Apesar das advertências de ambientalistas, com argumentos científicos, a devastação da natureza prossegue, no Brasil e no mundo, alimentada pela ignorância de muitos, pela ganância especulativa ou pela cegueira política.
Há dias, sem referir-se às obras da usina hidrelétrica de Belo Monte, que inundará mais de 500km² da floresta amazônica, uma emissora de tevê mostrou a invasão do mar que destrói, cada vez mais, ano a ano, as casas numa praia de Fortaleza, no Ceará. Obviamente, os moradores das habitações praieiras, pescadores pobres ou gente rica, têm noção de que seus dramas não diferem muito dos que afligem a população de Belo Monte.
A ignorância, a ganância e a cegueira mencionadas acima devem chocar cearenses e paraenses. Imagine só, leitor: em 1755, Portugal e o mundo civilizado lamentaram o terremoto de Lisboa, considerando-o castigo divino ao comportamento pecaminoso dos portugueses. Emanuel Kant, alemão de Koenigsberg, estudioso de teologia e ciências, além de grande filósofo, fulminou essa conclusão.
Sobre o ocorrido em Lisboa, ele disse: “Recuso-me a reconhecer as regras da perfeição da natureza, globalmente perspectivada, considerando que tudo tem de estar disposto em função de nossas conveniências. O ser humano tem de aprender a adaptar-se à natureza e não pretender que ela se adapte a ele”. Noutras palavras: o homem não pode desnaturar a natureza.
Mas a Alemanha desse homem notável ignorou, até hoje, sua lição. Só passados 255 anos do maremoto que destruiu Lisboa, outro fenômeno igual, nos mares do Japão, atingiu usinas nucleares neste país e acordou os alemães, que decidiram acabar com todas as suas usinas.
Já o Brasil constrói uma terceira usina, em Angra dos Reis, cidade à beira-mar, praticamente a um pulo do Rio de Janeiro, situada, em linha reta, a menos de 150km dela. A emissão radioativa das usinas de Fukushima, afetadas pelo maremoto, de março último, atingiu Tóquio, a 240km de distância. Que risco para o Rio e seu povo, às voltas com obras para o mundial de futebol em 2014 e olimpíadas de 2016. Que o sábio Kant ilumine o governo, políticos, empresários e cientistas, para livrar-nos dessa desgraça.
* Publicado originalmente no jornal Correio Braziliense e retirado do site Amazônia.org.br.