Washington, Estados Unidos, 5/8/2011 – Diante dos crescentes chamados no Congresso dos Estados Unidos para promover uma “mudança de regime” na Síria, a administração de Barack Obama endurece seu discurso contra o governo do presidente Bashar Al Assad. “Não queremos que ele permaneça na Síria apenas por causa da estabilidade. Pelo contrário, penso que está provocando a instabilidade”, disse à imprensa no dia 3 o porta-voz da Casa Branca, Jay Carney. “E cremos, francamente, que é certo dizer que a Síria seria um lugar melhor sem o presidente Assad”, acrescentou.
Foi a declaração de Washington mais próxima de um chamado à renúncia do líder sírio. Mas o fato de o governo Obama ainda não ter pedido explicitamente a saída de Assad, como fez com o ex-presidente egípcio Hosni Mubarak e continua fazendo com o líder líbio Muammar Gadafi, claramente frustra os neoconservadores e outros “falcões” (ala mais belicista) no Congresso, que estão a favor de medidas mais severas contra o regime.
“Os Estados Unidos deveriam impor sanções paralisantes em resposta ao assassinato de civis por soldados sob as ordens do presidente Assad”, disse o congressista Mark Kirk, do opositor Partido Republicano. Kirk foi um dos três senadores que, no dia 2, apresentaram um projeto de lei para exigir que Obama impeça negócios de empresas norte-americanas e de outros países com o setor energético sírio. “A Primavera Árabe varrerá esta ditadura, oxalá com ajuda de sanções norte-americanas semelhantes às adotadas contra o regime iraniano”, acrescentou Kirk.
Porém, analistas independentes sugerem cautela, particularmente com relação a sanções como as propostas por Kirk e seus colegas, pois poderiam afetar mais a população síria do que o governo. “Além de condenar o assassinato de civis pelo regime, Washington deveria se manter o mais longe possível da situação na Síria”, disse Bassam Haddad, especialista na região do levante mediterrâneo para a Universidade George Mason. “Inclusive em sua retórica dos últimos dias, o governo entrou em um território perigoso que poderia de fato fortalecer a posição do regime” de Assad, alertou.
O debate sobre a política dos Estados Unidos em relação a Damasco se intensificou desde o final de semana, quando as forças de Assad avançaram contra Hama, a quarta maior cidade da Síria, cenário de uma brutal repressão durante um levante popular em 1982, que deixou pelo menos dez mil mortos às vésperas do mês sagrado muçulmano do Ramadã. Mais de 150 pessoas teriam morrido em Hama nos últimos dias, talvez na mais sangrenta repressão a opositores desde que começaram os protestos, há cinco meses. Pelo menos 1.700 sírios morreram desde março, segundo organizações defensoras dos direitos humanos.
Em resposta ao último derramamento de sangue, Obama fez, no dia 31 de julho, suas mais duras declarações até então, afirmando que estava “consternado” pelo uso da “violência e brutalidade” do regime sírio, e afirmando que as informações que chegavam de Hama eram “horríveis”. “Por suas próprias ações, Bashar al Assad está assegurando que ele e seu regime fiquem no passado”, afirmou Obama, prometendo aumentar a pressão sobre Damasco e “trabalhar com outros no mundo para isolar o governo de Assad e estar do lado do povo sírio”.
Por sua vez, a secretária de Estado, Hillary Clinton, se reuniu no dia 2 com ativistas sírio-norte-americanos em uma demonstração de apoio à oposição na Síria que, entretanto, carece de coesão e líderes. Ao mesmo tempo, o embaixador dos Estados Unidos na Síria, Robert Ford, que enfureceu Damasco quando há duas semanas visitou Hama em solidariedade aos manifestantes, disse ao Senado norte-americano que o regime de Assad “não está disposto ou é incapaz de liderar a transição democrática exigida pelo povo sírio”.
À luz da violência em Hama, Washington e seus aliados europeus também renovaram a pressão esta semana, promovendo uma resolução do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) denunciando os métodos do regime sírio. Entretanto, encontrou resistência por parte da China e da Rússia, entre outros países. Os esforços culminaram, no dia 3, quando foi acordada uma declaração do presidente do Conselho condenando “as propagadas violações dos direitos humanos e o uso da força contra civis por parte das autoridades sírias”.
Por outro lado, funcionários do governo norte-americano, incluindo Clinton e Ford, anunciaram que haverá novas sanções coordenadas com a União Europeia, que serão anunciadas em breve. Entretanto, não está claro se estas sanções serão, como no passado, medidas contra indivíduos específicos próximos a Assad ou se serão disposições gerais destinadas a afetar toda a economia síria. Em seu depoimento no dia 2, Ford destacou que as sanções existentes estavam conseguindo um impacto, particularmente entre os membros da comunidade empresarial, e alertou contra medidas mais amplas que possam prejudicar seriamente a economia.
Contudo, essa mensagem – como a insistência de Ford em permanecer em Damasco – é algo que os falcões, incluindo Kirk, não querem ouvir. Estes pedem “sanções drásticas” (particularmente contra a venda de petróleo sírio, que representa cerca de um terço da receita com exportações do país), pois consideram que o colapso da já cambaleante economia precipitaria o fim do regime.
“Soa como uma repetição do caso iraquiano”, disse à IPS o especialista em temas sírios Joshua Landis, da Universidade de Oklahoma. “O problema é que o Ocidente está convencido de que o regime sírio está aos seus pés, e realmente sabemos que não é assim”, afirmou. “O regime é forte. Não governou a Síria por 40 anos para ser simplesmente derrubado por manifestações pacifistas. E, apesar de ter havido deserções, nada até agora apresenta uma real ameaça. Será uma luta longa e brutal”, acrescentou. Envolverde/IPS
* O blog de Jim Lobe sobre política externa pode ser lido em www.lobelog.com.