Até o momento em que escrevo este texto, não foram divulgadas fotos de Bin Laden morto, e como sou meio estilo São Tomé, não acredito muito nesse negócio de falarem que um exame de DNA comprovou que o defunto era ele mesmo. Quer dizer, comprovou não: deu 99,9% de certeza. E o 0,01%, como fica?
Mas a questão é que um amigo se mostrou espantado com as comemorações dos gringos pela morte dele, e me perguntou se eu tenho conhecimento de alguma coisa semelhante acontecida no Brasil.
Lembro-me de umas comemorações específicas, de pequenos grupos, pela morte de algumas figuras malignas da política brasileira, mas nada de sair às ruas de madrugada, pulando e pisoteando cartazes com a cara do defunto. Bem que eu achava, por exemplo, que quando Roberto Campos morresse ia ter comemoração nas ruas, mas ele mereceu foi artigos respeitosos nos jornais e revistas. Virou santo, como quase todos os mortos brasileiros que em vida não foram tão santos assim. Fiquei me lembrando do número de brasileiros que foram pro beleléu por causa da política econômica cruel que ele implantou.
Não me lembro de nenhuma festa pela morte de Garrastazu Médici, por exemplo.
Claro, dirão, aqui não houve um Bin Laden.
Historicamente houve sim, e muitos. E eles se tornaram “herois” da pátria. É o caso do bandeirante Raposo Tavares, que comandou o massacre e preamento de índios. Suas expedições mataram milhares e milhares de índios e trouxeram para São Paulo, preados como escravos, outros tantos.
Outro “heroi” desses foi Mem de Sá. Em 7 de julho de 1559, ele arrasou quatro aldeias dos Tupiniquim, e sai contando papo depois: “Vim queimando e destruindo todas as aldeias que ficaram atrás”.
Mas são coisas de tempos distantes, dirão novamente. Então me lembrei de um fato mais recente e o morto não era menos matador que Bin Laden, e era até mais cruel, porque era torturador.
Bin Laden morreu no dia primeiro de maio, entre meia-noite e uma hora da manhã, hora de Brasília. Esse morto brasileiro também morreu num primeiro de maio, entre meia-noite e uma hora da manhã. Foi em 1979. Era o delegado Sérgio Paranhos Fleury, do Dops de São Paulo
Só que não foi assassinado, segundo a versão oficial. Bêbado, caiu de um barco em Ilhabela e morreu afogado. A notícia chegou quando comemorávamos o Primeiro de Maio na Vila Euclides, em São Bernardo do Campo. Alguém deu a notícia no alto-falante, houve uma onda de euforia, gritos de alegria, e a coisa parou por aí.
Mas depois bateu a dúvida: ele morreu de acidente mesmo ou foi queima de arquivo no fim da ditadura? E mais ainda: será que ele morreu mesmo ou enterraram uma pessoa qualquer com o nome dele no Cemitério São Paulo, no bairro de Pinheiros?
Só sei que o jornal Em Tempo, um semanário de esquerda, deu como manchete “O carrasco escapou da justiça”. E foi apreendido.
* Publicado originalmente no blog do autor, no site da Revista Fórum.