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Egito paga o alto custo da mão de obra barata

Os salários não acompanham o crescente custo de vida no Egito. Foto: Cam McGrath/IPS
Os salários não acompanham o crescente custo de vida no Egito. Foto: Cam McGrath/IPS

 

Cairo, Egito, 10/10/2013 – Os trabalhadores egípcios que participaram do levante social de 2011, que derrubou o regime de Hosni Mubarak, aproveitaram os dois últimos anos e meio para organizar sindicatos, pressionar por reformas e fazer greve por melhores condições de trabalho e salários. Porém, ainda travam dura batalha contra um Estado que continua restringindo seus direitos e promovendo o país como um paraíso de mão de obra barata atraente para as grandes corporações.

“Nada mudou”, disse o jornalista e militante sindical Adel Zakaria. “O governo ainda não está disposto a reconhecer os direitos dos trabalhadores e faz vista grossa para violações trabalhistas, com o pretexto de atrair investimentos”. O regime autoritário de Mubarak (1981-2011) manteve sob rígido controle a força de trabalho, monopolizando a organização sindical, impedindo ações coletivas e obrigando os trabalhadores a apoiarem o partido do governo.

O Estado ignorou de maneira flagrante seus compromissos internacionais, negando direitos básicos e reprimindo. Segundo o economista Amr Adly, as políticas econômicas neoliberais e o impopular programa de privatizações do governo eram do agrado do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional, mas causaram desemprego e ampliaram a brecha entre ricos e pobres. “A economia cresceu rapidamente, mas a riqueza se concentrou em cima, sem repartir nada. A maioria ficou excluída do crescimento econômico”, disse Adly à IPS.

Em 2011, antes da queda de Mubarak, quase um quarto da população vivia na pobreza e milhões de pessoas participavam de uma enorme economia paralela onde a segurança trabalhista era inexistente. Quase dois milhões de egípcios recebiam salário mínimo mensal de 35 libras egípcias, cerca de US$ 5, segundo o câmbio atual. Na realidade, sobreviviam graças a outros benefícios e bonificações, que seus empregadores muitas vezes retinham como forma de pressão.

Nos últimos anos do governo de Mubarak, multiplicaram-se as greves reclamando benefícios atrasados e aumentos salariais. “Os protestos trabalhistas foram parte do descontentamento social e econômico que levou à revolução”, pontuou Adly. Os sucessores de Mubarak, tanto os militares como a Irmandade Muçulmana, mantiveram as mesmas políticas econômicas e se limitaram a conter o mal-estar dos trabalhadores, em lugar de atender suas causas.

Um estudo de 2009 da Organização Internacional do Trabalho concluiu que os salários no Egito estavam entre os menores de 72 países estudados. O salário mensal médio equivale a US$ 542, semelhante aos do México e da Tailândia e um terço do da Turquia. As condições econômicas que mudaram com a revolução, seguiram sua deterioração, reduzindo os salários. No ano passado, a pobreza afetava 25,2% da população.

A instabilidade política afugentou os investidores e devastou o setor turístico, antes a maior fonte de divisas do país. Dados do governo mostram que o desemprego passou de 9%, antes do levante de 2011, para mais de 13%, e que mais de um quarto dos jovens está sem trabalho. A inflação chega a 10%, e o elevado custo de vida agrava a pressão sobre os menos favorecidos. “Não se procurou vincular a evolução do salário ao custo de vida”, disse Zakaraia. “A maioria dos egípcios está pior agora do que antes da revolução”, acrescentou.

O levante de 2011 ajudou a conscientizar sobre os direitos na massa trabalhadora. Durante a caótica transição após a queda de Mubarak, foram organizados milhares de sindicatos independentes, desafinado o controle estatal. Essas organizações independentes, que se estima representam quase três milhões de trabalhadores nesse país de 85 milhões de habitantes, estiveram na vanguarda da última onda de protestos.

Zakaraia acredita que este movimento sindical emergente empoderou os trabalhadores. No ano passado, houve um recorde de duas mil ações coletivas para exigir melhores salários, pagamento de benefícios pendentes e reintegração de demitidos. Trabalhadores e trabalhadoras também exigem que o governo elimine as leis herdadas da era Mubarak e estabeleça controles para os salários.

“Nem todas as greves tiveram êxito. Na verdade, muitas fracassaram”, disse Zakaria à IPS. “Contudo, desde a revolução, governo e empregadores estão mais dispostos a negociar com os trabalhadores, em lugar de bater neles para serem submissos, embora ainda continuem apanhando”, acrescentou. Em outubro de 2011, o governo cedeu às pressões e reviu o salário mínimo pela primeira vez em 25 anos.

Mas foi uma vitória parcial, já que o aumentou o elevou para 700 libras egípcias (US$ 102), menos da metade do que pedia o movimento sindical. O governo atual prometeu elevar o salário mínimo que recebem seis milhões de trabalhadores do setor público para 1.200 libras egípcias (US$ 174), mas rejeitou os pedidos para estender o benefício aos 19 milhões do setor privado.

Fatma Ramadan, da Federação Egípcia de Sindicatos Independentes, afirma que o governo continua avaliando a exploração no setor privado, pois teme afugentar os investidores se fizer concessões aos trabalhadores. Segundo a Agência Central para a Mobilização Pública e Estatísticas, o salário médio dos trabalhadores públicos aumentou 29% este ano e é de US$ 124 por semana. Os salários no setor privado praticamente permaneceram inalterados.

“Os militares e os ‘feloul’ (fiéis ao antigo regime) intervêm para impedir que os trabalhadores gozem de seus direitos, como se organizar em sindicatos e realizar greves”, alertou Ramadan. “Eles argumentam que as paralisações afetam a economia. Mas os trabalhadores não devem abandonar seus direitos para proteger os interesses dos magnatas dos negócios”, ressaltou. Envolverde/IPS