Estamos o tempo todo tentando descobrir oportunidades de bons negócios. E, quanto mais cedo descobrimos, melhor. Queremos nos antecipar aos acontecimentos, ao futuro. Em nosso planejamento, construímos cenários, fazemos projeções lineares, muitas vezes sem perceber que são simples extrapolações do que conhecemos no passado. Imaginamos rupturas meio a contragosto. Buscamos sinais de mudanças no que se vive hoje. Mudamos… Mas sempre em torno de um núcleo relativamente grande representado por tudo o que achamos que não vai mudar.
Sim. Fazemos tudo isso e muito mais. Mas, com muita frequência, somos surpreendidos: uma megacrise financeira mundial, tecnologias inclusive sociais que mudam a dinâmica do mercado. E, cada vez mais, reações da própria natureza, enquanto não decidimos, globalmente, o que mudar em nosso modo de viver. Seria tudo isso consequência de simples miopia? Ou trata-se de uma deficiência mais complexa que exige lentes multifocais?
Eis algumas “lentes” diferentes para refletir sobre o futuro de forma mais ampla:
1) a lente das necessidades não atendidas que carregamos até hoje: até que ponto elas poderão nos levar a uma megacrise no futuro?;
2) a lente das necessidades do futuro: o que não estamos conseguindo ainda enxergar?;
3) a lente dos serviços críticos: até que ponto vamos precisar de mais solidariedade para ter mais equilíbrio no mundo?;
4) a lente das possibilidades futuras: até que ponto a ciência e as novas tecnologias abrirão possibilidades que não vemos hoje?;
5) a lente da diversidade: até que ponto a visão dos “mundos dentro de mundos” (diferentes faixas etárias e classes sociais, por exemplo) nos fará sair das soluções pasteurizadas nos negócios e na gestão pública?;
6) a lente dos jogos políticos, sociais e econômicos: as distorções que causam tenderão a piorar ou melhorar?;
7) a lente das megacrises anunciadas: até que ponto a decisão de ouvir, genuinamente, sem preconceitos e prejulgamentos, os alertas recorrentes dos cientistas poderá nos ajudar a evitá-las ou esvaziá-las?;
8) a lente do livre pensar: se projetarmos os tempos à frente de forma mais solta, sem interesse utilitário e sem a pressão de “estarmos sempre certos”, o que poderemos enxergar?;
9) a lente do que as pessoas buscam como ideal de vida: até que ponto a busca de objetivos que transcendam o meramente econômico (de PIB para FIB, por exemplo) nos fará prever um futuro muito diferente das “projeções tradicionais”?;
10) a lente da evolução da consciência humana: até que ponto a busca de uma parcela cada vez maior da humanidade por significado vai moldar o futuro de todos?
E se, em nossas sessões de “planejamento estratégico”, imaginarmos o futuro por essas lentes? Surgirão propostas que transcenderão nosso core business atual? Constituiremos reservas para investir, não em reposição de ativos úteis no passado, mas para testar de forma concreta, não só no papel, um futuro muito diferente e com mais possibilidades?
* Oscar Motomura é diretor geral da Amana-Key, empresa especializada em inovações radicais em gestão. Contato: [email protected].
** Publicado originalmente no site EcoD.