Em meio à crise econômica que vive a Espanha – país que registra a maior taxa de desemprego de sua história, 20,7%, traduzida em cinco milhões de pessoas sem trabalho – , existe um negócio que prospera sem cessar: a rede social Parobook, destinada a quem procura uma ocupação.
Como o nome sugere, o Parobook (www.parobook.es), criado em janeiro deste ano, funciona nos moldes do Facebook: apresenta os mesmos ícones, subdivisões e procedimentos de navegação. As diferenças são a cor que utiliza em suas páginas, um vermelho vivo como a ressaltar a urgência da questão trabalhista no país, e o fato de os usuários se dividirem entre os que oferecem emprego/empresas e os que buscam trabalho.
“Paro”, em espanhol, quer dizer desemprego. Assim o Parobook se define, literalmente, como “a rede social dos desempregados”. Por meio do slogan “Você está parado e não para de buscar trabalho?”, contabiliza até agora 19.900 usuários – em média, mil novas pessoas se inscrevem na página por mês – e se constituiu em um centro ativo de intercâmbio e fórum entre profissionais de várias faixas etárias, atividades e regiões.
A plataforma está aberta a pessoas do mundo todo, mas os espanhóis, como era de se esperar, são os que dominam os posts, entre comentários sobre a situação social do país, os prós e contras das ofertas de trabalho que surgem e pesquisas como o recente estudo realizado pelo Centro de Pesquisas Sociológicas, que aponta o desemprego como a principal preocupação de 84% dos habitantes da Espanha na atualidade.
Vez por outra – bastante esporadicamente, é necessário que se diga —, aparece um integrante que comemora haver encontrado emprego. É o caso de Diego Lagüera, motorista de 35 anos, desempregado havia um ano e que, dias atrás, celebrou virtualmente com os companheiros de Parobook sua contratação para um trabalho temporário de três meses.
Lagüera vai operar a grua municipal de Setién, um povoado na província de Cantábria, ao Norte do país. A oferta não lhe apareceu por conta do Parobook, mas avalia que a rede o ajudou a se manter atualizado sobre o mercado de trabalho na sua região e também a conhecer e compartilhar suas inquietações com a de outras pessoas em condições semelhantes.
“A situação deste país me decepciona. Acho injusto ver os políticos com uma série de direitos que o resto dos cidadãos não pode nem sonhar, onde a cultura do ‘quem indica’ tem mais importância que a preparação acadêmica, legisladores com salários imensos, com pensões vitalícias garantidas pelo trabalho estatal, mesmo quando depois exercem atividades no setor privado, como dirigentes de grandes empresas”, comenta em tom de desabafo.
Apesar da revolta com a política local, Lagüera não responsabiliza o PSOE (Partido Socialista Obrero Español, ao qual pertence o presidente José Luis Rodríguez Zapatero) pela crise econômica – problema que custou aos socialistas uma acachapante derrota nas eleições municipais de maio. “Para mim, os bancos são os grandes culpados pela situação atual, brincaram com a economia e depois foram salvos com dinheiro público. Daria no mesmo se estivéssemos sob comando do PSOE ou do PP (Partido Popular, opositor grande vitorioso do pleito regional recente), até porque essa crise se deve em grande parte ao setor imobiliário, um dos pilares da economia espanhola ao lado do turismo”, comenta.
O Parobook informa, majoritariamente, sobre ocupações de modesta remuneração – as que mais surgem –, como operadores de marketing, promotores de vendas, acompanhantes de anciãos, caixas de supermercado. Mas também agrupa profissionais menos acostumados a esses tipos de atividade e que se queixam, por exemplo, de ter que vender o carro ou fumar menos por conta do decréscimo nas economias ocasionado pelo desemprego, mais prolongado do que imaginavam – de acordo com as estatísticas, um desempregado espanhol leva em média seis meses para conseguir uma recolocação profissional.
A rede é coordenada por David Manzanero, madrilenho de 31 anos que é um de seus criadores e tem como única experiência profissional declarada o trabalho na plataforma. Manzanero interage, muitas vezes em tempo real, com todos os usuários, na tarefa de direcioná-los às melhores ofertas de trabalho.
Além das frases motivadoras que envia diariamente aos integrantes do Parobook, seleciona as notícias mais interessantes ou bem-humoradas sobre a situação econômico-social de seu país, como forma de amenizar a angústia dos que estão sem trabalho. A mais recente foi a sorte de um “indignado” de 34 anos que, ao chegar em casa, depois de passar todo o dia nos acampamentos de protesto da Porta do Sol de Madri, recebeu a notícia de que havia ganhado 1,3 milhão de euros em uma loteria por internet. Em declarações para a televisão, o ganhador disse que se dedicará à atividade empresarial.
Com a mesma intenção de auxiliar na busca de trabalho sem perder a esportiva, foi criado recentemente o aTraParo (www.atraparo.com), uma espécie de manual virtual concebido para fomentar em quem está desempregado “o uso da criatividade, da imaginação e das habilidades” de cada um, dizem Israel Bloesch e Alberto Santos, criadores da página.
Entre informações sobre legislação trabalhista ou conselhos sobre como reciclar conhecimentos, a aTraParo também oferece pitadas de humor, como a sequência de Ou Tudo ou Nada (filme britânico de 1997), em que Robert Carlyle visualiza desempregados em uma fila dançando ao som de Hot Stuff na voz de Donna Summer. “A aTraParo pretende ser um espaço de otimismo, esperança e motivação”, definem seus idealizadores.
No entanto, o gosto amargo da desilusão com um bem-estar social que não se concretizou reina – apesar das tentativas de rir para não chorar. “Só mesmo virando milionário para ser empresário na Espanha”, comentavam os usuários do Parobook sobre o afortunado “indignado” da Porta do Sol, por exemplo.
Sem recorrer à ironia, Lagüera explica o que considera um mal “generalizado” em seu país: “O erro do PSOE foi ter tomado medidas sociais nos momentos de bonança que agora não podem ser mantidas, e que, portanto, só estão beneficiando uma parte da sociedade. Também não conseguiram evitar que trabalhadores, há anos pagando hipotecas de suas casas, ao ficar desempregados e sem condições de honrar esses pagamentos, tenham não só perdido suas moradias como continuado a estar em dívida com os bancos”, analisa. “A crise não é culpa do governo do Partido Socialista. Mas o PSOE é culpado, sim, pelo mal-estar da sociedade espanhola em geral.”
* Publicado originalmente no site da revista Carta Capital.