Embora não surpreendam – havia indícios -, são inquietantes as informações sobre aumento do desmatamento na Amazônia. Foram 2.007 quilômetros quadrados na Amazônia Legal em um ano, segundo o Imazon (20/8), ou quase 92% mais que em igual período anterior. Aos quais se devem acrescentar 1.155 quilômetros quadrados de florestas degradadas no período. E tudo se traduzindo em 100 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO2) equivalentes emitidas em 12 meses.
Mais complicado ainda porque um balanço oficial de cinco anos (2005-2010) dizia que o desmatamento era o único setor no País em que se haviam reduzido (em 65%) as emissões de poluentes que contribuem para o aumento da temperatura planetária, quando as emissões no setor energia haviam subido 21,4%, no tratamento de resíduos, 16,4%, na indústria, 5,3% e na agropecuária, 5,2%. Nesse quadro, as emissões totais do Brasil ficavam em 1,25 bilhões de toneladas de CO2 equivalentes (2,03 bilhões em 2005), que se traduziam em cerca de 7 toneladas por brasileiro (outras fontes apontam até 10 toneladas por pessoa).
Pode ser ainda mais inquietante saber que terminou em Bonn, na Alemanha, uma reunião preparatória para a Convenção do Clima, que será realizada em novembro em Varsóvia (Polônia). E a maioria dos analistas saiu convencida de que é muito improvável, este ano ou no próximo, chegar a um acordo que defina metas obrigatórias de redução de emissões em todos os países, a serem incluídas em 2015 num convênio global para vigorarem em 2020 e possibilitarem que se contenha o aumento de temperatura na Terra em 2 graus Celsius até 2050. Também empacaram as discussões sobre contribuições financeiras dos países industrializados para “mitigação de emissões” e “adaptação às mudanças”, com os “países em desenvolvimento” exigindo recursos para compensar danos que poderiam ser de US$ 1 trilhão por ano.
Pode parecer repetitivo tratar com tanta frequência neste espaço desse tema das mudanças climáticas, mas as notícias são a cada dia mais graves. Uma boa informação, entretanto – ainda não anunciada oficialmente -, é a de que o Brasil voltará, na reunião da convenção, à proposta que fez em 1997, quando se discutia o Protocolo de Kyoto: passariam a ser obrigatórios compromissos de todos os países para reduzir as emissões de poluentes, proporcionalmente à contribuição que tenham dado para a concentração de gases na atmosfera e às suas emissões atuais (em Kyoto decidiu-se apenas que os 37 industrializados baixariam suas emissões em 5,2%, calculados sobre as de 1990; mas o protocolo não teve as adesões necessárias). Até aqui, o Brasil só tem aceitado “compromissos voluntários” de baixar entre 36,1% e 38,9% suas emissões, calculadas sobre o total a que chegaríamos em 2020.
É um assunto vital, quando cenários traçados para este século por 345 cientistas para o Painel do Clima da convenção dizem que a temperatura no Brasil pode subir até 3 graus Celsius. E a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) prevê (20/8) que as culturas de milho, arroz e mandioca serão as mais afetadas, com perdas, hoje em mais de R$ 7 bilhões, que serão o dobro em mais algumas décadas.
Há visões mais otimistas, como as de cientistas que apontam a intenção da China e dos Estados Unidos de reduzirem em 40% as suas emissões na fabricação de cada produto. Mas a China também está deixando cientistas de cabelos em pé com a criação de uma rota de navegação para a Europa atravessando o Ártico (reduz de 48 para 33 dias o tempo gasto) – e contribuindo para mais degelo. Os Estados Unidos conseguiram baixar suas emissões intensificando a exploração de gás de xisto, com um método baseado em fratura de rochas e injeção de água e produtos químicos – que implica, no retorno deles à superfície, a mistura da água superficial com poluentes altamente danosos e em grande quantidade (o Brasil também vai entrar por esse caminho).
Acrescem-se as informações da Global Footprint Network de que no dia 20 último se completou o prazo (menos de oito meses) em que o mundo consumiu os recursos naturais que deveriam bastar para um ano todo – ou seja, a “pegada ambiental” global indica que precisamos de 50% mais de recursos que os disponíveis. E com isso se vai agravando o quadro planetário (Folha de S.Paulo, 20/8). O Japão já consome 7,1 vezes mais que os recursos disponíveis em seu território, a Grã-Bretanha, 3,5 vezes e os Estados Unidos, 1,9. O Brasil, embora use menos recursos que sua disponibilidade interna, consome mais que a média global disponível. Em 2050, afirma o estudo da Global Footprint Network, o mundo precisará de recursos equivalentes ao dobro dos disponíveis na Terra.
Não é diferente do que pensa a Convenção da Biodiversidade, que, preocupada, já em 2010 pediu que se adotassem metas de pelo menos 17% das áreas terrestres no mundo protegidas, assim como 10% de áreas oceânicas.
São visões como essa que levaram o escritor (austríaco radicado nos Estados Unidos) Fritjof Capra – autor de O Tao da Física e A Teia da Vida – a dizer no X Congresso Brasileiro de Direito Socioambiental (Instituto Carbono Brasil, 9/8), que nosso país é um dos “possíveis líderes para o desenvolvimento qualitativo sustentável” – desde que “os negócios, a economia, as tecnologias, as estruturas físicas não interfiram na capacidade da natureza de sustentar a vida”.
Porque “o crescimento infinito é ilusão”. Bem na linha que se propaga entre economistas de que já vivemos uma “crise de finitude de recursos”, com o consumo global maior que a reposição. E crescerá ainda mais, com a população mundial – hoje pouco acima de 7 bilhões de pessoas e um acréscimo de 80 milhões por ano – chegando a mais de 9 bilhões em 2050.
* Washington Novaes é jornalista.
** Publicado originalmente no site O Estado de S. Paulo.