Foto: Dal Marcondes

Por meio de uma mensagem, divulgada nessa quinta (9), em comemoração ao Dia Internacional dos Povos Indígenas, a equipe das Nações Unidas no Brasil mandou um recado ao governo federal sobre a importância do cumprimento das convenções internacionais relacionadas à proteção desses grupos.

A cutucada vem exatamente em um momento em que a sociedade civil e movimentos sociais criticam duramente o governo Dilma por conta da edição da Portaria 303/2012 pela Advocacia Geral da União (AGU), no dia 17 de julho, para orientar o trabalho de seus advogados e procuradores em processos envolvendo terras indígenas. Sob a justificativa da soberania nacional, ela prevê que o Estado pode intervir nessas áreas sem a necessidade de consultas às comunidades envolvidas ou à Funai.

Ou seja, instalar unidades ou postos militares, construir estradas ou ferrovias, explorar alternativas energéticas (leia-se hidrelétricas, como Belo Monte, termelétricas, usinas nucleares, entre outros) ou resguardar “riquezas de cunho estratégico” para o país – minerais ou vegetais, por exemplo.

A Constituição Federal, no seu Artigo 231, afirma que a exploração de recursos hídricos e a construção de usinas hidrelétricas só podem ser feitas com a autorização do Congresso Nacional, desde que ouvidas as comunidades atingidas. Ao mesmo tempo, a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho, da qual o Brasil é signatário, estabelece que as populações tradicionais devem ser consultadas em situação assim.

No dia 26 de julho, a AGU alterou a Portaria 303/2012, suspendendo os seus efeitos até 24 de setembro. A Funai aproveitaria esse período para realizar audiências públicas com populações indígenas e consultá-las a respeito das novas regras. Novamente o governo foi criticado por entidades de defesas dos direitos das populações tradicionais, que viram nisso apenas uma manobra no sentido de esvaziar as críticas.

A nota da ONU no Brasil começa citando o secretário-geral Ban Ki-Moon: “faço um apelo aos Estados-membros e aos principais meios de comunicação para criar e manter oportunidades para que os povos indígenas consigam articular as suas perspectivas, prioridades e aspirações”.

Depois, traz um depoimento de Juan Somavia, diretor-geral da Organização Internacional do Trabalho: “a Aliança das Nações Unidas com os Povos Indígenas tem por objetivo respaldar os esforços dos povos indígenas e de seus governos por plasmar seus direitos e aspirações em uma mudança positiva mediante o fortalecimento de suas instituições e de sua capacidade para participar plenamente nos processos de governança e de políticas em escala local e nacional. Os processos inclusivos devem ter como base o diálogo (…)”.

Por fim, a nota afirma que a equipe da ONU no Brasil “reitera a importância da promoção e garantia dos direitos fundamentais dos povos sujeitos da Convenção 169 da OIT e da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas”. E “manifesta sua confiança nas autoridades brasileiras quanto a uma ação coordenada e sistemática para proteger os direitos dos povos indígenas e tribais e garantir o respeito à sua integralidade (Artigo 2º da Convenção 169), compatíveis com os procedimentos do sistema jurídico nacional (Artigo 8º da Convenção 169) e com as disposições relativas à consulta prévia previstas nos supracitados instrumentos internacionais (Artigos 6º e 15º da Convenção 169 e 32º da Declaração)”.

Mais claro, só se desenhar. Por isso, o governo deve ter entendido o recado. Mas como as obras do Programa de Aceleração do Crescimento não podem parar, será feito o que for preciso. Incluindo ignorar o que foi acordado internacionalmente.

* Publicado originalmente no site Blog do Sakamoto.