adaptação não é algo para o futuro, mas sim uma coisa que precisamos agora”. Ele destacou o potencial da biotecnologia e da engenharia genética para desenvolver novas variedades que sejam mais resistentes ao calor, mas disse que ainda há muito trabalho pela frente nessa área.
Felizmente, alguns países já estão criando iniciativas no setor. Os Estados Unidos, por exemplo, investiu US$ 60 milhões, em fevereiro, em três estudos sobre os efeitos das mudanças climáticas em plantações e florestas.
O estudo Climate Trends and Global Crop Production Since 1980 (10.1126/science.1204531) de David Lobell e outros, pode ser lido por assinantes da Science.
* Publicado originalmente no site CarbonoBrasil.