Lagos, Nigéria, 8/8/2011 – “Estamos sofrendo em meio à abundância”. Assim resumiu o nigeriano Nelson Ilemchi seus problemas enquanto permanecia na fila para comprar querosene. Desde janeiro, o país mais petrolífero da África sofre uma prolongada escassez de petróleo refinado. “Fabricamos, mas é difícil consegui-lo”, disse em meio à longa fila em um dos poucos postos que a vende.
Muitos dos que estavam na fila chegaram na noite anterior, e ainda esperavam. O atendimento demorou porque só havia uma bomba para atender os cerca de 500 clientes, cada um com vários baldes e outros meios para carregar o produto. E não há sinais de que a escassez acabe no curto prazo, enquanto governo e revendedores se acusam mutuamente. O governo importa querosene, enquanto as empresas privadas de petróleo o vendem ao público.
A Nigéria é o sexto maior vendedor de petróleo. A Organização de Países Exportadores de Petróleo (Opep) informou em seu boletim anual, divulgado em julho, que esta nação africana embarcou 2.464 barris diários em 2010. E, apesar de seus imensos recursos petrolíferos, Lagos importa produtos refinados como querosene, gasolina e diesel, já que as refinarias nigerianas só podem trabalhar com baixa capacidade. Isto se deve a décadas de corrupção que deixou em ruínas a maioria das instalações do Estado.
Os últimos números do Comitê de Políticas Monetárias do Banco Central mostram que a Nigéria gastou US$ 1,34 bilhão importando combustível entre janeiro e março deste ano. O ministro do Petróleo, Diezani Allison-Madueke, disse no Parlamento, no dia 7 de julho, que, apesar de o país precisar de oito milhões de litros de querosene por dia, sua pasta fornecia 11 milhões para atender a escassez.
Allison-Madueke, que não especificou quando o Ministério aumentará a produção, disse que a carestia persiste porque o produto é vendido em outros lugares a preços altos. “O querosene é acumulado e levado ilegalmente para outros países”, disse, acrescentando que parte do produto também é vendida para empresas aéreas a preços maiores.
Contudo, o presidente da Associação de Fabricantes de Petróleo Independentes da Nigéria, Abdulkadir Aminu, afirmou que a demanda diária de querosene é maior do que oito milhões de litros. “O que vemos é que o fornecimento não cobre a demanda”, disse. A escassez levou ao surgimento do mercado negro, onde o produto é vendido três vezes mais caro do que o preço oficial. O preço fixo do querosene é de 50 naira (US$ 0,33) o litro, mas no mercado negro chega a 300 nairas (US$ 1,98).
Enquanto isso, a população atravessa inúmeras dificuldades. Os proprietários de veículos muitas vezes precisam passar a noite na fila nos postos de combustíveis. “Em um país rico em petróleo, os nigerianos não deveriam sofrer para conseguir derivados”, disse à IPS a ativista Adetokunbo Mumuni, do Projeto de Direitos Socioeconômicos e Responsabilidade. “Em circunstâncias normais, o dinheiro hoje usado para importar produtos petrolíferos poderia ser usado na administração das três refinarias da Nigéria e, inclusive, na construção de novas”, acrescentou.
Mumuni, cuja organização promove a transparência e a responsabilidade nos setores público e privado, explicou que as refinarias não estão plenamente operacionais por causa da corrupção sistemática, que levou à ruína as instalações do país. “É por isso que um país produtor de petróleo foi reduzido a importador do mesmo produto que tem em abundância”, ressaltou.
A atual escassez afetou grande segmento da população nigeriana, já que a maioria dos habitantes cozinha com querosene. “As pessoas têm dificuldades para comer porque não encontram querosene para cozinhar”, disse à IPS Umunna James, que passou o dia todo na fila para comprar o produto.
Outros buscam alternativas. “Como a querosene é muito cara, os pobres não podem pagar. Por isso, agora uso lenha. Não sei por que o país se deteriorou a este nível”, disse à IPS Happiness Udo, uma dona de casa de Lagos. “Se vamos a um local de venda ficamos horas em pé até as pernas doerem. Sou idosa e não posso ficar muito tempo em pé”, acrescentou. Outros se voltam ao carvão para não precisar comprar querosene. Tola Taiwo, comerciante desse produto, disse que as vendas cresceram mais de 100%. Envolverde/IPS