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Dinheiro do desenvolvimento é gasto em armas nucleares

Lançamento de teste do Minuteman III, 1994. Os Estados Unidos representam três quartos do gasto mundial em arsenais nucleares. Foto: Departamento de Defesa dos Estados Unidos/Domínio público

Nações Unidas, 30/7/2012 – Dias antes do reinício das conversações da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre desarmamento, hoje, em Genebra, aumentaram as reclamações contra os Estados nucleares para que gastem menos em seus arsenais e usem esses fundos para o desenvolvimento. “A quantia que ainda se gasta em armas nucleares não tem sentido, bem como a contínua dependência dessas armas”, disse à IPS David Kreiger, presidente da Fundação pela Paz na Era Nuclear, dos Estados Unidos.

Seus comentários se referiam ao fato de que nove dos 193 Estados-membros da ONU continuam aumentando seus orçamentos para a manutenção e modernização das armas nucleares, apesar das promessas de reduzirem seus arsenais. No ano passado, os Estados nucleares gastaram cerca de US$ 105 bilhões nesses arsenais, segundo estimativas independentes. Apenas os Estados Unidos gastaram US$ 61 bilhões.

Um estudo da Global Zero, organização norte-americana que defende o desarmamento, indica que no ano passado a Rússia gastou US$ 14,9 bilhões em armas nucleares, a China US$ 7,6 bilhões, França US$ 6 bilhões e Grã-Bretanha US$ 5,5 bilhões. Por sua vez, as quatro potências nucleares não declaradas exibiram um padrão de comportamento semelhante, com maiores gastos em armas nucleares. A Índia gastou US$ 4,9 bilhões, o Paquistão US$ 2,2 bilhões, Israel US$ 1,9 bilhão e Coreia do Norte US$ 700 milhões.

O cálculo da Global Zero se refere apenas a pesquisa, desenvolvimento, compra, teste, operação, manutenção e modernização do arsenal nuclear, e não a muitas outras atividades relacionadas. Também prevê como muito provável que os gastos serão os mesmos este ano. E isso apesar de a maioria dos governos continuarem enfrentando restrições financeiras causadas pela prolongada crise econômica, e parecerem inclinados a introduzir mais cortes nos serviços sociais.

Considerando que milhões de pessoas em todo o mundo sofrem fome, enfermidades e falta de um teto, Kreiger qualificou de “obscena” esta tendência de aumentar o gasto em armas nucleares. “As armas nucleares absorvem recursos que poderiam ser utilizados para cumprir os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio” (ODM), afirmou. Os especialistas da ONU dizem que querem arrecadar cerca de US$ 400 bilhões anuais para o desenvolvimento. Mas essa quantia fica cada vez mais difícil de ser conseguida porque a maioria dos principais doadores não está cumprindo seus compromissos.

Segundo as Nações Unidas, faltam US$ 167 bilhões em assistência oficial ao desenvolvimento, o que torna difícil que os países pobres alcancem todos os ODM até 2015. Essa escassez de fundos pode ser superada facilmente se houver uma drástica redução no custo de manutenção e modernização das armas nucleares, segundo ativistas pela paz.

“As nações nucleares gastam cerca de US$ 300 milhões por dia em suas forças nucleares”, afirmou em um comunicado o ativista Tim Wright, da Campanha Internacional para Abolir as Armas Nucleares. “Naturalmente, existe uma maneira melhor de gastar este dinheiro do que em armas que ameaçam a todos nós”, acrescentou Wright. Estima-se que, atualmente, os Estados nucleares possuem cerca de 19,5 mil armas atômicas, segundo a Critical Will, uma organização não governamental que trabalha em estreita colaboração com a ONU em matéria de não proliferação e desarmamento.

Apesar do novo Tratado de Redução de Armas Estratégicas (Start), assinado em 2010, tanto Estados Unidos quanto Rússia continuam modernizando seus arsenais. O mesmo ocorre com Grã-Bretanha, França e China, além das outras quatro potências nucleares de fato. Embora os registros de gasto das cinco potências nucleares declaradas sejam difíceis de se precisar, devido à falta de transparência em certas áreas, os pesquisadores dizem que é muito mais difícil encontrar dados precisos em relação ao gasto com armas atômicas em países nucleares de fato.

No caso do Paquistão, por exemplo, que não assinou o Tratado de Não Proliferação Nuclear, não há uma responsabilidade pública que o obrigue a prestar contas sobre o custo das armas nucleares. É um segredo de Estado. Quando foi perguntado a um diplomata paquistanês sobre o custo do programa nuclear de seu país, respondeu: “Não sei. Por que não fala com os diplomatas dos Estados Unidos e de outros países? Por acaso eles dizem ao seu povo quanto dinheiro estão gastando?”. Sua resposta insinua que os números divulgados pelos Estados nucleares declarados tampouco são autênticos. Contudo, os ativistas pela paz na região contra-atacam este argumento.

“Todos os Estados nucleares lançaram seu programa armamentista sem o conhecimento de seus próprios habitantes. Este sigilo em torno do que ocorre dentro dos programas nucleares e quanto custam aos cofres públicos é uma tentativa de evitar responsabilidades”, apontou Zia Mian, que dirige um projeto sobre paz e segurança na Universidade de Princeton. “As primeiras vítimas dos programas nucleares são as pessoas que se supõem devem proteger”, disse à IPS, citando dados recentes segundo os quais o Paquistão gasta 1% de seu produto interno bruto em saúde e educação. Aproximadamente metade da população desse país não sabe ler nem escrever.

Kreiger destacou que o fato de os líderes dos Estados nucleares não terem conseguido “livrar o mundo destas armas mostra nada menos que uma cruel indiferença com os que sofrem, pois asseguram que seus próprios cidadãos sejam alvos de armas nucleares”. A Conferência de Desarmamento da ONU, que começa hoje em Genebra, vai até 14 de setembro. No passado, esta instância negociou alguns importantes acordos internacionais, incluindo o Tratado de Não Proliferação e o Tratado de Proibição Completa dos Testes Nucleares. Envolverde/IPS