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Apenas com leis não se enfrenta a mudança climática na África

Vendedores de lenha. A agricultura itinerante pôs em perigo a selva do distrito de Karonga, no norte de Malawi. Foto: Mantoe Phakathi/IPS
Vendedores de lenha. A agricultura itinerante pôs em perigo a selva do distrito de Karonga, no norte de Malawi. Foto: Mantoe Phakathi/IPS

Bulawayio, Zimbábue, 5/6/2014 – Os países africanos têm muitas leis para proteger o ambiente, mas ainda não conseguem fazer com que sejam cumpridos os instrumentos legais que respondem aos desafios apresentados pela mudança climática, alertam vários pesquisadores. “A maioria dos países africanos tem boas leis ambientais, mas são tão boas no papel quanto más em sua implantação”, afirmou à IPS Samuel Ogalla, gerente de programa da Aliança Pan-Africana de Justiça Climática (Pacja), uma coalizão de organizações da sociedade civil do continente.

Em muitos Estados há leis que, por exemplo, punem os que contribuem para o aquecimento global. O desmatamento é um grande desafio na hora de implantar os programas da iniciativa de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação de Florestas (REDD+) porque, embora o corte seja ilegal, nada se fez para oferecer fontes alternativas de energia, ressaltam os pesquisadores.

Houve um impulso para tentar familiarizar os legisladores africanos em questões de mudança climática e para ajudá-los a redigir leis adaptadas às realidades locais, mas as leis existentes não são suficientes para enfrentar a mudança climática. “Os países africanos devem ir além de escrever leis ambientais – e implantar as existentes com mecanismos de controle, acompanhamento e verificação – se pretendem que o continente atenda os problemas vinculados à mudança climática e outras questões ambientais que a região enfrenta”, destacou Ogalla.

O Zimbábue é um exemplo disso. Segundo a Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática (CMNSUCC), este país tem uma das legislações mais exaustivas em matéria ambiental, mas também tem enormes dificuldades para cumprir seus compromissos com a REDD+ devido às várias décadas de desmatamento.

A Fundação Heinrich Böll Stiftung para o Sul da África, vinculada ao Partido Verde da Alemanha, afirma que o continente carece de um contexto legal integral e que isso “pode significar um obstáculo para a implantação de respostas adaptativas e possivelmente aumente a vulnerabilidade de certos grupos, como mulheres e pobres”. Apesar de campanhas para conscientizar sobre a mudança climática, houve “menos investimentos em aspectos legislativos”, ressalta a organização.

Segundo os pesquisadores, isso relegou tudo o que diz respeito à mudança climática à periferia das políticas públicas quando se exorta os países africanos a adaptarem a realidade nacional às convenções internacionais das quais são signatários, como a CMNUCC. As leis devem ir além de punir os que praticam desmatamento ilegal e os contaminadores e atacar a raiz do problema, destacou Charles Ndondo, diretor da Carbon Green Africa, uma empresa que facilita a geração de créditos de carbono mediante a validação de projetos de REDD+ no Zimbábue.

“Sempre houve leis para atender os problemas relacionados com a mudança climática se considerar a Lei Florestal e outras vinculadas ao ambiente”, apontou Ndondo. “O único problema é que são leis punitivas e não atacam a causa da mudança climática. A Lei Florestal proíbe cortar madeira para usar como combustível, mas não oferece alternativas” energéticas, ressaltou.

A organização Trade Law Centre, com sede na África do Sul, declarou em suas recomendações a blocos regionais como Comunidade de Desenvolvimento da África austral, Comunidade da África Oriental e Mercado Comum para a África Oriental e Austral, que as limitações para os países desse continente na hora de implantar estratégias de sucesso contra a mudança climática são “os débeis contextos legais e institucionais”.

Segundo a organização, “as legislações nacionais e regionais podem permitir aos países da região construir sua capacidade de adaptação e reduzir sua vulnerabilidade aos efeitos da mudança climática”. Esses são os “engarrafamentos” que os legisladores africanos vinculados à Organização Global de Legisladores para o Equilíbrio Ambiental (Globe International) “tratarão de abordar”, disse Innocent Onah, diretor da Globe Nigéria.

A Globe International vai realizar sua cúpula mundial na Cidade do México, entre 6 e 8 deste mês, para impulsionar um contexto legal climático que promova o desenvolvimento sustentável, com participação de parlamentares do continente africano. “Embora seja certo que sem leis sobre mudança climática muito ficaria sem ser feito em escala local, creio que mesmo quando estas existem, se não há capacidade para implantá-las ou fazer com que sejam cumpridas, voltamos ao ponto de partida”, destacou Onah à IPS.

“O contexto legal é uma das ferramentas que os governos podem usar para conter os problemas causados pela mudança climática na África, mas o principal problema não é a falta de leis, mas a de recursos e de vontade política para implantar as políticas e normas vigentes”, insistiu Onah. Para o diretor da Globe Nigéria, “os parlamentares de diferentes países têm distintos graus de competências ambientais”, mas Ogalla apontou que não necessariamente a resposta é ter mais leis.

“São redigidas mais leis sobre questões ambientais no continente, mas o irônico é que com todas as que existem a África ainda é muito vulnerável à mudança climática e a outros problemas ambientais”, ressaltou o gerente do Pacja. Adaptar os acordos internacionais ao âmbito nacional permite que “os países avancem com ações nacionais distintivas e de acordo com as medidas coletivas em escala internacional”, afirmou o Instituto Internacional para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento. Envolverde/IPS