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Durban pode ser a última oportunidade

O retorno a temperaturas prévias ao fenômeno da mudança climático é muito improvável. Foto: US EPA Creative Commons

Changwon, Coreia do Sul, 25/10/2011 – As possibilidades de conter o aquecimento global em menos de dois graus se dissipam rapidamente, alerta um informe científico com vistas à próxima conferência internacional na cidade sul-africana de Durban. Se não forem freadas rapidamente as emissões de dióxido de carbono (CO²), as temperaturas em grandes regiões da África, na maior parte da Rússia e no norte da China aumentarão dois graus em menos de dez anos. Depois será a vez de Canadá e Alasca, diz o estudo.

Fixar um teto mundial de emissões e um ano limite para isso tem sentido na perspectiva científica, disse Joeri Rogelj, do Instituto para Ciências Atmosféricas e Climáticas em Zurique, diretor da análise publicada no dia 23, na revista Nature Climate Change. Entre 28 de novembro e 9 de dezembro acontecerá em Durban a 17ª Conferência das Partes (COP 17) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática. Representantes governamentais realizarão uma nova rodada de negociações por um tratado mundial que garanta um aumento inferior a dois graus centígrados.

A IPS perguntou a Rogelj se os delegados em Durban deveriam fixar um ano no qual as emissões mundiais teriam de alcançar seu pico e em seguida baixar para garantir esse limite no aumento das temperaturas. “Comprometer-se com essas metas nos obrigaria a seguir em nível mundial por um caminho de baixas emissões tecnológica e economicamente viável”, respondeu o cientista. A análise indica que, para ter uma probabilidade de 66%, ou mais, de que o aquecimento não passe dos dois graus neste século, as emissões de carbono deveriam atingir seu pico antes de 2020.

As liberações de CO² tenderiam a chegar a até 44 bilhões de toneladas em 2020, isto é, quatro bilhões a menos do que as estimadas para 2010. Depois de 2020, as emissões deveriam baixar rapidamente, cerca de 2% a 3% ao ano, para chegar a 20 bilhões de toneladas em 2050, segundo os modelos elaborados por computador. Contudo, este será um caminho muito difícil, reconhecem Rogelj e seus colegas no estudo.

A Agência Internacional de Energia (AIE) estima que 80% das emissões projetadas da parte do setor energético em 2020 já estão asseguradas, pois serão fornecidos por usinas que estão funcionando agora ou se encontram em construção. “O significativo aumento nas emissões de CO² e o fato de que futuras emissões já estejam asseguradas devido a investimentos na infraestrutura representam um sério revés para nossas esperanças de limitar o aumento mundial da temperatura a menos de dois graus”, disse, em maio, Fatih Birol, economista-chefe da AIE.

O aquecimento por causa do uso de combustíveis fósseis se manifesta de forma desigual, já que 70% do planeta é composto de água, e a maior parte é água fria. Por várias razões, Ártico, Canadá, Eurásia e partes da África esquentam mais rápido e sofrerão um substancial aumento de temperatura nas próximas décadas. Também é importante entender que o retorno às temperaturas anteriores ao fenômeno da mudança climática é muito improvável.

Outra análise, também publicada na mesma edição da Nature Climate Change, alerta que grande parte do Hemisfério Norte e regiões da África cruzarão o umbral dos dois graus. Se não houver grandes reduções nas emissões, o Sahel africano (faixa semiárida que atravessa o continente), o Chifre da África, norte da Eurásia e Ártico cruzarão o umbral muito em breve, entre 2020 e 2030, segundo um estudo liderado por Manoj Joshi, da britânica Universidade de Reading.

O estudo diz, também, que, quando uma criança nascida hoje completar 50 anos, as temperaturas estarão dois graus mais altas em todo o planeta, exceto nos oceanos. Ainda que as emissões de carbono não possam ser reduzidas com a rapidez suficiente a fim de evitar o aumento de dois graus em algumas partes do mundo, ações urgentes poderiam ganhar tempo (uma década ou duas) para que essas regiões se adaptem, desde que tivessem ferramentas para isso.

Embora dois graus pareçam pouco, são suficientes para uma pessoa sofrer febre alta, com graves consequências em todo seu organismo. Do mesmo modo, a elevação da temperatura da Terra afetaria severamente os alimentos, a água e a biodiversidade, desatando eventos climáticos extremos mais fortes, incluindo secas e inundações.

Um aumento de dois graus levaria a humanidade a viver em um planeta mais quente e tormentoso, e, portanto, com menos possibilidades de sobrevivência. Assim, nações africanas, do Pacífico e outras insistem em limitar esse aumento em menos de 1,5 grau, pois consideram que isto é essencial para sua existência. Entretanto, já poderia ser muito tarde.

Em todos os 193 cenários examinados por Rogelj e seus colegas, apenas dois sugeriam a possibilidade de as temperaturas não aumentarem mais de 1,5 grau neste século. E para isso seria preciso um forte uso de bioenergia com métodos de captura de carbono. “Os dois cenários que analisamos indicam que seria tecnológica e economicamente possível seguir um caminho assim. Embora não levem em conta que poderia haver barreiras políticas e sociais”, disse o cientista.

A possibilidade de conter o aquecimento global em menos de dois graus se dilui mais rápido do que muitos pensam, e sem falar em 1,5 grau. Governos, indústria e público têm pouco tempo para reduzir as emissões em pelo menos quatro bilhões de toneladas. É muito difícil, mas não impossível, disseram Rogelj e seus colegas no estudo. E começando antes fica mais fácil. As conversações de Durban podem ser a última chance para os governos cumprirem sua promessa de limitar o aquecimento a menos de dois graus.

O estudo de Rogelj termina com uma exortação aos governos e ao público em geral. “Sem um firme compromisso para aplicar mecanismos que permitam um teto em breve nas emissões globais, seguido de rápidas reduções, existem significativos riscos de que a meta de dois graus, apoiada por tantas nações, escorra pelos dedos”. Envolverde/IPS