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Crise de moradia piora a desigualdade no Pacífico

O chefe Maki Massing diante de sua modesta casa construída com cimento e chapas de ferro ondulado na favela de Freswota, na periferia de Port Vila, em Vanuatu. Foto: Catherine Wilson/IPS
O chefe Maki Massing diante de sua modesta casa construída com cimento e chapas de ferro ondulado na favela de Freswota, na periferia de Port Vila, em Vanuatu. Foto: Catherine Wilson/IPS

 

Port Vila, Vanuatu, 12/6/2014 – A rápida migração do campo para as cidades devido a falta de serviços públicos e de emprego nas zonas rurais gera profunda mudança social nos países insulares do Pacífico, que se caracterizam por uma forte população agrária. Para piorar, os problemas de moradia nas cidades frustram os sonhos dos que abandonaram o campo em busca de uma vida melhor, pois acabam vivendo em favelas, em rápida expansão.

Em Vanuatu, com 247.262 habitantes, a população urbana cresce ao ritmo de 4%, o que coloca este país em segundo lugar na região, atrás das Ilhas Salomão. Na periferia de Port Vila, capital do país, com 44 mil habitantes, fica Freswota, um subúrbio com seis divisões administrativas identificadas por números de 1 a 6 e onde vivem oito mil pessoas.

O chefe Maki Massing, originário da ilha de Ambryn, nas províncias do norte desse país insular, é viúvo e tem seis filhos, com os quais vive em Freswota-4 há 30 anos. Quando acaba o dia, a luz das lâmpadas penduradas no jardim ilumina a casa que construiu com cimento e chapas de ferro ondulado. Coloridas cortinas de pano vestem as aberturas. Ao cair da noite, o burburinho inunda a rua enquanto Massing explica à IPS o motivo de ter abandonado o povoado de Lalinda.

“Meus filhos vieram estudar em Port Vila. Como minha renda da produção de copra (a polpa seca do coco) não eram muito boa, vim procurar trabalho para poder pagar a escola”, contou Massing. Este homem teve a sorte de encontrar emprego no setor formal. Após trabalhar 15 anos em um banco, foi para o Ministério da Saúde, onde permanece desde 1992.

As circunstâncias particulares da maioria da população de Freswota variam entre os que têm emprego permanente, os que trabalham no setor informal (venda de frutas e verduras no mercado) ou aqueles que estão desempregados. Mas há algo que todos têm em comum: os baixos salários e as más condições de vida.

Frank William, do Conselho da Municipalidade de Port Vila, disse à IPS que a terra da capital ainda não foi dividida em função de seus usos específicos, como residencial e comercial, o que complicou o planejamento urbano. “Há moradias públicas para quem chega para trabalhar, mas as pessoas de baixa renda não podem custeá-las”, afirmou.

O custo médio de uma casa básica gira em torno de US$ 31,6 mil a US$ 52,7 mil, quantia alta para muitas pessoas que ganham o salário mínimo, de aproximadamente US$ 316. A Corporação Nacional da Moradia, que carece de fundos, vende terrenos sem construir em Freswota-3.

O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento afirma que 16,8% dos funcionários públicos e 17,1% dos empregados do setor privado em Port Vila vivem na pobreza. “É muito caro para mim porque também tenho de pagar água, eletricidade, transporte e escola”, contou Massing. Mesmo sendo funcionário público, é obrigado a alugar dois quartos pequenos de sua casa para conseguir algum dinheiro extra.

Nos países insulares do Oceano Pacífico a migração do campo para a cidade supera o crescimento da oferta de trabalho, a disponibilidade de terras e a capacidade do Estado de aumentar o número de moradias e ampliar os serviços públicos. Da população desta região, com dez milhões de pessoas, 35% vive em povoados e cidades. Em Vanuatu, 25% dos habitantes são residentes urbanos e se prevê que em 2030 chegarão a ser 38%.

A falta de moradia decente piora a pobreza urbana. Nas ilhas do Pacífico, 25% dos residentes de áreas metropolitanas vivem em favelas. Em Port Vila, um terço das crianças é pobre, 20% mais do que a média nacional, segundo o Fórum das Ilhas do Pacífico (PIF).

Leias Cullwick, diretora-executiva do Conselho Nacional de Mulheres de Vanuatu, argumentou que o baixo salário mínimo e o alto custo de vida desta cidade deixam as famílias em graves dificuldades. “Dos residentes urbanos, 85% não podem pagar nem mesmo uma refeição decente por dia. Nos hospitais, 70% das mulheres que dão à luz não podem comprar alimentos saudáveis suficientes, e com isso seus bebês ficarão mal nutridos”, ressaltou.

A população também sofre a falta de serviços básicos. Massing se queixou de que em Freswota-4 se necessita com urgência de água, eletricidade e estradas. “Os primeiros cinco anos que estive aqui tinha de ir buscar água no rio todas as tardes para lavar e as necessidades da casa”, afirmou. Os líderes tradicionais como Massing tomam iniciativas para atender problemas de desenvolvimento e sociais nos assentamentos urbanos. “Falei com as autoridades e colocaram água e eletricidade nesta área”, afirmou.

Embora compreenda os desejos que levam as pessoas a emigrarem do campo para Port Vila, ele não acredita que a cidade a melhor opção para todo o mundo. “Reúno todos e digo a eles que para ficar aqui têm que ter emprego. Se não encontrarem, devem voltar para sua ilha porque Port Vila é uma cidade muito cara”” explicou Massing, destacando a necessidade de evitar a miséria e a delinquência.

Segundo o PIF, o Estado deve tomar medidas para melhorar o planejamento e reformar o mercado habitacional para beneficiar os mais necessitados. Para muitos moradores de Port Vila, incluídos Massing e Cullwick, a preocupação é o uso indefinido dos fundos destinados para melhorar os serviços e a infraestrutura. A Comissão de Corrupção de Vanuatu, criada no ano passado, tem por mandato atender a má gestão administrativa e política.

Cullwick disse que as casas tradicionais podem ser usadas para atender as necessidades das populações marginalizadas nas cidades. Segundo ela, se as construções forem adaptadas e se usar os materiais que existem em abundância, como palha e bambu, seria possível reduzir o custo de construir uma casa saudável e segura.

Enquanto isso, Vanuatu uniu-se ao Programa Participativo de Melhoria de Assentamentos da ONU Habitat, que pretende melhorar as condições de vida e avançar para o cumprimento do sétimo dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio: melhorar “consideravelmente até 2020 a vida de pelo menos 200 milhões de habitantes de bairros marginalizados. Envolverde/IPS