Não sei se o governador Geraldo Alckmin acredita nisso mesmo, é um gozador ou só está mal assessorado na área de comunicação. Mas alguém deveria dar um toque que certas declarações não pegam bem. De acordo com o UOL Notícias, após viagem inaugural em um novo trecho da linha 4-amarela do metrô de São Paulo, ele afirmou que, entre viajar em vagões cheios e ficar preso no trânsito, a população escolhe a opção número 1. “As pessoas preferem ir um pouco mais apertadas para chegar em casa mais cedo.”
Fiquei esperando o “Há! Peguei vocês!” logo na sequência. Mas não veio.
O crescimento da malha metroviária de São Paulo não deveria vir acompanhada de um aumento suficiente de trens para abastecer a rede? Sim, mais isso é só um detalhe que passa despercebido em datas festivas na Paulicéia, com grande concentração de políticos e Aspones, como a inauguração de estações de metrô. Pode parecer que não, mas a população não gosta desses maniqueísmos. O do governador foi sutil, mas teve o mesmo DNA de “ou você aceita este leite em pó carunchado na merenda escolar e se dê por satisfeito ou vai tomar água da pia e ficar quieto!”.
O metrô transporta hoje 4,1 milhões de pessoas e deve chegar a 4,5 mi até o final do ano. E o governo estadual promete investir em tecnologia para reduzir o tempo entre as composições. A ver… Um amigo-jornalista me cobrou de uma frase que escrevi há tempos, que o metrô em Sampa só cresce em ano de eleições. É a mais pura verdade. O problema é que a linha 4-amarela está tão atrasada que ultrapassou o cronograma de ano eleitoral.
Em janeiro deste ano, Alckmin deu outra declaração gozadora ao afirmar que “obras não ficam prontas em 24 horas”, justificando-se sobre a falta de eficácia de ações contra enchentes. Como se ele não tivesse nada a ver com o transbordamento da cidade, apesar de já ter sido governador antes e o seu partido comandar o Estado há 16 anos. Quantos mandatos são necessários? Mais quatro, oito?
Em tempo: a inauguração das estações Luz e República deveria ser usada para celebrar a memória dos que morreram na construção da linha 4-amarela. Em janeiro de 2007, sete pessoas foram engolidas por uma cratera aberta no local da estação ainda em obras. O consórcio Via Amarela (nomes aos bois: Odebrecht, OAS, Queiroz Galvão, Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Alston) chegou a culpar as grandes forças do universo pela tragédia.
E não só. Em outubro de 2006, um operário morreu soterrado após um túnel de 25 metros de profundidade na futura estação Oscar Freire desabar. Os responsáveis pela obra, na época, negaram-se a dar qualquer justificativa. Em fevereiro deste ano, um engenheiro de um empreiteira terceirizada morreu eletrocutado com uma descarga de 20 mil volts enquanto trabalhava nas obras da linha 4. O Metrô informou que, “por intermédio do Consórcio Via Amarela, tomará todas as providências cabíveis e dará todo o apoio necessário à família”.
Na hora de encontrar responsáveis por óbitos, de discutir obras apressadas ou mal feitas, políticos e assessores que usam trens só em dia de inauguração desaparecem rapidamente, feito os ratinhos que vivem entre nos túneis, entre os trilhos.
E eles dizem que críticas como essas são injustas, pois as coisas estão mudando em São Paulo. De acordo com Thiago Guimarães, pesquisador do Instituto de Transportes e Logística de Hamburgo e um grande especialista em mobilidade urbana paulistana, “o metrô fica cada dia mais cheio e mais insuportável; a prefeitura aumenta a tarifa do ônibus e cobra pouco pela melhoria do nível de serviço dos ônibus, que continua dominado por um oligopólio; a cidade continua crescendo de modo desordenado; a economia sobe, a renda aumenta, o preço dos carros cai”. Mudando sim, para pior, com um passo para frente a cada salto para trás.
Investir de verdade em transporte público em detrimento ao individual? Com essa quantidade de carros sendo desovada das fábricas em nome do desenvolvimento e IPI baixo? Pra quê? Pra quem?
* Publicado originalmente no Blog do Sakamoto.