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Cresce a fúria popular na Síria

Beirute, Líbano, 19/4/2011 – Apesar das escassas notícias procedentes da Síria, a informação passada por ativistas no terreno indica que a situação se deteriora. Enquanto o governo permanece em silêncio diante dos acontecimentos em todo o país, as rezas muçulmanas do dia 15 continuam refletindo a dissensão que parece propagar-se a todas as classes sociais. “As pessoas estão muito descontentes, sobretudo depois que os homens presos na cidade de Banyas foram libertados, quando surgiram versões de que foram torturados”, disse um ativista, que pediu para não ser identificado por razões de segurança.

A rede de TV árabe Al Jazeera informou, no dia 13, que pelo menos 200 homens de Banyas foram detidos pelas forças de segurança. Segundo um ativista, em resposta, as mulheres da cidade fizeram uma manifestação exigindo a libertação de todos. “A revolução desenvolveu sua própria dinâmica. Quando o regime mata manifestantes, cria mais fúria nas ruas, o que leva a mais protestos’, disse Anas al-Abdah, membro fundador do grupo de oposição Movimento pela Justiça e o Desenvolvimento.

Na última semana, milhares de pessoas se manifestaram e apoiaram o movimento pró-democrático que se espalhou a outras cidades como Baida, Latakia, Douma (subúrbio de Damasco) e Homs. Na aldeia de Ain Arab, Norte da Síria, cerca de 600 curdos fizeram um protesto pacífico de uma hora, segundo a agência de notícias francesa AFP. A Al Jazeera informou que pelo menos cinco pessoas morreram em protestos perto da cidade de Homs. Citou fontes do governo dizendo que dois policiais morreram na localidade de Talbiseh, no dia 17, enquanto outros informes indicavam que também manifestantes foram mortos.

A Anistia Internacional informou que o conflito na Síria já provocou 171 mortes, e a lista enviada por um ativista indica que houve 972 prisões. “O regime escolheu o caminho da repressão violenta e não pode retroceder a esta altura, assim, prevejo maior derramamento de sangue. Mas, insisto em dizer que a violência é cometida por uma só parte”, disse Abdah. No dia 15, o presidente Bashar Al Assad anunciou a libertação de centenas de manifestantes, exceto os que estavam envolvidos em “atos criminosos”.

O governo insiste que organizações criminosas estão por trás de grande parte da violência. A agência nacional de notícias Sana, citando uma fonte oficial, acrescentou que 19 pessoas, incluindo membros das forças de segurança, foram assassinadas por “grupos armados”. Segundo Abdah, “são capangas contratados pelo regime, conhecidos como shabiha, e enviados para atacar os manifestantes”. Os meios oficialistas responsabilizam pelo levante um complô externo para derrubar Al Assad, organizado por Arábia Saudita, Estados Unidos e facções libanesas. Ativistas consideram estas acusações absurdas.

A repressão e as incriminações não dissuadem os manifestantes, que inicialmente exigiam mais liberdade, e agora pedem diretamente uma mudança de regime. O número e o alcance das manifestações são limitados em grandes cidades como Damasco e Aleppo, “mas o simples fato de ocorrerem já é significativo” destacou um ativista. “A Síria assiste ao ressurgimento da sociedade civil, que está em sua fase embrionária. Estão surgindo líderes comunitários que dirigem o movimento de protestos”, acrescentou Abdah. Em resposta, o governo sírio aposta em um duplo enfoque: em lugar de lançar uma forte repressão contra os manifestantes, aceitou receber uma delegação de Daraa, cidade que se converteu em símbolo da dissidência.

No dia 16, Assad prometeu que a lei de emergência, em vigor desde 1963, seria levantada antes do dia 25 deste mês. A implementação das reformas se tornou uma necessidade do regime para poder sobreviver. E, enquanto são feitas promessas de mudanças, a violência continua. Nas últimas semanas, a morte de soldados gerou especulações de que eles estavam sendo executados por se negarem a disparar contra manifestantes.

Abdah disse que, embora exista uma “elite” militar leal à família Assad, a vasta maioria das Forças Armadas é formada por sírios comuns. “A divisão dentro do Exército já começou. Há informes confirmados de conscritos e oficiais de baixa patente executados por desobedecerem a ordem de atirar nos manifestantes. Temos os nomes dessas pessoas. Também há informes confirmados de conscritos que acabam desertando para não matar civis”, acrescentou.

Se continuar o uso excessivo da força contra os civis, a hierarquia do Exército enfrentará um dilema: atuar diretamente na repressão ou colocar-se ao lado do povo. Por outro lado, uma recente declaração do Ministério do Interior da Síria não sugere que o regime mudará de atitude: “Não há mais lugar para a indulgência ou a tolerância na aplicação da lei para preservar a segurança do país e dos cidadãos, e proteger a ordem pública”. Envolverde/IPS