Jacarta, Indonésia, 3/7/2012 – Se como disse o líder da independência da Índia, Mahatma Ghandi, a “pobreza é a pior forma de violência”, então o governo da Indonésia é responsável por agressão perante 120 milhões de pessoas que vivem com menos de US$ 2 por dia. Sem ter suas necessidades básicas atendidas, como água potável, alimentação adequada, saúde, educação e vestimenta, Parwan, de 29 anos, se ajusta à definição de pobreza universalmente admitida. Mas não à do governo, que coloca a linha de pobreza em 7.800 rúpias (US$ 0,86) por dia, menos da metade da quantia fixada pelo Banco Mundial para suas medições.
No assentamento irregular do Rio de Ciliwung, no sul de Jacarta, que se estende ao longo de sua margem fétida, Parwan sobrevive em um barraco de um cômodo com sua mulher e um bebê. Mantém a família com pouco mais de 700 mil rúpias (US$ 75). É pouco provável que ele e milhões de pessoas na mesma situação, em um país de 240 milhões de habitantes, que se orgulha de ser a maior economia e de maior crescimento do sudeste da Ásia, recebam assistência das autoridades, que nem mesmo os reconhecem como pobres.
“Nossa linha de pobreza nacional está em 243.729 rúpias (US$ 25,76) mensais por habitantes desde setembro de 2011”, disse à IPS o porta-voz do Ministério do Bem-Estar, Tito Setiavan. A prolixa conta apagou dezenas de milhões de pobres. Segundo as estatísticas oficiais, a partir de setembro de 2011, cerca de 30 milhões de pessoas, 12% da população, vivem na pobreza. No entanto, de acordo com o Banco Mundial, metade da população vive com menos de US$ 2 ao dia, de acordo também com os critérios do Banco de Desenvolvimento Asiático.
Binny Buchori, assessora do Centro de Estudos de Bem-Estar Social da Indonésia, afirmou à IPS que o governo costuma sustentar que a pobreza diminui, mas não leva em conta as pessoas que vivem no limite da pobreza. “Quando sobem os preços, muita gente cai na categoria de pobre”, explicou. Em um país onde o arroz, alimento básico da dieta, custa o equivalente a US$ 0,85 o quilo, inclusive este produto fica fora do alcance da miríade de pobres. A refeição mais barata que se pode encontrar à beira do caminho, composta por arroz, ovo e verduras, chamada warung, custa 10 mil rúpias (US$ 1).
“Muitos trabalhadores de baixa renda comem somente uma vez ao dia. Ingerem banana frita pela manhã, um prato rápido de macarrão no almoço e, talvez, outra banana à noite”, detalhou Buchori. A desnutrição derivou na Indonésia em um atraso de moderado para severo no crescimento de 40% das crianças menores de cinco anos, segundo estudo da organização não governamental Save the Children. Os grandes centros comerciais, automóveis de luxo e altos edifícios proliferam no país tanto quanto as favelas e os mendigos.
“O desafio é a distribuição da riqueza, e uma das formas de fazer isso é com impostos, mas o governo não tem vontade de implantá-los”, comentou Buchori. A educação, o caminho para sair da pobreza em muitas partes do mundo, não é uma opção na Indonésia. “É gratuita, mas os pais devem pagar os uniformes, os livros, o transporte e, em muitos casos, também subornos à escola para que aceite seus filhos”, pontuou.
“Nos damos conta de que os problemas morais, como a corrupção, são nossa principal ameaça ao desenvolvimento”, afirmou o porta-voz Setiavan. A Indonésia tem 95% de matriculas no ensino primário, mas essa proporção cai para 58% no secundário, conforme estatísticas oficiais. “Há muito abandono no secundário, e apenas 6% da população termina a universidade”, disse Buchori.
Abigail, uma menina brilhante de sete anos que vive no bairro de Cipinang Elok, na capital, estuda no horário vespertino em uma fundação humanitária que ajuda os pais de baixa renda a pagar a matrícula. Ela tem grandes sonhos de um dia poder comprar um automóvel para seus pais e sua irmã e, talvez, algum dia viajar. “Gostaria de ser médica e curar minha família quando ficar doente”, contou com seus olhos escuros brilhando de esperança.
Apesar de ser brilhante, as perspectivas de Abigail cumprir seus sonhos são nefastas, segundo Buchori. “Para uma menina de seu entorno que vive em uma situação de pobreza não há muitas perspectivas. Talvez termine a escola secundária, mas o mais provável é que depois dos 15 anos abandone os estudos e, possivelmente, seja obrigada a trabalhar em uma fábrica ou como doméstica”, ressaltou.
O Banco de Desenvolvimento Asiático disse que a Indonésia é o único país do sudeste da Ásia onde a pobreza aumenta, apesar do crescimento de 6%, atribuído ao consumo interno de uma classe média em expansão. A riqueza combinada das 40 pessoas mais ricas do país é equivalente à de 60 milhões de pobres, ou mais de 10% do produto interno bruto nacional, segundo as últimas estatísticas.
“Apesar da retórica sobre a contribuição da classe média para o crescimento da Indonésia, 82% da população vive com menos de US$ 4 por dia e respondem por 58% do consumo das famílias”, segundo um estudo do Standard Chartered Bank. “O mercado ignorou de forma injusta o possível crescimento do consumo entre os pobres na próxima década”, diz o documento. Envolverde/IPS