Kavre, Nepal, 16/12/2011 – Saem da plateia gritos sufocados na medida em que aparecem na tela chocantes imagens de mãos humanas devoradas pelo arsênico, do cadáver de uma vaca tão esquálida que parece bidimensional e de uma criança faminta pendurada na teta de um animal para se alimentar. “Mostro estas fotografias para que compreendam porque devemos nos concentrar no meio ambiente”, afirma um monge budista vestido de vermelho, que criou em seu computador portátil uma arrepiante coleção de imagens que chama de “Uma história verdadeira da Mãe Terra”.
Karma Samdup Lama, filho de um camponês pobre, tornou-se budista aos 12 anos. Agora, é subdiretor de uma escola de noviços. Ele mostra seu documentário a 60 monges e monjas reunidos no monastério de Thrangu Tashi Yangste, na aldeia de Namo Buda, 40 quilômetros a leste da capital nepalesa. É um encontro especial. Embora comece com o Tashi Tsikgye, as orações tibetanas cantadas como benção, a reunião é sobre a mudança climática.
O encontro Monges pela Mudança Climática reuniu, no mês passado, religiosos de vários monastérios e conventos do Nepal para debater ideias destinadas a reduzir suas emissões de dióxido de carbono e as razões de tais medidas. A iniciativa partiu da organização The Smalll Earth Nepal (SEN – Pequena Terra Nepal), que promove a conservação e um estilo de vida sustentável, e contou com apoio da Fundação Korea Green, com sede em Seul, na Coreia do Sul.
“Decidimos começar um programa para conscientizar sobre a mudança climática com os monges e as monjas porque o Nepal é um país muito devoto”, disse Niranjan Bista, coordenador do projeto do SEN. “Busca inspiração e modelos em comunidades religiosas”, explicou. No Nepal há muitas religiões, mas a SEN escolheu a comunidade budista porque uma pesquisa do jovem cientista Sundar Layalu, durante um projeto promovido pelo British Council, concluiu que os monastérios lançam na atmosfera mais carbono do que se imagina.
O budismo rechaça os luxos materiais para alcançar a espiritualidade, e os monges levam vidas austeras. Contudo, Layalu, que escolheu o monastério de Thrangu Tashi Yangste para sua pesquisa, entre 2009 e 2010, concluiu que suas emissões de dióxido de carbono eram altas devido à soma de uso de combustíveis fósseis e à grande quantidade de visitantes. “Os monastérios costumam estar localizados em lugares altos, de difícil acesso, e o transporte de alimentos e outros produtos exige mais combustível. Também empregam geradores para bombear água potável, além do enorme consumo de incenso”, explicou Sudarshan Rajbhandari, vice-presidente do SEN.
A organização ensinou os monges a cozinhar utilizando briquetes de material descartável. Além disso, o monastério passou a usar paineis solares para aquecer a água, substituiu as xícaras de chá por jarras de barro biodegradável, intensificou o plantio de árvores e proibiu os sacos plásticos. “Buda nos ensina a proteger o meio ambiente”, contou Karma Sandup. “Ele dizia que devemos nossa existência a quatro elementos, água, terra, ar e fogo, e temos que conservá-los. Também dizia que as plantas devem nutrir-se até virarem árvores”, acrescentou. Karma Drolma, uma mulher de 55 anos do afastado distrito montanhoso de Manang, uniu-se à abadia Thrangu Tara para monjas budistas quando entrou na adolescência. Só sabe ler e escrever em tibetano e vive no claustro, mas conhece as consequências da mudança climática. “As montanhas derretem e os rios secam. Se continuar assim, a água desaparecerá, e um dia as pessoas e os animais morrerão”, afirmou.
A escolha do monastério de Namo Buda para uma reunião informativa sobre mudança climática ocorreu por se tratar de um “destino turístico muito conhecido, e esperamos que a mensagem também chegue a essa gente”, afirmou Bista. Os monges terminaram o encontro com a promessa de fazer todo o possível para conter a ameaça da mudança climática, “que significa maior sofrimento humano, desigualdade e um dano irreversível à Terra”. Um cartaz colocado na entrada do monastério recorda aos residentes e visitantes os ensinamentos de Buda. “Buda pregou que o bem-estar de toda a vida na Terra, não apenas a humana, é importante e igualmente valioso. Temos a obrigação de nos apegarmos a uma forma de vida mais considerada, que resulte em um equilíbrio natural e em um futuro harmonioso”. Envolverde/IPS
* Este artigo é parte de uma série apoiada pela Aliança Clima e Desenvolvimento (CDKN).