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Ambientalistas pedem a Hollande governo mais verde

Painéis solares em um posto de combustível, exemplo da mescla energética da França. Foto: A.D.McKenzie/IPS

Paris, França, 15/5/2012 – Enquanto o presidente eleito da França, François Hollande, se prepara para formar um novo governo, ambientalistas pedem a designação de um ministro da Ecologia com verdadeiro poder para cumprir a promessa de reduzir o uso de energia nuclear e as emissões de carbono. “Queremos um ministro forte, que tenha a energia de dentro de sua pasta”, declarou Marc Mossalgue, porta-voz da Rede de Ação pelo Clima-França, que reúne organizações não governamentais preocupadas com a mudança climática e dedicadas à proteção ambiental.

Mossalgue disse à IPS que as ONGs querem ver um “claro mandato” de Hollande para que seu ministro da Ecologia não seja ofuscado por seus colegas da Indústria e da Economia. “Os desafios exigem que o futuro ministro também seja capaz de lidar de forma efetiva com temas relacionados a moradia, transporte e energia”, acrescentou Mossalgue. A anterior titular da pasta, Nathalie Kosciusko-Morizet, tinha limitada autoridade no governo do presidente Nicolas Sarkozy, que perdeu para  Hollande nas eleições do dia 6. As decisões sobre temas de energia ficavam na órbita do Ministério da Indústria, segundo observadores políticos.

“Kosciusko-Morizet nunca pode fazer valer suas convicções. Colocou-se do lado errado, e isso foi muito ruim para ela”, comentou Joël Vormus, administrador de projetos de energia e meio ambiente do Comitê de Liaison Energies Renouvelables, rede não governamental de mais de 200 profissionais em toda a França. “A primeira promessa que queremos de Hollande é a de realizar um debate público sobre as futuras políticas energéticas da França. Nunca foi tema de debates e todas as ONGs estão esperando por isso”, destacou à IPS.

O socialista Hollande anunciou que fechará a central atômica de Fesseheim, a mais antiga do país, com 35 anos, localizada no nordeste e composta por dois reatores. Contudo, essa promessa não se concretizará até o fim de seu mandato, em 2017. Propôs ainda reduzir a quantidade de eletricidade nuclear, que passaria de 75% para 50% do total até 2030. Isto significa fechar metade dos 58 reatores existentes no país. Hollande também declarou que deseja reduzir as emissões de dióxido de carbono em até 30% até 2020 com relação aos níveis de 1990, superando dessa forma a meta da União Europeia, de 20%. “É um objetivo ambicioso, porém realista”, opinou Vormus.

Entretanto, outros especialistas em energia não esperam que Hollande faça muitas transformações no curto prazo, considerando o alto custo que significaria uma mudança para as energias renováveis e o impacto que teria na conta de eletricidade dos consumidores, sobretudo em meio à atual crise econômica.

“Não esperamos muitas mudanças nos próximos cinco anos”, afirmou Roy Cameron, chefe da divisão de desenvolvimento nuclear da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômicos (OCDE). O setor atômico “continuará sendo um contribuinte significativo na mescla energética” da França, disse à IPS. Países como este “devem determinar quanta capacidade têm para enfrentar os maiores custos de uma mudança para energias renováveis, e se estão dispostos a impor aumentos nos preços da eletricidade, como está ocorrendo na Alemanha, por exemplo”, acrescentou.

A União Francesa de Eletricidade divulgou um informe em novembro, indicando que, caso se reduza o uso de energia atômica em 50%, serão necessários 60 bilhões de euros extras em investimentos para cobrir a demanda projetada de energia elétrica, enquanto aumentariam em 30% as emissões de carbono. Além disso, o preço da eletricidade dispararia 50%”, ressaltou Cameron. No entanto, as ONGs preferem os custos monetários às “graves e irreversíveis consequências para o homem e o meio ambiente” que poderia ter um acidente em uma usina nuclear, para usar as palavras de Kosciusko-Morizet após o desastre da central japonesa de Fukushima, no Japão, no ano passado.

“Naturalmente, pode-se usar esse argumento, mas o acidente que mais pessoas matou no mundo foi o colapso de uma represa, e não de uma usina nuclear”, argumentou Cameron, referindo-se à explosão, em 1975, de um dique na China. Nessa tragédia morreram 30 mil pessoas e milhares faleceram depois por epidemias derivadas da catástrofe. “Sob qualquer termo de comparação os impactos na saúde sempre são muito menores no setor nuclear do que em outras tecnologias”, assegurou Cameron. Inclusive “contando os custos reais de reassentamento e a perda de renda em caso de um acidente”. Também afirmou que os estudos da OCDE demonstram que os governos e os clientes estão mais preocupados com a “segurança do fornecimento de energia”.

“Os cidadãos não ficam felizes se ligam a luz e a lâmpada não acende, ou se abrem a ducha e a água sai fria”, apontou Cameron à IPS. “A segurança do fornecimento é, em geral, o tema que, em nossos estudos, vimos que motiva mais os governos. A política sobre mudança climática é algo secundário”, afirmou. E acrescentou que o novo governo francês deverá avaliar se pode “assumir uma meta sobre mudança climática sem afetar a segurança do fornecimento e também garantindo acessibilidade”.

Mesmo sendo fechada a usina de Fessenheim, Hollande já aceitou a finalização de um controvertido terceiro reator na usina de Flamanville, noroeste do país, e também expressou sua opinião sobre a construção de outro reator em Penly. O Flamanville 3 EPR (Reator Pressurizado Europeu) gerará inclusive mais energia do que Fessenheim, o que significa que, de todo modo, a França manterá sua capacidade atômica, afirmam analistas.

“O número de reatores continuará sendo o mesmo por enquanto”, disse Pierre Terzian, editor do boletim internacional sobre energia Petrostrategies. “Entretanto, definitivamente, Hollande investirá mais em energias renováveis, provavelmente estimulando a eficiência energética e não autorizando a construção de novas usinas nucleares”, acrescentou. Envolverde/IPS