Arquivo

Chevron contra-ataca, em seu próprio terreno

Algumas das vítimas da Chevron, reunidas fora do tribunal nova-iorquino onde a petroleira queima seus últimos cartuchos. Foto: Samuel Oakford/IPS
Algumas das vítimas da Chevron, reunidas fora do tribunal nova-iorquino onde a petroleira queima seus últimos cartuchos. Foto: Samuel Oakford/IPS

 

Nova York, Estados Unidos, 18/10/2013 – Dois anos depois que um tribunal equatoriano determinou que fossem indenizados em US$ 18 bilhões pelos danos ambientais que a Chevron causou na Amazônia, um grupo de indígenas e camponeses equatorianos e seu advogado norte-americano irão a julgamento em Nova York, acusados pela companhia de oferecerem suborno e serem parte do crime organizado.

Em 2011, a empresa foi considerada culpada pela catástrofe ecológica de uma parte da Amazônia equatorial, causada nas décadas de 1970 e 1980 pela companhia Texaco, que a Chevron adquiriu em 2001, com isso assumindo obrigações legais. A Chevron se negou a pagar as indenizações. Como a empresa não tem bens no Equador para serem embargados, os demandantes tentaram cobrá-la no exterior.

O litígio de Nova York, apresentado sob o Estatuto Rico, que ficou famoso durante os julgamentos da máfia nos anos 1970, busca impedir que a condenação de 2011 seja honrada em tribunais dos Estados Unidos, onde a Chevron tem de sobra recursos para pagar a conta. A demanda afirma que o advogado Steven Donziger e um grupo de equatorianos que representam cerca de 30 mil vítimas indígenas e colonos mestiços, tentaram persuadir e corromper uma série de juízes equatorianos que atuaram no caso, a fim de extorquir a Chevron.

Donziger e seus clientes negam ter incorrido em irregularidades e afirmam que o processo é outra cara distração legal, na qual pode incorrer essa companhia, avaliada em US$ 230 bilhões, para prolongar uma saga judicial de 20 anos. Fora do tribunal, os equatorianos e alguns seguidores se reuniram no dia 15 para protestar, cantando e portando fotografias de uma terra brilhante e enegrecida, fossas de resíduos líquidos a céu aberto e frágeis habitantes da selva que estão morrendo de diferentes tipos de câncer.

Estima-se que dezenas de milhares de pessoas ficaram expostas a quase 70 milhões de litros de petróleo que vazaram e a quase 70 bilhões de litros de águas tóxicas, que vazaram ou foram ilegalmente bombeadas nos ecossistemas amazônicos em torno da jazida de Lago Agrio, no nordeste do Equador.

“Estamos aqui, diante do tribunal, contra essa grande corporação”, declarou Javier Piaguaje, um indígena secoya que vive junto ao contaminado rio Aguarico. Com vestimenta tradicional de sua etnia, disse à multidão que os efeitos duradouros do vazamento estão devastando sua comunidade. “A cada dia, familiares e outros seres queridos adoecem devido à contaminação”, contou. “Estamos aqui para mostrar o que realmente está acontecendo na Amazônia”, acrescentou, antes de entrar no tribunal para desenvolver sua defesa.

O juiz do caso, Lewis Kaplan, há tempos está contra os argumentos indígenas. No começo deste mês, Kaplan decidiu que a Donziger e aos demais processados não cabe um julgamento com júri. “Esse julgamento é uma farsa”, disse Paul Paz e Miño, da Amazon Watch, uma organização que promove a justiça ambiental e assessora os indígenas equatorianos. “A Chevron investiu anos para conseguir um processo em que não se permita aos originais litigantes discutir as evidências”, afirmou à IPS. “Não há absolutamente nenhuma evidência de fraude”, ressaltou.

Um porta-voz dos equatorianos em Nova York, Han Shan, disse à IPS que esse processo representa uma grande dose de cinismo por parte da Chevron. “Fizeram um grande trabalho de mídia e jiu-jítsu político ao tomarem nossos argumentos – que a Chevron era totalmente corrupta, que pressionava os juízes, que subornava, que tentava fazer as pessoas caírem em armadilhas e usava gente para fazer trabalho sujo – e tentar usá-los contra nós”, advertiu Shan.

Em 2009, Diego Borja, um contratado da Chevron no Equador, foi pego fazendo um vídeo no qual ele próprio aparecia tentando subornar o juiz Juan Núñez. Desde então, a companhia custeou a mudança de Borja para os Estados Unidos e lhe paga uma quantia mensal. O site da Chevron sobre relações com a mídia saiu do ar para manutenção no momento de escrever esta matéria, e a IPS não conseguiu entrar em contato com a empresa para obter declarações.

Porém, no site da companhia dedicado à demanda, Morgan Crinklaw, porta-voz da Chevron, afirma: “Cremos que toda jurisdição que respeite o império da lei decidirá que a sentença é ilegal e inaplicável porque é produto de fraude”. O julgamento que acontece em Manhattan gira em torno do diário pessoal de Donziger e do filme de 2009 Crudo, de Joe Berlinger, que, segundo a Chevron, mostram que o advogado considerou parte das evidências ambientais usadas no processo como “espelhinhos coloridos”. Donziger argumentou que suas declarações foram retiradas de contexto.

O juiz Kaplan já decidiu uma vez em favor da Chevron. Em março de 2011, emitiu uma ordem temporária que bloqueou a aplicação do veredito equatoriano. Porém, em janeiro de 2012, o federal Tribunal de Apelações para o Segundo Circuito dos Estados Unidos, em Nova York, revogou essa ordem, e novamente abriu-se a porta para que os demandantes originais tentassem fazer a Chevron passível de pagamento em tribunais norte-americanos.

A decisão levou a equipe legal da Chevron, integrada por mais de cem advogados, a improvisar uma estratégia de defesa de último momento, sob a forma de um processo baseado no Estatuto Rico. E foram fundo para apresentá-la no tribunal de Kaplan. “Não creio que Kaplan nos dê um julgamento justo. Penso que já tem sua ideia pré-concebida”, opinou Shan.

No entanto, se o juiz decidir contra a comunidade aborígine e emitir novamente uma ordem, o Segundo Circuito a revogará. “O Segundo Circuito foi claro quanto ao Tribunal Distrital dos Estados Unidos não ser um tribunal de apelações do Poder Judicial equatoriano, e não tem absolutamente nenhuma jurisdição para emitir esse tipo de ordem”, afirmou Shan. Envolverde/IPS