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Discurso presidencial provoca protestos na Síria

Doha, Catar, 21/6/2011 (IPS/Al Jazeera) – Os manifestantes tomaram as ruas na Síria para protestar contra o discurso do presidente Bashar al Assad, porque – alegaram – não deu uma resposta à reclamação popular por profundas reformas políticas. Ontem aconteceram manifestações nas maiores cidades do país, Homs, Hama, Latakia e nos subúrbios da capital Damasco. Nos distritos de Sleibeh e Raml al-Filistini, da costeira Latakia, os manifestantes gritavam “mentiroso, mentiroso”.

“O povo esperava que o presidente dissesse algo importante sobre retirar os tanques e as tropas das ruas. Mas as pessoas se sentiram enganadas e começaram a ocupar as ruas logo após terminar o discurso”, disse uma ativista nesta cidade. “Não ao diálogo com os assassinos”, gritavam os manifestantes no subúrbio de Irbin, em Damasco. Os protestos também aconteceram na cidade de Albu Kamal, na fronteira com o Iraque, em Deraa e outras aldeias da planície de Hauran, no Sul, berço do levante antigovernamental que já dura quatro meses.

Segundo ativistas, dezenas de estudantes foram presos quando protestavam no campus da Universidade de Alepo, no Norte, a segunda maior cidade depois de Damasco. Enquanto isso, a televisão estatal transmitia imagens de uma manifestação a favor do presidente na antiga cidadela de Alepo, na qual os participantes agitavam uma bandeira síria junto com uma bandeira da Rússia. O presidente russo, Dimitri Medvédev, disse, no dia 16, ao jornal britânico Financial Times que seu país exerceria seu poder de veto contra qualquer resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas encaminhada a justificar uma intervenção militar na Síria.

Em um discurso televisado de 70 minutos, Al Assad reconheceu como legítimos os pedidos de reformas, mas disse que “sabotadores” exploram a situação. Apesar de chamar um “diálogo nacional”, afirmou que “não há solução política para os que portam armas e assassinam”. O presidente anunciou que iniciará um diálogo nacional em breve e que está criando um comitê para estudar mudanças na Constituição, incluindo a abertura para a formação de partidos políticos, hoje proibida, exceto o governante Baas. O mandatário disse esperar que o pacote de reformas esteja pronto em setembro ou, no máximo, no final do ano.

A ministra e conselheira presidencial, Bouthaina Shaaban, afirmou que a agenda presidencial de mudanças se baseia no “que quer o povo sírio”. Nos “últimos dois meses se reuniu com milhares de pessoas de todo o pais, de todos os estilos de vida, de todas as religiões, e, portanto, sua visão se baseia no que o povo da Síria deseja e necessita”, afirmou Shaaban à Al Jazeera. A oposição criticou o discurso, afirmando que carece de qualquer sinal claro de transição para uma verdadeira democracia.

A rede de Comitês de Coordenação afirmou em um comunicado que o presidente não “deu atenção” à “nova realidade” que o levante popular criou. Os Comitês tampouco aceitaram o chamado para o diálogo feito por Al Assad, considerando “uma forma de ganhar tempo”.

“Já havíamos anunciado, rejeitamos dialogar enquanto continuarem os assassinatos, a intimidação, os sítios às cidades e as prisões arbitrárias. Como cremos que não há nenhum benefício nesse diálogo se não está destinado a virar a página do atual regime de forma pacífica”, diz o texto. “A verdadeira resposta ao discurso partiu das pessoas minutos depois, quando os protestos começaram em várias cidades e províncias”, acrescenta a nota.

O ex-embaixador dos Estados Unidos na Síria, Theodore Kattouf, considerou que o conteúdo do discurso ficou “curto em detalhes que teriam dado confiança quanto a se tratar de um esforço real para modificar radicalmente um regime que exerce o poder há 40 anos. Foi algo que enfureceu o povo e levou mais manifestantes às ruas, como vimos”, afirmou à Al Jazeera.

Os protestos também aconteceram nos acampamentos de refugiados na Turquia. “Al Assad, não queremos você nem o seu partido”, gritavam alguns enquanto atiravam sapatos contra a tela da televisão, em um típico gesto árabe de descontentamento. Mais de dez mil pessoas cruzaram a fronteira para a Turquia fugindo da violência no Noroeste do país. O presidente reclamou o retorno dos refugiados, assegurando que não haverá represálias.

Para o presidente turco, Abdullah Gul, as palavras de seu colega sírio não “foram suficientes”, e o exortou a praticar um sistema multipartidário. Washington, por sua vez, disse que quer “atos, não palavras”. Victoria Nuland, uma porta-voz do Departamento de Estado norte-americano, afirmou que “Bashar Al Assad está há semanas fazendo promessas ao povo. Agora o importante são os atos, não as palavras”.

A chefe da diplomacia européia, Catherine Ashton, qualificou de decepcionante as palavras de Al Assad. O presidente “deve lançar um diálogo crível, genuíno e inclusivo, e cabe ao seu povo julgar sua vontade de mudança”, afirmou aos jornalistas, após um encontro de chanceleres da União Europeia. “Devo dizer que, em princípio, o discurso foi decepcionante.” A UE se prepara para ampliar suas sanções contra o regime sírio em resposta à repressão dos opositores. Envolverde/IPS

* Publicado sob acordo com a Al Jazeera.