Montevidéu, Uruguai, 14/8/2013 – As falhas do sistema educacional da América Latina e do Caribe criam desigualdades que continuam afastando grande parte da população jovem dos empregos dignos e de uma sexualidade segura. Cerca de metade das e dos jovens sexualmente ativos da região jamais usaram um método anticoncepcional, e estima-se que 20% das meninas e meninos da região são filhos de mães adolescentes, com idades entre dez e 19 anos.
No entanto, a prevalência do HIV, vírus causador da aids, embora tenha diminuído, continua sendo alta. Cerca de 250 mil latino-americanos entre 15 e 24 anos vivem com HIV. Estes dados foram divulgados durante a Primeira Reunião da Conferência Regional sobre População e Desenvolvimento da América Latina e do Caribe, que começou no dia 12 e terminará amanhã, em Montevidéu, no Uruguai.
Para a diretora regional do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), Marcela Suazo, o problema se deve ao fato de “não haver suficiente acesso à educação sexual na região”. Esta formação “ainda está ausente no currículo nacional básico de muitas escolas públicas, enquanto algumas privadas proporcionam conhecimento e informação”, pontuou à IPS.
A diretora do UNFPA argumentou que se forma uma brecha: enquanto os serviços médicos avançam, a educação e a difusão de informação sobre direitos sexuais e reprodutivos continuam limitadas, o que dificulta o acesso dos jovens a uma atenção plena. Suazo participou no dia 12 de um fórum em comemoração ao Dia Mundial da Juventude, organizado como preâmbulo da reunião regional.
O encontro, no qual se analisa os progressos alcançados desde a adoção do Programa de Ação da Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD), realizada em 1994 no Cairo, é organizado pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) e pelo governo do Uruguai, com apoio do UNFPA.
Suazo também disse que continuam existindo preconceitos quanto à educação sexual. “Os adultos se comportam diferente com as pessoas que consideram jovens e as vêm menos aptas, e então isso os torna preconceituosos”, disse à IPS. Mesmo havendo bons serviços de saúde sexual e reprodutiva, muitas jovens acabam desistindo de utilizá-los porque se sentem julgadas por seu comportamento sexual, ressaltou.
“Necessitamos superar esta barreira porque está diretamente relacionada com a gravidez adolescente, com a reprodução da pobreza e com a desigualdade, que é a dívida pendente da América Latina e do Caribe com o futuro”, destacou Suazo. A perda dos direitos sexuais e reprodutivos das jovens latino-americanas incide diretamente em suas possibilidades de concluir os estudos e driblar a pobreza.
Nesta região, entre 15% e 40% das mulheres jovens declaram que sua primeira experiência sexual foi à força, e cerca de 30% das adolescentes se casam antes de completarem 18 anos. A isto se referiu o diretor-executivo do UNFPA, Babatunde Osotimehin, na abertura da Conferência, ao afirmar que “é preciso fazer mais para ampliar a capacidade das mulheres de exercerem seus direitos sexuais e reprodutivos”.
O enviado especial do secretário-geral da ONU para a Juventude, Ahmad Alhendawi, também destacou a importância da educação sexual. “É fundamental para os jovens saberem mais sobre seus corpos. A cada seis minutos uma pessoa jovem é afetada pelo HIV/aids e isso é inaceitável. Esses são números perigosos. Fornecendo ferramentas e informação seremos capazes de enfrentar este problema”, opinou à IPS.
Segundo dados do Grupo de Trabalho de Alto Nível para a CIPD, o segmento atual de jovens e adolescentes é o mais numeroso da história da região: 26% dos mais de 600 milhões de habitantes, o que constitui um “bônus demográfico” que se deveria aproveitar. Mas o desemprego juvenil é a expressão de outra brecha entre a educação e o mercado de trabalho.
“O sistema educacional não está dando aos jovens as habilidades e o conhecimento que precisam para entrar no mercado profissional. Este desajuste é uma enganação e reduz as possibilidades dos jovens obterem oportunidades de emprego decente”, afirmou Alhendawi. “Em nível mundial, 73,4 milhões de jovens estão desempregados. Esse número nos obriga a responder rapidamente ao problema”, ressaltou.
O enviado especial da ONU destacou a importância de aumentar os investimentos nessa faixa etária e pediu aos governos e às instituições privadas que forneçam serviços financeiros para que os jovens possam criar seus próprios negócios, para deixarem de ser “buscadores de emprego” e se converterem em “inovadores e criadores de empregos”, destacou.
Na América Latina e no Caribe, apenas 10% dos jovens trabalham na economia formal, pontuou Suazo. Os jovens “são os primeiros a perderem o emprego quando há cortes, e quando querem se integrar ao trabalho formal enfrentam requisitos, como cinco anos de experiência, quando apenas saíram da universidade”, indicou. Além disso, “estamos diante de uma nova revolução industrial-tecnológica. É preciso rever os sistemas educacionais de tal forma que permitam desenvolver as habilidades, as destrezas e o conhecimento necessário para que os jovens possam se incorporar a esses espaços de inovação”, acrescentou.
A diretora do UNFPA reconheceu que a educação avançou em certos aspectos na América Latina, pois foi atingida uma cobertura de 95% no ensino primário. “Entretanto, quando vamos ao nível secundário e universitário esses números começam a cair consideravelmente”, afirmou. “A educação primária não consegue desenvolver as habilidades e destrezas que permitem às pessoas entrarem nos processos de desenvolvimento na área produtiva nesse momento”, enfatizou.
Porém, o secretário-geral da Organização Ibero-Americana de Juventude (OIJ), Alejo Ramírez, pediu aos governos que priorizem a população juvenil em seus investimentos. “O crescimento econômico da América Latina nos últimos tempos serviu para desenvolver muitos setores, mas os jovens, os que mais sofrem com o desemprego e a desigualdade, são os últimos aos quais chegam os processos de investimento público”, lamentou.
Calcula-se que apenas 20% dos recursos e investimentos sociais beneficiam as pessoas com menos de 30 anos, acrescentou Ramírez. A OIJ também apresentou a Primeira Pesquisa Ibero-Americana de Juventudes – O Futuro já Chegou. Curiosamente, segundo o secretário da OIJ disse à IPS, a principal descoberta da pesquisa é que dois em cada três jovens acreditam que em cinco anos estarão melhor, “o que marca um importante otimismo”. Envolverde/IPS