
Como um vegetariano convicto se converteu à ideia de que carne e outros derivados de animais podem ser saudáveis, ambientalmente apropriados e éticos.
Quando nos juntarmos em torno das mesas de Natal este ano, muitos de nós vamos ter convidados vegetarianos. Em algumas famílias diversas dietas coexistem pacificamente. Em outras, bem… Talvez exista um tio obcecado por saúde que gosta de ficar avisando que “a carne vai te matar”. Ou um universitário idealista ansioso por falar aos mais velhos sobre os detalhes de crueldade e danos ambientais causados por criadouros de animais. Ou onívoros que ressentem a sugestão de que eles deveriam se preocupar ou se sentir culpados por comer carne.
Apesar de criado em famílias onívoras, na juventude eu cheguei à conclusão de que a carne era culpada por problemas de saúde, destruição ambiental e crueldade com os animais. Ainda assim, eu não penso mais que vegetarianismo é a resposta para estes problemas. Agora – como criador de gado –, eu acredito firmemente que comidas vindas de animais podem ser saudáveis, apropriadas ambientalmente, e éticas.
Eu abri mão de carne quando era calouro de biologia depois de ouvir que o consumo de carne estava desmatando a Amazônia. Fui vegetariano por quase uma década, quando comecei a trabalhar como advogado ambiental focado em poluição agropecuária. A princípio, meu novo emprego – passar por fazendas e pesquisar sua água, ar e contaminação do solo – reforçou minha rejeição à carne. Mas, na medida em que estudei produção alimentícia ecológica, aprendi que animais eram essenciais para fazendas sustentáveis, que não utilizam combustíveis fósseis e químicos.
Vida se alimenta de vida
Animais podem aumentar a fertilidade do solo, contribuir para o controle de pestes e ervas daninhas e comer vegetação não comestível para humanos. E quando visitei dúzias de fazendas tradicionais baseadas na pastagem e conheci os fazendeiros, vi administrações ambientais impressionantes e animais de fazenda vivendo vidas boas. Como qualquer observador atento da natureza sabe, a vida se alimenta de vida. Todo ser vivo, de mamíferos, aves e peixes a plantas, fungos e bactérias, come outros seres vivos. Humanos são parte da cadeia alimentar, mas para os artífices da cremação e caixões cuidadosamente lacrados, todos nós vamos eventualmente ser reciclados em outras formas de vida. É natural que pessoas, como outros onívoros, participem desta cadeia comendo animais. E é eticamente defensável, desde que não causemos sofrimento gratuito.
Isto não significa que eu fechei meus olhos para preocupações sobre carne moderna, laticínios e produção de ovos. Agropecuária industrial cria galinhas, perus, porcos e vacas leiteiras em um confinamento triste e superlotado, alimentados por sistemas automatizados. A maioria recebe antibióticos frequentemente na comida ou água para mantê-los vivos e agilizar seu crescimento. Nos Estados Unidos, 80% dos antibióticos hoje são usados na agropecuária. No pior dos casos, operações intensivas abarrotam porcas grávidas, galinhas botadoras de ovos e vitelos em jaulas tão restritivas que os animais mal podem se mover.
Mas nem todas as formas de criação de animais devem ser vistas da mesma forma. E é simplesmente impreciso sugerir que uma dieta vegetariana é necessária para uma saúde boa. Apesar de pesquisas sobre saúde e nutrição terem rendido resultados diversos e contraditórios, existe um consenso na corrente principal de especialistas: consumo exagerado de carne, laticínio e ovos pode ser perigoso, mas a dieta ideal para humanos inclui alimentos derivados de animais.
“Alimentos provenientes de animais têm um papel importante em garantir a saúde ideal, e seu consumo é particularmente importante para mulheres em idade reprodutiva, fetos e crianças pequenas”, afirma um artigo de 2010 sobre pecuária publicado pela Stanford University, a Organização para Alimentos e Agricultura das Nações Unidas e outras cinco outras organizações respeitáveis.
Suplementos nem sempre funcionam
Até grupos vegetarianos geralmente aconselham seus seguidores a tomar suplementos nutricionais porque a maioria dos vegetarianos tem deficiência de vitamina B-12, encontrada quase que exclusivamente em alimentos provenientes de animais, e porque o corpo humano é bem menos capaz de utilizar formas de ferro e zinco encontradas em plantas. Um novo estudo da Universidade de Minnesota levanta uma recente dúvida sobre a sabedoria de confiar em pílulas para ferro e outros nutrientes. Ele descobriu que mulheres de meia-idade que tomaram suplementos nutricionais – especialmente ferro – tinham expectativa de vida menor do que as que não tomaram.
Ao mesmo tempo, muitas crenças populares sobre os lados ruins de alimentos de origem animal relacionados à saúde estão sendo revelados como mitos. O colesterol, por exemplo. Pesquisadores da Harvard School of Public Health concluíram que comer comidas que contêm colesterol não afeta os níveis de colesterol no sangue. Em resumo, comer alimentos derivados de animais não é um risco à saúde, apenas o consumo exagerado o é. Impactos ambientais também diferem dramaticamente dependendo de como e onde animais são criados. Quando os animais são criados dispersos na fazenda, ao invés de concentrados e confinados, e podem pastar ao invés de se alimentar apenas de soja e milho, e são integrados às operações da fazenda ao invés de segregados, eles permanecem saudáveis e trazem benefícios ambientais.
Além disso, animais, que criam alimentos de alto valor, geram frequentemente fazendas mais ecologicamente corretas e mais viáveis economicamente. Sem os animais o movimento em prol da sustentabilidade na produção de alimentos não teria grandes chances de sucesso.
Do meu ponto de vista, em uma fazenda de gado na Califórnia, eu rejeito a sugestão de que animais deveriam ser banidos de fazendas e de nossos pratos. Preocupações com saúde, meio ambiente e ética alimentar não requerem o abandono da carne. O que eles requerem é uma nova ética de se alimentar de animais: uma baseada em moderação, atenção e respeito.
* Nicolette Hahn Niman é fazendeira, advogada especializada em meio ambiente e escritora.
** Publicado originalmente no site Opinião e Notícia.