Genebra, Suíça, 15/10/2013 – Quase quatro meses após a eleição do presidente do Irã, Hassan Ruhani, hoje serão reiniciadas em Genebra as conversações sobre o controvertido programa nuclear desse país. As negociações entre Irã e o P5+1 (Estados Unidos, Grã-Bretanha, França, China e Rússia mais Alemanha) aconteceram pela última vez em abril, em Almaty, no Cazaquistão, quando a equipe iraniana era liderada pelo ex-candidato presidencial Saeed Jalili, um representante da linha dura que foi derrotado, pelo clérigo moderado Ruhani, nas eleições de junho.
O momento em que o Irã esteve mais perto de conseguir um acordo nuclear sob a condução de Jalili foi em outubro de 2009, quando sua reunião direta com o então subsecretário de Estado norte-americano, William Burns, arrojou uma tentativa de acordo que incluía a transferência da maior parte do urânio de baixo enriquecimento iraniano para a Rússia, para ser processado em barras de combustível com fins médicos.
Contudo, as esperanças se despedaçaram quando “o tumultuado ambiente pós-eleitoral do Irã, combinado com a falta de transparência em relação aos detalhes do acordo, levou à oposição todo o espectro político”, disse à IPS Farideh Farhi, acadêmica independente na Universidade do Havaí. “A incapacidade de Jalili, como do então presidente Mahmoud Ahmadinejad, de convencer outros no Irã de que o acordo incluía uma aceitação explícita do programa de enriquecimento, fez com que o líder supremo, Ali Khamenei, retirasse seu apoio ao acordo”, detalhou Farhi.
Ruhani, ex-chefe das negociações nucleares (2003-2005), que prometeu “moderação” e “interação construtiva com o mundo”, gerou esperanças entre os iranianos de que seu governo garantiria um acordo que incluísse o alívio das muitas sanções que o Irã sofre. Sua viagem no mês passado a Nova York, junto com o chanceler Javad Zarif, derivou na reunião formal direta de mais alto nível com um funcionário norte-americano desde a Revolução Islâmica de 1979.
Zarif se mostrou “otimista” após a reunião com o P5+1 e uma conversa privada, de 30 minutos, com o secretário de Estado norte-americano, John Kerry, em paralelo à Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), no dia 27 de setembro. “Agora temos que fazer coincidir nossas palavras com a ação. E espero que isso não seja um problema”, disse o diplomata, educado no Ocidente, ao final de um discurso de Ruhani.
Após a reunião houve uma breve mas cordial conversa por telefone entre o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, e Ruhani, que sugeriu um descongelamento das relações entre os dois países. Os que promovem a saída diplomática receberam bem o anúncio de Obama de que Kerry participaria diretamente das negociações com o Irã, mas não está previsto que esteja na reunião de Genebra, onde a principal representante norte-americana continuará sendo Wendy Sherman, subsecretária de Assuntos Políticos.
O fato de o lado norte-americano agora incluir Adam Szubin, diretor da agência do Tesouro que administra e aplica sanções, também indica que Washington avalia sua política de castigos. Prevê-se que Zarif só assistirá a uma sessão de abertura das conversações de dois dias (hoje e amanhã), que incluirão a alta representante da União Europeia para Assuntos Exteriores e Política de Segurança, Catherine Ashton. A delegação iraniana está liderada pelo vice-chanceler, Abbas Araghchi, segundo a imprensa do Irã.
“Me tranquiliza que a equipe iraniana esteja conduzida por Zarif, porque é um diplomata brilhante, e pelos sinais de que a finalidade da reunião é que o Irã apresente ideias e os outros obtenham esclarecimentos e informem em seguida aos seus chefes”, afirmou Peter Jenkins, que entre 2001 e 2006 foi representante permanente da Grã-Bretanha na Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). “Entretanto, poderá haver problemas se um dos lados tentar ir muito longe, muito rápido, isto é, que exijam compromissos da outra parte sem assumir voluntariamente compromissos próprios”, pontuou Jenkins à IPS.
“Apresentaremos nossos pontos de vista, tal como acordamos, em Genebra, não antes. Sem pressa, sem especulações, por favor (claro, se puderem evitar)”, tuitou Zarif em sua conta oficial no dia 11. Dois dias antes, o ex-negociador nuclear Ali Larijani parecia sugerir que o Irã estava disposto a falar sobre seus depósitos de urânio enriquecido a 20%. “Temos certo excedente, uma quantidade que não necessitamos. Porém, sobre isso podemos ter algumas discussões”, disse Larijani, atual presidente do Congresso iraniano, à agência Associated Press, durante uma reunião da União Interparlamentar realizada em Genebra. O site de notícias do parlamento iraniano descreveu esses comentários como “contrários à realidade e sem base”, segundo tradução do Al-Monitor.
Por sua vez, o The Wall Street Journal informou no dia 9 que o Irã prepara uma proposta muito semelhante à que o P5+1 divulgou em Almaty. A última oferta feita por esse grupo para restabelecer a confiança, que não teve resposta formal do Irã, incluía demandas para suspender o enriquecimento a 20%, enviar ao exterior seus atuais depósitos de urânio e fechar temporariamente sua central nuclear de Fordow, em troca de um alívio das sanções impostas por Estados Unidos e União Europeia aos metais preciosos e produtos petroquímicos, bem como à indústria aeronáutica.
No dia 6 deste mês, a Agência de Notícias dos Estudantes Iranianos informou que o Irã apresentaria uma proposta de três fases, incluindo o enriquecimento dentro de seu território. Nesse mesmo dia, a imprensa citou o negociador Abbas Araqchi, que teria dito que “naturalmente que negociaremos em relação à forma, quantidade e aos vários graus de enriquecimento de urânio, mas o envio de materiais para fora de nosso país é nossa linha vermelha”, segundo a agência Reuters.
Porém, especialistas dizem que é preciso ter precaução com essas informações. “Até agora, as notícias sem substância só criaram esperanças infladas, que podem ser perigosas e levar a uma desilusão”, destacou à IPS o especialista em questões iranianas Ali Vaez, do International Crisis Group. “Ninguém deve esperar que um impasse de uma década seja resolvido em apenas dois dias. No melhor dos casos, as duas partes poderão reduzir suas diferenças sobre os limites gerais de um resultado final e um mapa do caminho para chegar a ele”, afirmou.
Ruhani disse em setembro, em Nova York, que esperava que fosse alcançado um acordo no prazo de três a seis meses. Na época, os representantes da linha dura poderiam recuperar o controle interno se a política externa do novo presidente não apresentasse nenhuma vitória para o Irã. Por outro lado, o Congresso dos Estados Unidos se prepara para impor mais sanções. O Comitê de Assuntos Bancários do Senado concordou em adiar o estudo de um projeto para endurecer mais as sanções contra as exportações de petróleo do Irã após as pressões de Kerry, mas o examinará nas próximas semanas, segundo jornal The New York Times.
Diante da pergunta sobre como as sanções afetarão o processo diplomático, Farhi respondeu que “dependerá de se chegar, ou não, a algum tipo de acordo em Genebra”. E acrescentou que, “sem acordo, a imposição de sanções será o anúncio público do fracasso das conversações. Se houver acordo e o Congresso dos Estados Unidos ainda insistir em intensificar as sanções, então será outra prova de fraqueza política de Obama”. “Espero que todas as partes tenham suficiente discernimento para saber que, diante do desejo publicamente expresso de resolver o assunto, este seja o momento para a flexibilidade e para um processo passo a passo de criação de confiança mútua para evitar um caminho que nenhuma das partes deseja”, concluiu. Envolverde/IPS