Conferência de Doha: À espera da hora da mudança
Para as pessoas que não acompanham as negociações multilaterais, há certa dificuldade de compreensão do processo: temas como biodiversidade, mudança do clima e desertificação são abordados no âmbito de tratados internacionais específicos, com regras e calendários próprios. No caso de mudança do clima, as Conferências das Partes (COPs) se realizam anualmente.
Para as pessoas que não acompanham as negociações multilaterais, há certa dificuldade de compreensão do processo: temas como biodiversidade, mudança do clima e desertificação são abordados no âmbito de tratados internacionais específicos, com regras e calendários próprios. No caso de mudança do clima, as Conferências das Partes (COPs) se realizam anualmente.
Tecnicamente, temos em Doha a reunião da Convenção- Quadro sobre Mudança do Clima e a do Protocolo de Kioto. A Rio+20, por sua vez, possuía agenda própria e tecnicamente não tinha mandato para tratar de temas regulados pelas convenções.
A COP-15 de Copenhague, em 2009, criou enorme expectativa de fixação de metas ambiciosas de redução de emissão de gases efeito estufa. Obteve só o compromisso internacional “simbólico” de se estabelecer o aumento máximo da temperatura média do planeta em 2°C até o fim do século, ainda que dela tivessem participado grandes líderes mundiais como Barack Obama, Angela Merkel e Lula. Deixou como legado uma frustração que se refletiu na reunião de Cancun (COP-16), no México, em 2010.
Cancun corria o risco de encerrar as negociações. Teve o mérito de garantir seu prosseguimento. A reunião se deu num ambiente tomado por esvaziamento e pessimismo. Já na seguinte, na África do Sul (COP-17), se obteve um avanço importante, a Plataforma de Durban. Nela, todos os países se comprometeram com uma redução de gases-estufa a partir de 2020, além da continuidade do Protocolo de Kyoto.
Em Doha (COP-18) as negociações continuam sem grande expectativa. Diferentemente de Copenhague, dela participam delegações formadas na sua maioria por diplomatas, isto é, com baixo perfil político, centrando o foco na continuidade de Kioto até 2020. Este, em tese, seria substituído por um acordo internacional a partir de 2020, mas com metas de redução iniciando em 2030.
O problema maior está no calendário frouxo. As emissões continuam a crescer e a comunidade científica aponta a gravidade da crise climática. Não há perspectiva de mudança desse cenário. Ao contrário. O REDD (Redução das Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal), que poderia ser um instrumento de combate ao desmatamento, continua travado; o MDL (Mecanismo de Desenvolvimento Limpo) traz incertezas.
Otimistas apontam a possibilidade de que os EUA, no segundo mandato de Obama, mudem de posição influenciados pelo furacão Sandy. Esta mudança seria pactuada com a China, parte essencial na negociação, como grande potência econômica e principal emissor de GEE. Aliás, este país tem apresentado surpresas positivas nas últimas COPs.
Outro fator que poderia influenciar fortemente as negociações seria a divulgação do próximo relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), a exemplo do que ocorreu em 2007. Este causou grande impacto na opinião pública ao reconhecer a ação antrópica na mudança do clima e ao demonstrar sua gravidade.
Mas, algumas pessoas dizem que os governos responsáveis pela aprovação do relatório síntese para tomadores de decisão estariam dispostos a minimizar as conclusões para atenuar seu impacto. A conclusão é que Doha provavelmente dará continuidade às negociações, mas sem representar mudança na inflexão de seu curso. Política e mudança do clima não são lineares, de modo que sempre resta esperança de que haja um tipping point (ponto de mudança). É ver para crer.
* Fabio Feldmann é consultor ambiental.
** Publicado originalmente no site CarbonoBrasil.




