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Corrida nuclear e mudança climática antecipam apocalipse

Imagens dos bombardeios atômicos sobre as cidades japonesas de Hiroxima e Nagasaki, em 1945. Foto: Domínio público
Imagens dos bombardeios atômicos sobre as cidades japonesas de Hiroxima e Nagasaki, em 1945. Foto: Domínio público

Nações Unidas, 26/1/2015 – A implacável mudança climática e a corrida pelas armas nucleares fizeram com que o Relógio do Apocalipse esteja dois minutos mais perto da “meia-noite”, simbólica imagem de uma catástrofe global. O Boletim de Cientistas Atômicos, atualmente integrado por 17 ganhadores de prêmio Nobel, desde 2012 situava esse relógio a cinco minutos dessa meia-noite apocalíptica. Esse mecanismo foi criado pela Universidade de Chicago e funciona desde 1947.

A decisão de adiantá-lo em três minutos foi anunciada em Washington por membros do Boletim. A última vez que suas agulhas marcaram essa hora foi em 1984, quando as relações entre Estados Unidos e a então União Soviética “chegaram ao seu ponto mais gélido em décadas”, disseram os cientistas.

A polêmica atual considera as imutáveis leis da ciência em relação à “catástrofe climática”, bem como as atividades de modernização de enormes arsenais nucleares, que representam riscos inadvertidos. “A questão é muito mais complicada do que o fato de haver alguém com seu dedo a ponto de apertar o botão”, opinou Kennette Benedict, diretora-executiva do Boletim.

Outro problema importante é a dependência mundial dos combustíveis fósseis, segundo a publicação. A mudança climática e as tensões nucleares ficaram em pé de igualdade na advertência deste ano. “E, mesmo que as tecnologias usadas na queima de combustíveis fósseis possam parecer uma maneira menos abrupta de arruinar o mundo, o estão fazendo em câmara lenta”, apontou Benedict.

“Os negociadores do tratado internacional sobre a mudança climática ou qualquer tratado internacional estão trabalhando dentro das estreitas margens que seus governos lhes concedem. E os próprios governos estão trabalhando dentro das margens que lhes foram concedidas pelos seus eleitores”, afirmou Sivan Kartha, membro do Conselho de Ciência e Segurança do Boletim e cientista do Instituto de Estocolmo para o Meio Ambiente.

A cooperação real na frente internacional “dependerá do que os eleitores exigirem dentro dos países”, pontuou Kartha, acrescentando que atualmente há “uma oposição política intimidadora à ação climática”.

O presidente do Instituto de Segurança Mundial, Jonathan Granoff, descreveu uma série de desafios globais existenciais, que podem acelerar a chegada do “apocalipse” e incluem a estabilidade do clima, a acidez dos oceanos e a biodiversidade, bem como objetivos generalizados de estabilidade estratégica e busca da dominação. “Recordemos que estamos extinguindo espécies até mil vezes mais rápido do que seria o ritmo-base evolutivo normal”, afirmou à IPS.

“O pano de fundo desses desafios que parte da ciência, da tecnologia e da organização social é a relação imatura entre os Estados e sua busca pela segurança por meio da aplicação da ameaça ou do uso da força. A ferramenta mais perigosa da busca pela segurança pela força são os arsenais nucleares do mundo”, prosseguiu Granoff.

Segundo o especialista, há cada vez mais consenso entre “membros informados da governança mundial e da sociedade civil”, o que lhes permite entender rapidamente que “nenhuma nação pode estar segura em um mundo inseguro”. “E a comunidade empresarial se integrou rapidamente de tal modo que demonstrou sua capacidade de cooperação”, acrescentou.

“Isso me recorda que, no século 17, o mundo passou do predomínio da cidade-estado para o moderno mundo da nação-estado. Esse fenômeno exigiu identidade nacional. E a identidade nacional sobreveio em boa medida graças à gramática e ao idioma nacional, que se apoiou nas inovações tecnológicas da imprensa”, apontou Granoff.

“Atualmente, é a internet que nos dá a tecnologia que nos permitirá ter uma gramática cultural e uma identidade globais. Daí que as ferramentas para passar da disfuncionalidade de contrapor o interesse nacional ao bem global comum terem o potencial de superar-se”, ressaltou Granoff.

À luz de sua análise, os minutos do relógio podem ser influenciados para melhor ou pior, e 2015 apresentará oportunidades para que sejam concretizados avanços.

Alyn Ware integra o Conselho Mundial do Futuro e coordena a Global Wave 2015, uma iniciativa da Ação Mundial Para Dizer Adeus às Armas Nucleares, e conversou com a IPS por ocasião de uma reunião preparatória da Conferência de Revisão do Tratado de Não Proliferação Nuclear, programada para maio deste ano.

“As centenas de milhares de milhões de dólares gastos em armas nucleares são necessários para passarmos de uma economia baseada no carbono para outra baseada na energia renovável”, ressaltou Ware. Também explicou que a “competição, o confronto e os conflitos que são perpetuados pelas armas nucleares impedem o tipo de cooperação necessária para abordar a mudança climática”.

“A verdade nua e crua sobre as armas nucleares é que são inconsistentes com a civilização. Ameaçar aniquilar cidades, pessoas inocentes, gerações futuras, não é consistente com a humanidade”, afirmou Ware à IPS. No momento, não existe suficiente compromisso político nem em relação ao desarmamento nuclear nem em relação à mudança climática e às energias renováveis, o que é necessário para enfrentar os interesses criados que impedem esse tipo de ação, e que incluem as corporações que fabricam as armas atômicas ou vendem petróleo, carvão ou gás, enfatizou.

“Estamos apostando em empoderar a população”, destacou Ware. Por esse motivo, acredita que o Relógio do Apocalipse é muito bom, “pois é simples, é realmente compreensível e dá ideia de que todos podemos estar envolvidos nisso”, ressaltou. Envolverde/IPS