Cidade do México, México, 25/11/2011 – A violência sexual contra as mulheres aumenta de modo exponencial no México, junto com a intensificação do enfrentamento entre forças de segurança e máfias de narcotraficantes, afirmam organizações defensoras dos direitos humanos. “Vemos um aumento da violação, hostilidade sexual e violação de meninas”, disse à IPS a ativista Imelda Marrufo, fundadora e coordenadora da Rede Mesa de Mulheres, em Ciudad Juárez, fronteiriça com os Estados Unidos.
O Observatório Cidadão Nacional do Feminicídio (OCNF), que aglutina 43 organizações de direitos humanos e de mulheres, registrou cerca de sete mil violações em dez dos 32 Estados mexicanos em 2010, dado que pode ser maior considerando que as vítimas não denunciam todos os atos de violência. A idade média das vítimas é de 26 anos, diz o informe. A agressão sexual é a terceira forma mais grave de violência contra as mulheres, atrás do assassinato e do desaparecimento.
Em locais como Ciudad Juárez, invadida por policiais, militares e narcotraficantes, grupos de homens “levantam” (sequestro sem pedido de resgate) meninas e mulheres, as violentam e depois as libertam. “É muito grave a situação. Os casos não são investigados e há muita impunidade. As organizações nos pediram para documentarmos os casos”, disse à IPS a coordenadora executiva do OCNF, María Estrada, também encarregada do programa de Violência de Gênero e Direitos Humanos da rede Católicas pelo Direito de Decidir.
A repressão governamental aplicada na localidade de San Salvador Atenco, a 45 quilômetros da Cidade do México, é uma mostra-modelo das vexações sexuais. Nos dias 3 e 4 de maio de 2006, policiais desalojaram violentamente um grupo de moradores e detiveram 47 mulheres, das quais pelo menos 26 sofreram abusos sexuais, segundo a organização Atenco, Mulheres em Resistência. Diante da virtual impunidade desses fatos, 11 vítimas apelaram à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, com sede em Washington, que aceitou o caso para análise.
A repressão de Atenco “se tornou um padrão que se repete em outros locais”, afirmou Edith Rosales, de 53 anos e uma das que assinaram a petição junto à Comissão, órgão da Organização dos Estados Americanos (OEA). “Foi dada uma utilização à mulher, são obrigadas a participarem do narcotráfico e são usadas sexualmente. E tiram suas vidas normalmente”, contou Rosales à IPS.
“A violência contra a mulher está enraizada na sociedade. Permite-se torturá-las, violentá-las e assassiná-las, considerando-as a camada mais baixa da sociedade, e depois são jogadas fora”, disse à IPS a representante do Conselho Geral de Advocacia Espanhola, Isabel Valriveras. Ela integra a missão internacional “Pelo Acesso à Justiça para as Mulheres”, que percorre México, Guatemala e El Salvador, desde o dia 17, para inspecionar a situação da violência de gênero e analisar as medidas tomadas a respeito. Seu trabalho terminou no ontem, véspera do Dia Internacional da Eliminação da Violência Contra a Mulher.
O Estado mexicano foi condenado três vezes entre 2009 e 2010 pelo Tribunal Interamericano de Direitos Humanos, máxima corte no contexto da OEA, por violações dos direitos das mulheres. Em novembro de 2009, foi considerado culpado pelo assassinato das jovens Claudia González, Esmeralda Herrera e Laura Ramos, no que ficou conhecido como o caso do “Campo Algodoeiro”, pelo local próximo a Ciudad Juárez onde, no dia 6 de novembro de 2001, seus cadáveres foram encontrados.
Em agosto do ano passado, o Tribunal expediu duas resoluções condenatórias, pelas violações de que foram vítimas por parte de militares em 2002 as indígenas Inés Fernández e Valentina Rosendo, no Estado de Guerrero. Depois de assumir o governo, em dezembro de 2006, o conservador Felipe Calderón determinou que as Forças Armadas colaborassem com a polícia em uma luta frontal contra os narcotraficantes, em uma campanha que já causou a morte de pelo menos 50 mil pessoas, segundo a imprensa.
O Ministério da Defesa Nacional informou que pelo menos 159 militares estão sob investigação por denúncias de abusos de autoridade, tortura e homicídios, outros 57 estão sob processo, e sete foram condenados, processados sob o foro militar. A organização Anistia Internacional informou que pelo menos 60 indígenas foram violentadas por soldados entre 1994 e 2011.
“Não é apenas invasão de corpo, mas a violação é exercida desde aspectos culturais, por serem mães e esposas de quem está dentro do crime organizado. E não se vê mensagens claras do Estado de que não se permitirá a violência de gênero”, disse à IPS a acadêmica Julia Monárrez, do estatal El Colegio de la Frontera Norte e que foi perita de acusação no caso do “Campo Algodoeiro”. “Não temos justiça no México. Aqui domina a impunidade”, lamentou Rosales. Entre janeiro de 2010 e junho deste ano, 1.235 mulheres foram assassinadas em oito Estados e outras 3.282 desaparecerem em nove, segundo o Observatório Cidadão. Envolverde/IPS