Conselhos estaduais de educação

Os Conselhos Estaduais surgem no Brasil a partir de nossa primeira Lei de Diretrizes e Bases (LDB), a Lei 4.024/61(hoje revogada) que, em seu artigo 10, previa: ”Os Conselhos Estaduais de Educação organizados pelas leis estaduais, que se constituírem com membros nomeados pela autoridade competente, incluindo representantes dos diversos graus de ensino e do magistério oficial e particular, de notório saber e experiência, em matéria de educação, exercerão as atribuições que esta lei lhes consigna”.

Nesse período vigorava no Brasil a Constituição Federal de 1946. Após o golpe militar de 1964, surgiu nova LDB, a Lei 5.692/71, que manteve a existência desses Conselhos.

Os Conselhos Estaduais de Educação são órgãos colegiados que trabalham junto a Secretaria Estadual da Educação, portanto, integram a estrutura do Poder Executivo. Em geral tem poderes normativos, deliberativos e consultivos do sistema estadual de ensino.

Nossa atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), lei federal nº 9.394/96, não faz referência aos Conselhos Estaduais, mas tão somente ao Conselho Nacional. No § 1º do artigo 9º, diz que: “Na estrutura educacional haverá um Conselho Nacional de Educação, com funções normativas e de supervisão e atividade permanente, criado por lei.”

Esse Conselho (CNE) foi instituído anteriormente, pela lei federal nº 9.131/95, e teve sua existência confirmada pela LDB.

É na Constituição Federal, no seu artigo 205, que encontramos a regra geral “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para a cidadania e sua qualificação para o trabalho”.

E no artigo seguinte, 206, quando diz sobre os princípios a que deve seguir o ensino, estabelece no inciso VI, a “gestão democrática do ensino público, na forma da lei.“

Segundo as determinações constitucionais contidas no artigo 211, a incumbência de ministrar a educação escolar está assim distribuída: caberá aos municípios – prioritariamente – a educação infantil e o ensino fundamental e, aos estados caberá – prioritariamente – o ensino fundamental e o médio.

A LDB em vigor hoje, no artigo 21, diz que a educação escolar compõe-se de: I) educação básica, formada pela educação infantil, ensino fundamental e ensino médio; II) educação superior. E, nos artigos 10 e 11, determina que tanto os estados como os municípios deverão incumbir-se de “organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino”, salientando que no caso dos municípios estes deverão também integrar-se às políticas e planos educacionais da União e dos estados.

Quanto à educação superior, é a LDB que regula o tema e ali não há referência à prioridade de nenhum dos entes federados (artigos 43 a 57). Destaco aqui, entretanto, o disposto no artigo 56: “As instituições públicas de educação superior obedecerão ao princípio da gestão democrática, assegurada a existência de órgãos colegiados deliberativos, de que participarão os segmentos da comunidade institucional, local e regional.”

Voltando à leitura da LDB, no inciso VIII de seu artigo 3º, verificamos que ali se repete o mandamento constitucional, dizendo que entre os princípios que regem o ensino está a “gestão democrática do ensino público, na forma desta Lei e da legislação dos sistemas de ensino;”

Para encerrarmos esta aborrecida, porém necessária menção das regras constitucionais e legais, enfatizamos que, no artigo 14 da LDB, se estabelece: “Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: I) participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II) participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalente”.

Concluímos, portanto, que tanto o governo federal (União) como os estados e os municípios que compõe nossa República têm sua respectiva autonomia para organizar seus sistemas de ensino público e privado, mas deverão cuidar da integração de suas políticas assim como observar a gestão democrática do ensino público. Concluímos, por outro lado, que a educação é direito de todos e de incumbência coletiva: Estado, família e sociedade.

Nos municípios, os secretários da Educação podem contar com os conselheiros municipais que integram o Conselho Municipal de Educação, órgão colegiado que atua nas formas de mediação e co-gestão coletiva dos sistemas de ensino. É do conhecimento geral que, muito embora enfrentando grandes resistências locais, precariedades e formas irregulares de composição, já se espalham pelo território nacional milhares desses Conselhos Municipais. Sabemos, também, que as comunidades localizadas no entorno de cada escola – mal ou bem – já participam dos seus Conselhos Escolares.

Todavia, quanto aos Conselhos Estaduais de Educação, o que sabem os cidadãos? Quase nada. Para iniciar uma pequena pesquisa sobre o tema, como nasci e resido no estado de São Paulo, comecei consultando o texto da Constituição do estado de São Paulo de 1989 e vi que em seu artigo 242 confirma-se a existência do Conselho Estadual de Educação. Então busquei informações pela internet sobre como se organiza o Conselho Estadual paulista: http://www.ceesp.sp.gov.br/portal.php/conheca_cee

E fiquei perplexa! Imagine leitor, que a lei vigente por aqui é datada de 1971! Portanto, foi editada em pleno regime militar autoritário e, conseqüentemente, antes da promulgação da democrática Constituição Federal de 1988, da própria Constituição paulista de 1989 e da atual LDB de 1996! Constatei, ainda, que em muitos outros Estados de nossa federação ocorre a mesma coisa:

http://www.acaoeducativa.org.br/portal/index.php?option=com_content&task=view&id=1879&Itemid=2

A gestão democrática do ensino no campo estadual ainda não deu ares de sua existência! Nesses arcaicos Conselhos Estaduais, a sabedoria é virtude apenas daqueles que detém “notório saber”. Com todo respeito aos nossos professores doutores, há de se observar que as famílias e os movimentos populares são parte integrante da sociedade civil e, constitucionalmente, também são responsáveis pela educação. Portanto, devem ter voz nos órgãos colegiados da educação estadual. No entanto, não é o que ocorre. Definitivamente, não há gestão democrática alguma nesse Conselho.

E pensar que nossa CF, ao tratar da Administração Pública em seu artigo 37, prevê no § 3º, o seguinte: “A Lei disciplinará as formas de participação do usuário na administração pública direta e indireta, […]”

No Conselho Estadual paulista não há representação paritária, mas tão somente indicação de profissionais “notáveis” ligados ao ensino público e privado, com a posterior nomeação pelo senhor governador e com recondução ilimitada. E quem indica esses profissionais? Não está clara essa questão. Como não se trata ali de trabalho voluntário, os conselheiros são remunerados a cada reunião que comparecem. Esse custo faz parte do sistema orçamentário da Secretaria Estadual da Educação.

Acordai, ó paulistas! Vosmecês são os que pagam essa conta!

* Inês do Amaral Büschel é Promotora de Justiça de São Paulo, aposentada; associada do Movimento do Ministério Público Democrático.

** Publicado originalmente no site Correio da Cidadania.