Na medida em que a mulher retarda a primeira gestação para depois dos 35 anos, existe maior chance de haver uma coincidência entre a gestação e doenças mais comuns dessa faixa etária. “É o que tem acontecido. É mestrado, doutorado e depois a gravidez. Uma executiva estressada, por exemplo, pode desenvolver uma hipertensão arterial, diabetes, hipotireoidismo e até um câncer de mama”, diz o ginecologista Waldemir Rezende, especialista em obstetrícia e mastologia do Hospital Santa Catarina.
Segundo dados do Instituto Nacional de Câncer do Ministério da Saúde, a ocorrência da primeira gravidez após os 30 anos aumenta as chances de casos deste tipo de câncer, que representa, nos países ocidentais, uma das principais causas de morte em mulheres.
Mas é possível tratar um câncer durante a gravidez? Segundo Rezende, sim. “É um tratamento que precisa estar bem coordenado para não gerar consequências para o bebê. Envolve o obstetra, o oncologista e o pediatra. A mãe faz a cirurgia para a retirada do tumor, faz quimioterapia em períodos administrados e em doses que não causem efeitos no feto e a última quimioterapia deve ser feita 28 dias antes de o bebê nascer”, explica.
Foi assim com a pedagoga Márcia da Silva de Barros, 40, de Mogi das Cruzes, Estado de São Paulo. Por um erro de diagnóstico, Márcia descobriu o tumor no seio direito apenas quando engravidou. “Quando completei 36 anos, fiz alguns exames admissionais. Entre eles, uma mamografia e um ultrassom das mamas. O médico pegou o resultado e me disse que estava tudo bem, que eu só deveria repetir os exames depois dos 40 anos”, conta. Como não tem nenhum caso de câncer na família, Márcia acatou as recomendações do médico.
Um ano após esses exames, a pedagoga engravidou e aos dois meses de gestação teve um aborto espontâneo. Três meses depois, engravidou novamente. “Foi então que eu percebi algo de errado com o bico do meu seio. Ele estava duro, estranho. Procurei meu médico que mal olhou e já disse que se tratava de um câncer”.
E por se tratar de um tumor em estágio avançado, a primeira indicação do plano de saúde foi o aborto. “Disseram que eu precisaria tirar meu bebê, mas eu não quis. Então fui para casa esperar o que seria decidido. Eu estava com medo, porque não sabia o que iria acontecer comigo e com meu filho”.
Márcia foi então encaminhada ao Hospital das Clínicas, em São Paulo, onde conheceu Waldemir Rezende. “Ele foi o único médico a dizer que eu poderia ter meu filho. Ele pegou a mamografia que havia feito e me explicou. O exame estava errado, não aparecia totalmente a parte do seio onde estava o tumor. Mesmo assim ele identificou e me mostrou”.
Para começar o tratamento, Márcia teve de completar três meses de gestação, quando pôde fazer a primeira cirurgia, em que foi retirada toda a mama. Um mês após a cirurgia, começaram as sessões de quimioterapia, completando um total de quatro a cada 21 dias. “É uma superação diária. Primeiro a retirada da mama, depois meu cabelo caiu completamente. É uma doença cruel que mexe com toda a família. Meu filho mais velho, na época com 12 anos, tinha muito medo de que eu fosse morrer”, diz.
Com 37 semanas de gestação, no dia 10 de janeiro de 2008, foi marcado o nascimento de Waldemir da Silva Barros, filho de Márcia. Durante a cirurgia, foi feita a retirada dos dois ovários, pois assim evitaria a evolução do câncer. “Segundo o dr. Waldemir, já havia metástase nos ovários”, afirma Márcia.
Márcia não pôde amamentar o filho, hoje com três anos, e continua em tratamento. “Continuo tomando remédios, que prejudicam muito o fígado. Mas o que dói mesmo é saber que se o primeiro diagnóstico tivesse sido feito corretamente, a situação teria sido completamente diferente.”
* Publicado originalmente no site O que eu tenho.