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Criador da Captcha quer combater o crime na Guatemala

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"Me dediquei a reutilizar o tempo", disse Luis von Ahn
Cidade da Guatemala, Guatemala, 19/7/2011 – Se você usa a internet, já se deparou com Captcha, um teste para determinar se o usuário é humano ou uma máquina. O que talvez não saiba é que um de seus inventores, o matemático Luis von Ahn, então com 21 anos, é cidadão de um dos países mais pobres da América Latina, a Guatemala. Um Captcha (em inglês, teste de Turing pública e automática para diferenciar máquinas e humanos) é esse conjunto de caracteres distorcidos que aparecem ao final de muitos formulários online. Como só pode ser decifrado por gente, é usado para evitar que programas de computação utilizem serviços como pesquisas e correio eletrônico e produzam tráfego de lixo.

As ideias de Von Ahn, de 31 anos, têm o propósito de fazer da internet uma ferramenta construída por todos e acessível a todos. Um exemplo é a reCaptcha, projeto que vendeu para o Google em 2009: uma extensão do teste Captcha que, ao mesmo tempo, ajuda a digitalizar textos. Por este método estão sendo digitalizados 2,5 milhões de livros impressos por ano. Cada vez que alguém decifra uma reCaptcha está digitando uma palavra ou frase de uma obra impressa.

A mesma lógica norteia a Duolingo, um sistema pelo qual os internautas poderão aprender idiomas gratuitamente, ajudando a traduzir os conteúdos da internet. Dessa forma se superaria a grande barreira do idioma para compartilhar o conhecimento na rede mundial de computadores e as limitações dos computadores, que não processam as linguagens humanas com exatidão.

Von Ahn vem aplicando a colaboração maciça na internet desde antes de ser cunhado o termo “crowdsourcing”, em 2006. Naquele ano ganhou o MacArthur Fellowship, o “prêmio do gênio” concedido a cidadãos e residentes nos Estados Unidos que “mostrem um mérito excepcional”, e em 2011 a revista Foreign Policy em espanhol o declarou como o intelectual ibero-americano mais influente. Depois do Duolingo, este professor da Carnegie Mellon University deseja “atacar o crime na Guatemala”, um problema que “nos impede de nos preocuparmos com a educação”, disse à IPS em entrevista por correio eletrônico.

IPS: Além de criar utilidades para a humanidade, está preocupado em economizar tempo?

LUIS VON AHN: O tempo que passamos fazendo coisas na internet é gigantesco, e em muitos casos podemos reutilizá-lo. É isto que me dedico a fazer, encontrar maneiras de reutilizar esse tempo. Nos Estados Unidos, creio que são três horas diárias que cada pessoa navega por redes sociais ou Youtube.

IPS: Como na reCaptcha, seu último projeto, o Duolingo também aproveita ao máximo o tempo, algo como matar dois pássaros com um só tiro.

LVA: No Duolingo pensamos primeiro como fazer para que as pessoas traduzam o conteúdo da internet para todos os idiomas. Daí surgiu a pergunta: como fazer as pessoas traduzirem toda a internet gratuitamente? Foi quando nos ocorreu que poderíamos matar dois pássaros com um único tiro: transformar a tradução em algo que as pessoas queiram fazer, e isso é aprender outros idiomas. Hoje em dia há um bilhão de pessoas aprendendo outros idiomas. O que fazemos é um serviço gratuito para aprender idiomas, mas, ao mesmo tempo, as pessoas estarão traduzindo parte da internet. Então, traduzem ao mesmo tempo em que aprendem. Há incontáveis conteúdos na internet dos quais centenas de milhões de pessoas estão excluídas. Em espanhol, a Wikipédia só tem 20% do conteúdo em inglês. Neste caso, estamos excluindo 500 milhões de pessoas de 80% do conteúdo da Wikipédia. O Duolingo está quase terminado. Estamos a poucos meses de seu lançamento e começaremos com traduções para inglês, francês, alemão e espanhol.

IPS: Você utilizou o crowdsourcing como base de suas iniciativas. Quais possibilidades tem este método para conceber soluções tecnológicas ou educacionais em áreas pobres?

LVA: Gostaria de poder usá-lo para ajudar lugares como a América Latina, e é por isso que estou trabalhando no Duolingo. Com ele faremos com que todo o conteúdo da internet seja acessível a qualquer pessoa no mundo.

IPS: A América Central tem profundos problemas de pobreza. Gostaria de contribuir nesse aspecto?

LVA: Ficaria encantado. O grande problema é que muitas das coisas que fazemos são a partir da internet e, por definição, as pessoas muito pobres não têm acesso a ela. Creio que eventualmente o problema que primeiro atacaremos será o crime. Não sei como fazê-lo, mas este é o tipo de coisa que gostaria de fazer depois do Duolingo.

IPS: E por que o crime. Você foi vítima de delinquência na Guatemala?

LVA: Felizmente, não. Mas creio que sou a única pessoa que conheço na Guatemala que nunca foi assaltada. Isto é algo que não nos deixa crescer. Se não estivéssemos tão preocupados com o crime, talvez pudéssemos nos preocupar com educação ou coisas assim, mas há tanta preocupação com o crime que é algo que precisa ser resolvido.

IPS: Mas, como poderia contribuir?

LVA: O uso das redes sociais e os telefones celulares realmente ajudaram essas revoluções do mundo árabe. E acredito que da mesma forma é possível que possam ajudar a resolver coisas como o crime na América Latina, mas não sei exatamente como fazer isso. Na Guatemala é impossível que os criminosos sejam mais de 50 mil. Mas este é o número que está aterrorizando 13 milhões de pessoas, e seria bom encontrar uma maneira de esses 13 milhões poderem ganhar.

IPS: Voltando à pobreza, lhe parece que o avanço da tecnologia seja tão grande que a brecha seja irrecuperável para os de menos posses?

LVA: Espero que não. Meu sonho é que a tecnologia ajude as populações pobres a superarem essa situação.

IPS: Há alguma forma de tornar a tecnologia mais acessível para esses setores?

LVA: Em algum momento será possível. A cada dia fica mais barato. O número de pessoas na internet cresce e há várias iniciativas para levá-la à população pobre, embora nenhuma funcione bem. Uma das maneiras que talvez tenha sucesso são os telefones, cujos usuários são em número maior do que o dos que usam a internet. Muita gente tem telefone e, por fim, vamos poder conectá-los à internet quase gratuitamente, e espero que isso ocorra nos próximos cinco anos. Nesse momento, poderemos chegar mais à classe pobre. Isso poderá ter um incrível impacto na educação. A porcentagem do mundo com acesso à internet ainda é inferior a 30%, e o restante representa exatamente as pessoas pobres. Envolverde/IPS