As rotas de navegação estão se abrindo no derretido Oceano Ártico, primeiro passo para explorar os recursos da região boreal.
Berlim, Alemanha, 26 de setembro de 2011 (Terramérica).- A possibilidade de explorar os outrora inacessíveis recursos naturais do Oceano Ártico fica mais tangível com o degelo do Polo Norte, para escândalo dos cientistas europeus. Recentes observações do Instituto Alfred Wegener de Pesquisa Polar e Marinha (AWI) e da Universidade de Bremen confirmam que o degelo do Ártico medido há cinco anos foi especialmente grave neste verão boreal.
O aquecimento do Polo Norte foi tão pronunciado que tanto a passagem do Noroeste, no território canadense de Nunavut, como a rota do Mar do Norte, ao longo da Sibéria, estão livres de gelo. “A particularidade do verão de 2011 é que até mesmo o Canal de Parry (em Nunavut) está aberto e quase sem gelo”, disse ao Terramérica o cientista Georg Heygster, do Instituto de Física Ambiental da Universidade de Bremen, na Alemanha, que gerou mapas das camadas de gelo utilizando dados obtidos pelo satélite Aqua, da agência espacial norte-americana.
“A camada de gelo derrete a tal velocidade nas margens, que permite que os raios solares esquentem a água que está por baixo, o que acelera o degelo”, explicou ao Terramérica o físico e oceanógrafo Rüdiger Gerdes, do AWI, com sede na cidade costeira de Bremerhaven. “Esta situação não nos surpreende, pois corresponde à tendência observada desde 2007”, acrescentou Gerdes. “Contudo – prosseguiu –, é grave, porque não só está diminuindo a extensão das camadas de gelo como também sua espessura”.
“Estas circunstâncias criam novas oportunidades de uso econômico do Ártico”, como a pesca, o transporte e a indústria extrativa, sobretudo de gás e petróleo, afirmou o cientista. E esses interesses econômicos já se fazem sentir. Entre julho e setembro, passaram pelo Ártico três enormes cargueiros.
O Sanko Odyssey, maior navio que fez essa rota, transportava 68 mil toneladas de minério de ferro. O navio-tanque Wladimir Tichonow precisou de apenas sete dias e meio para atravessar o Estreito de Bering desde a ilha Nova Zembla, e com essa velocidade superou o recorde de outro navio semelhante, o STI Heritage, que em julho havia percorrido quase o mesmo trecho em oito dias.
Segundo dados das autoridades russas de transporte marítimo, cerca de 20 navios utilizaram a mesma rota este ano. Para avaliar as consequências ambientais dessas atividades, Gerdes, Heygster e cerca de 30 pesquisadores de nove países europeus criaram um grupo de trabalho que se reuniu pela primeira vez no dia 5, em Bremen.
No Access, sigla de Arctic Climate Change, Economy and Society (Mudança Climática, Economia e Sociedade do Ártico), Gerdes e seus colegas buscam respostas para três perguntas: como se desenvolverão o transporte, o turismo, a pesca e a exploração mineral no Oceano Ártico no futuro imediato? Quais riscos para a natureza e a humanidade que esse desenvolvimento pode apresentar? Quais são as regras necessárias para reduzir esses riscos?
Além do AWI, estão associados ao Access o Instituto Kiel para a Economia Mundial (Alemanha), o Centro Aeroespacial Alemão e a Universidade Pierre e Marie Curie, da França. Também existem vínculos de trabalho com o intergovernamental Conselho Ártico e com o Centro do Ártico, da Universidade de Lapland, da Finlândia. “Nossa principal preocupação é regulamentar as atividades econômicas possíveis no Ártico e oferecer opções de política na região aos governos europeus”, disse ao Terramérica a porta-voz da Universidade Pierre e Marie Curie, Claire de Thoisy-Méchin.
“A mudança climática no Ártico causará graves impactos nos ecossistemas marinhos e nas atividades humanas. Em nosso trabalho daremos especial atenção à sustentabilidade ambiental dessas atividades, em estreita cooperação com os povos indígenas locais”, acrescentou Claire. Porém, armadores e outros atores do transporte marítimo indicam que, para a passagem do Noroeste e a rota do Mar do Norte serem efetivamente utilizáveis, será preciso um forte investimento em infraestrutura, como portos e estações de combustível e de provisões, ao longo de quase seis mil quilômetros.
Além disso, apesar do contínuo degelo, as circunstâncias atuais ainda são imprevisíveis. Por exemplo, em sua recente passagem pelo Ártico, o Sanko Odissey esteve acompanhado por um quebra-gelo atômico russo. “O problema principal para o transporte marítimo nessa região boreal são os pedaços de gelo à deriva, que podem provocar enorme concentração que mesmo um navio tão grande com o Sanko Odissey não consegue remover”, explicou Gerdes.
No entanto, a tendência do derretimento é clara. É quase certo que não haverá gelo no verão ártico em 2029, estimam os cientistas. Para Gerdes, o atual degelo também está influenciado pela chamada “oscilação multidecadal atlântica”, fenômeno cuja existência é motivo de controvérsia científica e que, segundo seus defensores, se caracteriza por uma mudança periódica das temperaturas das águas superficiais do Atlântico Norte. “Estamos passando por uma fase quente dessa oscilação”, acrescentou.
* O autor é correspondente da IPS.
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Universidade de Bremen, em inglês e alemão
Instituto Kiel para a Economia Mundial, em inglês e alemão
Centro Aeroespacial Alemão, em inglês e alemão
Universidade Pierre e Marie Curie, em francês, espanhol e inglês
Conselho Ártico, em inglês
Centro do Ártico – Universidade de Lapland, em inglês e russo
Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.