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Caribe teme aumento de riscos em razão da mudança climática

A atualização de dados estatísticos sobre chuvas ajudará a evitar ou mitigar os danos de inundações como as que tantas vezes sofreu Puerto Espanha. Foto: Peter Richards/IPS
A atualização de dados estatísticos sobre chuvas ajudará a evitar ou mitigar os danos de inundações como as que tantas vezes sofreu Puerto Espanha. Foto: Peter Richards/IPS

Kingston, Jamaica, 1/7/2013 – Bastaram cerca de 20 centímetros de água para que a Jamaica sofresse as consequências da elevação do nível do mar. Algumas partes da ilha, inclusive, desapareceram totalmente, colocando em risco o sustento da população, e muito mais. “Fala-se da possibilidade de Barbuda desaparecer dentro de 40 anos, mas isto é uma realidade atual para a Jamaica”, opinou Conrad Douglas, cientista local, em entrevista à IPS. Ele mencionou o exemplo dos Cayos de Pedro (ilhas rasas, arenosas, frequentemente alagadiças), dos quais um “desapareceu completamente”. Douglas publicou cerca de 350 informes sobre gestão ambiental e temas afins.

Os Cayos de Pedro são quatro porções de terras baixas, planas (de dois a cinco metros de altura) e a maioria não habitada. A escassa vegetação consiste em seis espécies de plantas, nenhuma delas endêmica. São importantes áreas de nidificação de aves na região, bem como zonas de refúgio. Também podem ser encontradas várias tartarugas marinhas, como a carey e a cabeçuda.

Mais de 400 jamaicanos vivem vários meses nos Cayos de Pedro, a principal zona de colheita do Lobatus gigas, um caracol marinho comestível. O desaparecimento dos Cayos afeta o sustento, a renda e a vida da população, afirmou Douglas, “o que nos expõe a toda sorte de problemas que colocam em risco a segurança do país e da região”, alertou. Se o fenômeno continuar, “e se não nos adaptarmos”, todo o planeta mudará fisicamente, destacou.

Os cientistas alertam que se o mar continuar subindo tragará nações insulares inteiras, desde Malvinas até Ilhas Marshall, inundará extensas áreas de vários países, de Bangladesh ao Egito, e cobrirá partes de várias dezenas de cidades costeiras. “Ouvimos as aterradoras histórias de algumas ilhas do Pacífico que desaparecem; o tempo, certamente, não está em nossas mãos”, disse Kenneth Darroux, ministro do Meio Ambiente de Dominica, em entrevista à IPS. “O momento de agir é agora”, ressaltou.

A contribuição dos países do Caribe às causas da mudança climática, que leva ao aumento do nível do mar, são mínimas, mas eles são os que mais têm a perder, enfatizou Darroux. A Organização das Nações Unidas (ONU) estima que, até 2100, as Ilhas Marshall possam ficar totalmente submersas por ondas invasivas. A mudança climática pode fazer desaparecer as ilhas, e também afeta populações e lugares de várias outras partes do mundo, e atenta gravemente contra a qualidade de vida das pessoas.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) atribui a morte de aproximadamente 150 mil pessoas por ano aos efeitos da mudança climática, como eventos climáticos extremos, secas, ondas de calor, redução da produção de alimentos e maior propagação de doenças, como a malária. Os cientistas também alertam que, se for mantida a tendência atual das emissões de dióxido de carbono (CO2), os arrecifes de coral estarão virtualmente destruídos até 2050.

Darroux disse que um dos maiores desafios para os pequenos Estados insulares, como Dominica, que devem lidar com a mudança climática, são os recursos, econômicos e outros. No ano passado, as autoridades desse país divulgaram uma estratégia de desenvolvimento com baixa emissão de CO2 e resistente à mudança climática. Darroux afirmou que tentaram aproveitar os milhões de dólares disponíveis para ajudar os países a se adaptarem e a mitigarem o fenômeno, bem como suas consequências.

Dominica também pretende mostrar aos seus vizinhos do Caribe como podem se beneficiar dos mesmos fundos, explicou Darroux. “Temos um projeto (programa-piloto de resiliência à mudança climática)”, contou, acrescentando que serão entregues quase US$ 200 milhões a Dominica por um período de cinco anos para que possa construir iniciativas deste tipo.

Douglas pediu “colaboração e unidade” entre os países do Caribe. Todos têm histórias positivas nesta área, mas reconhece que “é muito lindo dizer vamos fazer isso ou aquilo, mas no fim do dia devemos enfrentar a realidade econômica em que trabalhamos”. O cientista acrescentou que “podemos propor numerosas iniciativas, mas podemos ser atingidos por um furacão, e o dinheiro que tínhamos para implantá-las, 99,9% ou 100% das vezes terá que ser destinado aos esforços de recuperação”.

John Crowly, gerente de dimensão social da mudança climática global da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), com sede em Paris, pediu urgência aos países do Caribe no sentido de dividir conhecimento sobre assuntos que não estão bem estudados com relação à dimensão social e humana da adaptação à mudança climática. Com a criação de uma rede de conhecimento, as sociedades poderão encontrar novas formas de se manterem e prosperarem, acrescentou.

Crowly disse a dezenas de cientistas que participaram de um encontro da Unesco sobre planejamento e formulação de políticas ambientais no Caribe, que o enfoque majoritário de adaptação à mudança climática, que a comunidade internacional leva adiante nos últimos dez anos, provavelmente não seja o adequado. “A visão dominante é basicamente a seguinte: algum dia haverá um acordo global integral para reduzir as emissões contaminantes e o problema desaparecerá”, apontou.

“Enquanto isso, temos que nos proteger contra os efeitos transitórios, e a melhor forma de fazer isso é com infraestruturas sólidas e de proteção”, ressaltou Crowly. “Creio que cada vez mais se apreende a noção de que isso pode estar errado e que, talvez, até seja perigoso”, disse, acrescentando que os problemas de adaptação provavelmente sejam permanentes e não transitórios e que não está “certo de que as soluções de infraestrutura sólida” sejam a melhor opção, pois elas mesmas são vulneráveis.

“Os muros de contenção, por exemplo, se baseiam em suposições sobre a elevação do nível do mar que são inevitavelmente incertas”, opinou Crowly. “Essas opções são irreversíveis e têm um elevadíssimo custo de oportunidade. Uma vez gastos os escassos recursos, estes já não estão mais disponíveis para nada”, ressaltou. Crowly defendeu maior ênfase em soluções brandas para adaptação à mudança climática, baseadas na mudança social, mais do que na infraestrutura. “São mais flexíveis e têm menor custo de oportunidade”, afirmou, ressaltando que “carecemos de conhecimento sobre como implantar soluções de tipo social. E, quando tentamos, costumamos fracassar”. Envolverde/IPS