Washington, Estados Unidos, 11/10/2012 – A onda de “ataques amigos” contra as forças estrangeiras no Afeganistão domina este ano as notícias sobre essa guerra. Porém, há outro fato mais importante: a categórica derrota norte-americana diante dos artefatos explosivos improvisados do Talibã. Alguns meios de comunicação afirmam que o exército dos Estados Unidos conseguiu algum progresso contra essas bombas, mas sem apresentar o contexto das tendências sazonais ou focando-se exclusivamente nas baixas norte-americanas.
A realidade mostra que o aumento de tropas não conseguiu reverter o acentuado aumento de ataques com explosivos improvisados e das baixas que causaram, que o movimento extremista Talibã iniciou em 2009 e continuou até 2011. Nesse período de dois anos, as tropas dos Estados Unidos sofreram 14.627 mortes, segundo o Departamento de Defesa e a organização não governamental iCasualties, que registra as baixas das guerras do Iraque e do Afeganistão de fontes publicadas.
Desse total, 59% (8.680 mortes) foram causadas por explosivos improvisados. A proporção de todas as baixas norte-americanas por ataques deste tipo aumentou de 56% em 2009 para 63% no ano passado. A decisão do Talibã de apelar para esse tipo de arma é um aspecto central de sua estratégia para responder à ofensiva bélica decidida por Washington. Exigiu uma grande quantidade de tempo e de energia das tropas norte-americanas e demonstrou que sua campanha contrainsurgente não conseguia reduzir o tamanho nem o poderio da guerrilha islâmica.
Além disso, ofereceu ampla evidência à população afegã de que o Talibã mantinha sua presença inclusive em distritos especificamente ocupados por tropas dos Estados Unidos. Os chefes militares norte-americanos tentaram controlar esta estratégia com duas medidas contraditórias, que ignoravam a realidade política e social do Afeganistão. Por um lado, organização conjunta para a derrota dos explosivos improvisados do Pentágono (conhecida pela sigla Jieddo) gastou mais de US$ 18 bilhões em dispositivos de alta tecnologia para detectar este armamento antes de explodir. Isto incluiu robôs e dirigíveis com câmeras de espionagem.
A tecnologia permitiu descobrir mais artefatos, mas o Talibã simplesmente se dedicou a fabricar e instalar muitos mais, elevando a pressão. Por outro lado, a estratégia concebida pelo general David Petraeus, e aplicada pelo general Stanley A. McChrystal, sustentava que a rede de explosivos improvisados seria desmantelada quando o povo virasse as costas para o Talibã. Então, os generais colocaram tanques e blindados e milhares de tropas para patrulhar a pé a fim de travar relações com a população local. O passo seguinte foi um salto na quantidade de ferimentos “catastróficos” em soldados norte-americanos causados por bombas improvisadas.
Em sua avaliação de 30 de agosto de 2009, McChrystal disse que a Força Internacional de Assistência para a Segurança (Isaf), enviada pela organização do Tratado do Atlântico Norte, “não terá êxito se não estiver disposta a compartilhar pelo menos o mesmo risco que nós”. E sugeriu que uma vez que se ganhasse a confiança da população, esta informaria à Isaf onde se encontravam as bombas.
McChrystal deu maior ênfase no patrulhamento sem tanques no outono de 2009. O Talibã respondeu elevando a quantidade de artefatos dirigidos contra essas patrulhas, de 71 em setembro daquele ano para 228 em janeiro de 2010, segundo dados da Jieddo. Isto significava que a população tinha mais conhecimento da localização das bombas, o que deveria ter como resultado que informasse mais sobre esse armamento às tropas estrangeiras, segundo a estratégia de Petraeus. Mas os números mostram que ocorreu o contrário. Nos primeiros oito meses de 2009, a média de armas denunciadas pela população foi de 3%. Mas, de setembro daquele ano até junho de 2010, caiu para 2,7%.
Depois que Petraeus substituiu McChrystal como comandante da Isaf, ordenou inclusive mais patrulhas, sobretudo nas províncias de Helmand e Kandahar, onde as tropas norte-americanas buscavam controlar o que havia sido o reduto do Talibã nos anos anteriores. Nos cinco meses seguintes, a denúncia de explosivos improvisados caiu para menos de 1%.Enquanto isso, cresciam os ataques com esse armamento contra as patrulhas: de 21 em outubro de 2009 para uma média mensal de 40 entre março e dezembro de 2010. Os soldados feridos chegaram a 316 por mês nesse período, duas vezes e meia maior do que nos dez meses anteriores. Este êxito foi o principal motivo do aumento das baixas e dos feridos norte-americanos.
Em 2009, foram 1.211 feridos e 159 mortos devido às bombas improvisadas. Em 2010, 3.366 feridos e 259 mortos. Os ferimentos causados às tropas que patrulham a pé são muito piores: amputações traumáticas de membros e outras lesões severas, muito piores do que as sofridas em ataques contra veículos blindados. Em 2011, as mortes norte-americanas por bombas improvisadas caíram para 204, e o total de baixas passou de 499 para 418. Mas o número de feridos por esse artefato cresceu 10% e a quantidade de todos os feridos em combate foi quase a mesa de 2010, segundo a iCasualties.
Nos primeiros oito meses deste ano, o número de feridos caiu 10% em relação a igual período de 2011, e o de mortes foi 29% menor. A queda no número de feridos se deve em parte ao traslado de milhares de tropas norte-americanas de Kandahar e Helmand para o leste afegão.
No começo de 2011, o Pentágono sabia perfeitamente que não conseguiria cumprir o que havia planejado antes e durante a ofensiva. Em um eloquente comentário ao jornal The Washington Post em janeiro desse ano, o diretor da Jieddo, general John L. Oates, afirmava que “não é correto afirmar que estamos perdendo a guerra de explosivos improvisados, porque a ideia não é destruir a rede. Isto pode ser impossível”. O objetivo é “desbaratá-los”, dizia Oates, movendo, assim, o arco do lugar para não ter que admitir que não haviam feito gols. A admissão implícita de que o patrulhamento a pé de Petraeus já não é referenciado no comando da Isaf é que a ordem de agosto de 2010 foi retirada de seu site na internet. Envolverde/IPS
* Gareth Porter é historiador e jornalista investigativo especializado em política nacional de segurança dos Estados Unidos, e recebeu em 2011 o prêmio britânico Gellhorn por seus artigos sobre a guerra dos Estados Unidos contra o Afeganistão.