Trípoli, Líbia, 13/6/2013 – Todos os olhares se dirigem à Líbia desde que o presidente do Níger, Mahamadu Isufu, declarou que os últimos ataques no norte de seu país foram obra de terroristas malineses localizados no sul do território líbio. Alguns analistas de segurança afirmam que há acampamentos de grupos islâmicos de Mali no sul da Líbia, mas outros asseguraram à IPS que isso é impossível.
O diretor do Centro de Estudos Africanos de Trípoli, Faraj Najem, disse à IPS que Mali não tem fronteira com a Líbia, o que impede o deslocamento de combatentes para o sul deste país. “Por sua vez, Trípoli poderia acusar seus vizinhos argelinos e nigerianos, pois se os terroristas malineses estão na Líbia tiveram que passar por esses países antes de chegarem aqui”, acrescentou.
O grupo jihadista Al Qaeda no Magreb Islâmico (AQMI), liderado pelo argelino Mojtar Belmojtar, assumiu a autoria de dois atentados suicidas cometidos no dia 23 de maio em Níger, na base militar de Agadez e na mina de urânio de Arlit. Os rebeldes disseram que os ataques foram um castigo pelo apoio de Níger à intervenção francesa em Mali.
Uma coalizão de organizações islâmicas, entre elas AQMI, Movimento pela Unicidade e a Jihad na África Ocidental, e Ansar Dine, ocuparam o norte de Mali no começo de 2012, até que a intervenção da França, no começo de janeiro deste ano, permitiu ao exército local recuperar o controle da região.
Segundo o governo de Níger, os ataques em seu país foram planejados na Líbia. Mas o primeiro-ministro líbio, Ali Zeidan, rechaçou as acusações, que qualificou de “infundadas”. O “sul da Líbia está controlado pelos tubus, que não estão relacionados com os movimentos islâmicos. Os tuaregues do Azawad e do Ansar Dine de Mali estão na Líbia porque lutaram com as forças do falecido coronel Muamar Gadafi, por isso não podem regressar”, explicou Najem.
Gadafi governou a Líbia desde 1969 até que as forças rebeldes líbias o capturaram e assassinaram em outubro de 2011. O novo governo assumiu em novembro do ano seguinte. “Não tenho informação de nenhuma presença terrorista no sul da Líbia”, afirmou Hussein Hamed al-Adsari, membro tuaregue do parlamento em Ubari, sudoeste da Líbia, em entrevista à IPS em Trípoli.
Abu Azum, deputado da região de Fezzan, no sul da Líbia, observou que o caso não está claro. “Não creio que os terroristas partam daqui. Ao mesmo tempo, é totalmente possível conseguirem armas no sul. Estão dispostos a pagar um preço alto por elas e há muitas circulando na Líbia”, disse à IPS.
Agila Maju Uled, representante da comunidade slimane em Sebha, também no sul da Líbia, disse que, apesar de “as fronteiras com Chade, Níger e Sudão estarem oficialmente fechadas”, desde dezembro de 2012, “todo mundo as cruza como se nada houvesse”. Contudo, ele não crê que haja acampamentos de rebeldes armados nessa região. “É possível que os terroristas tenham atravessado a Líbia rumo a Níger, vindos de Mali, para encobrir suas pegadas. Mas não é possível que continuem aqui. Todos sabem de tudo no deserto. Se chega alguém novo, imediatamente fica-se sabendo”, pontuou à IPS.
No entanto, um analista de segurança de Trípoli, que pediu para não ser identificado, não concorda. “É certo que as tribos do sul controlam todo o território. E por isso sabem muito bem que a AQMI está na área”, afirmou. Samuel Laurent, autor de Sahelistan, um livro sobre os movimentos jihadistas da região, concordou com ele. “Os tuaregues, que controlam o sudeste da Líbia, escondem insurgentes islâmicos. Como regra geral, as razões são principalmente mais econômicas do que religiosas”, opinou. “Belmojtar é milionário”, acrescentou.
Laurent, consultor em temas de segurança, disse que os islâmicos malineses se estabeleceram na Líbia em novembro do ano passado, bem antes da intervenção francesa. “O verdadeiro núcleo da AQMI se reagrupa no sudeste da Líbia há meses”, afirmou. Para ele, Trípoli nunca concordará com uma intervenção ocidental, ao contrário do governo de Mali. “E mais: graças ao contrabando de armas do regime de Gadafi, elas estão em circulação. De longe, a Líbia é um refúgio mais rentável para os terroristas do que Mali”, garantiu.
No começo deste mês, Paris e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) ofereceram ajuda ao governo da Líbia contra os combatentes da Al Qaeda, expulsos do norte de Mali. O ministro da Defesa da França, Jean-Yves Le Drian, declarou que seu país estava “pronto para ajudar a Líbia a garantir suas fronteiras” do sul.
A Otan anunciou no dia 4 que enviaria uma equipe de especialistas à Líbia. Seu secretário-geral, o dinamarquês Anders Fogh Rasmussen, foi categórico ao afirmar que, de forma alguma, a missão representava envio de tropas ao terreno. O governo líbio pediu ajuda à Otan e a alguns países ocidentais para garantir suas fronteiras, apesar de alguns membros do governo terem reservas a respeito.
“A intervenção da polícia e do exército líbios no sul é a opção preferida”, disse al-Adsari. “Embora estas instituições não estejam totalmente formadas, os líbios têm que assumir a situação”, ressaltou. Maju Uled disse que não lhe “agrada a ideia de uma intervenção externa. Se o Ocidente quer nos ajudar, deve treinar nosso exército, e não vir e fazer cumprir a lei em nosso território”. Em uma entrevista coletiva no dia 2, Zeidan anunciou medidas para reforçar a presença do exército líbio. Entre elas aumentar os salários e benefícios para US$ 1.200 como incentivo para que soldados e ex-rebeldes concordem em trabalhar no difícil sul do país. Envolverde/IPS