Nova York, Estados Unidos, 20/8/2012 – Ativistas de todo o mundo estarão presentes esta semana na cidade norte-americana de Tampa para protestar contra o desamparo e a fome que sofrem milhões de pessoas no planeta. Os protestos, previstos para acontecerem de hoje até o dia 26 nessa cidade do Estado da Flórida, são organizados para chamar a atenção sobre a agressiva postura do opositor Partido Republicano, que exige reduções de impostos para os ricos e cortes na assistência social para os mais pobres e a classe trabalhadora.
Os republicanos realizaram no dia 17, em Tampa, sua convenção nacional para designar formalmente Mitt Romney como candidato presidencial para as eleições de novembro. “Vi gente que não se alimentou durante cinco dias. Isto está acontecendo no país mais rico do mundo”, disse à IPS o cofundador da organização Food Not Bombs e organizador dos protestos desta semana, Keith McHenry. Mais de 46 milhões de norte-americanos (mais de um em cada sete) dependem de um programa de alimentos financiado pelo governo federal. Os benefícios são, em média, de US$ 143 mensais, mesmo com os preços dos alimentos aumentando.
“O que acontece com os pobres aqui e no exterior é manipulação econômica”, opinou McHenry. “O acesso a comida é um direito, não um privilégio, mas nossos líderes não o reconhecem. Por isso que há tantas pessoas na prisão, porque são pobres”, acrescentou. Os Estados Unidos são o país com maior quantidade de presos: mais de dois milhões. O governo de Barack Obama tenta reduzir em 2% os fundos para os planos de alimentação. Mas os republicanos querem um corte ainda maior para o programa, que em 2011 contou com US$ 78 milhões.
Além dos Estados Unidos, milhões em todo o mundo sofrem fome crônica. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), quase um bilhão de pessoas no planeta sofrem insegurança alimentar, a vasta maioria delas nas áreas rurais. A carestia dos alimentos, o crescente desemprego e vários outros fatores contribuem com este cenário, que se deteriora cada vez mais, alertou a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO). No dia 9, esta agência informou que os preços dos alimentos aumentaram 6% em julho, em relação ao mês anterior, os grãos e o açúcar foram os produtos que mais puxaram esta alta.
“Isto não é nenhum tipo de exortação mensal. É o mesmo alerta global que é feito desde 2008”, disse à IPS o ativista Colin Roche, da Oxfam International, ao comentar o informe da FAO. “Estas novas cifras demonstram que o sistema alimentar mundial não pode enfrentar a deterioração de seus fundamentos”, afirmou, acrescentando que os governos devem tomar medidas urgentes, particularmente os das economias mais avançadas do Grupo dos 20 (G-20).
Embora a atenção esteja centrada na severa seca que afeita a zona produtora de milho dos Estados Unidos, Roche acredita que o problema tem raízes mais profundas. A mudança climática, por exemplo, está impactando as colheitas em todo o mundo, apontou. Muitos economistas e especialistas em desenvolvimento independentes afirmam que a fome não será solucionada a menos que os políticos levem a sério o problema da desigualdade econômica.
“A fome é causada pela pobreza e pela desigualdade, não pela escassez” de alimentos, afirmou o diretor-executivo do Instituto para Políticas de Alimentação e Desenvolvimento, Eric Holt-Gimenez, autor principal do livro Food Rebellion: Crisis and the Hunger for Justice (Rebelião Alimentar: a Crise e a Fome de Justiça). Segundo ele, as más colheitas nos Estados Unidos significam um desastre para os pobres de todo o mundo. “Não porque estes comam nosso milho. Tampouco comem nosso gado alimentado com milho, nem se alimentam com combustível com mistura de etanol”.
No entanto, “sofrem o terceiro desastre alimentar em quatro anos porque o preço do milho eleva o de outros alimentos básicos, como trigo, soja e arroz. Isto provocará um aumento nos preços em geral. Se a crise de preços dos alimentos em 2008 e 2011 servir de guia, os efeitos globais da seca nos Estados Unidos são razoavelmente previsíveis”, pontuou Holt-Gimenez. O salto nos preços dos alimentos básicos enviará um sinal ao mercado para o investimento especulativo, o que aumentará ainda mais os preços dos grãos, enfatizou. “Os países com boas colheitas, ou reservas, as usarão para evitar comprar grãos no mercado global e adotarão proibições de exportação”, previu.
Entretanto, os países com regimes frágeis, na análise de Holt-Gimenez, terão o desafio de manter os preços dos alimentos abaixo do “limite dos protestos populares”. “Enviarão os alimentos principalmente para as cidades, e os preços altos serão vistos no campo, onde os pobres rurais não poderão comprar comida”, enfatizou. Em 2008, a alta dos preços dos alimentos desatou uma onda de violentos protestos em 40 países.
Roche, da Oxfam, definiu o informe da FAO como “um eletrocardiograma de um paciente muito doente”, e sugeriu que os Estados Unidos e a União Europeia comecem a desmantelar seus “loucos” programas que destinam 40% do milho para a produção de combustíveis para carros e caminhões. “O G-20 tem as ferramentas para tratar as causas dos instáveis preços dos alimentos e da insegurança alimentar hoje e no futuro”, ressaltou, exortando os países do Norte a “reverem décadas de investimento insuficiente na pequena agricultura”. Envolverde/IPS