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Egito pede ajuda ao Golfo

Uma mulher foge do gás lacrimogêneo durante distúrbios no Cairo. Foto: Hisham Allam/IPS
Uma mulher foge do gás lacrimogêneo durante distúrbios no Cairo. Foto: Hisham Allam/IPS

 

Cairo, Egito, 3/12/2-13 – “Os subsídios do mundo árabe são grandes e refletem o amor pelo povo do Egito, mas não podemos depender disso para construir uma economia que seja capaz de competir com outros países”, afirmou a economista Alia el Mahdi. Assim ela explicou a situação econômica egípcia depois que o atual governo solicitou reiteradamente ajuda financeira aos países do Golfo.

“Nossa dependência deles não deveria exceder a ajuda temporária, e não deveria se converter no pilar da economia nacional apenas para obter melhor qualificação creditícia internacional”, afirmou Alia. A qualificadora de risco Standard & Poor’s elevou, no dia 15 de novembro, sua nota de curto e longo prazos em termos de crédito em moeda local e estrangeira para o Egito, de “CCC+/C” para “B-/B”, com uma perspectiva de qualificação “estável”.

Em outubro, ao receber o primeiro-ministro do Egito, Hazem el Beblawi, o vice-primeiro-ministro dos Emirados Árabes Unidos, xeque Mansour Bin Zayed Al Nahyan, advertiu que o apoio árabe ao Cairo não duraria muito, por isso o novo governo egípcio deveria buscar “soluções inovadoras e pouco convencionais”. Ali, ex-decana da Faculdade de Economia e Ciência Política da Universidade do Cairo, afirmou à IPS que “as forças armadas deveriam deixar de financiar a economia nacional e voltar à sua missão essencial, que é manter a segurança nas fronteiras”.

Segundo a economista, os investimentos estrangeiros praticamente fugiram do Egito, como refletem as pequenas cifras que manejam especialistas e investidores de outros países que participam de conferências e seminários sobre economia no país. “Se queremos que voltem, então não há alternativa a não ser a estabilidade política e a segurança”, acrescentou.

“As pequenas indústrias do Egito, que representam 87% do volume das unidades industriais e 13% da produção, estão sendo muito prejudicadas”, detalhou Ali. O gabinete de El Beblawi teve uma grande oportunidade de frear a crise econômica que exacerbou o governo do deposto presidente Mohammad Morsi (2012-2013), “Mas não o fez”, ressaltou.

Salah Gouda, diretor do Centro de Estudos Econômicos do Cairo, afirmou que “o atual estado da economia do Egito se converteu em um desastre que exige intervenção imediata para salvá-la, antes que seja muito tarde”. Segundo Gouda, “as reservas monetárias baixaram de US$ 36 bilhões, em janeiro de 2011, para US$ 22 bilhões, no final de novembro de 2011. Depois baixaram para US$ 13,6 bilhões em março deste ano, porque, por não ser aproveitada plenamente a capacidade de produção, aumentaram as importações”.

O desemprego atingiu 15%, o que significa que neste país de 84 milhões de habitantes há cerca de dez milhões de pessoas sem trabalho, pontuou Gouda. “Todos esperavam muito do gabinete de El Beblawi, que prestou juramento depois do golpe militar de 3 de julho contra Morsi”, observou. “Porém, todas as crises que atingiam os egípcios enquanto Morsi esteve no poder continuam existindo: escassez de gás, trânsito congestionado, falta de segurança, e acidentes ferroviários”, ressaltou.

“Posso dizer que os primeiros cem dias do presidente interino Adly Mansour se pareceram com os primeiros cem dias de Morsi. Ambos foram decepcionantes”, apontou Gouda à IPS. Para ele, o regime atual desperdiçou o apoio público depois do levante de 30 de junho, além dos US$ 12 bilhões com os quais os países do Golfo o haviam ajudado.

“Apesar de tudo isto, o desempenho do governo foi ruim, e os ministros trabalharam apenas para atravessar o período atual sem ficarem expostos a questões legais mais tarde”, analisou Gouda. Agora, as forças armadas têm nas mãos as rédeas do Egito em muitas áreas, especialmente a economia. “Os militares têm muito interesse em manter seu prestigio”, destacou.

Outro problema do atual regime, segundo Gouda, é que, “depois que os investimentos estrangeiros deixaram o país devido à falta de segurança, muitos empresários pertencentes à Irmandade Muçulmana ou partidários de Morsi decidiram retirar seu capital para desferir um golpe econômico no sistema atual, e em certo grau conseguiram”.

Ali Fayez, ex-diretor da Federação de Bancos Egípcios, disse à IPS que “o sistema bancário deixou de financiar pequenos e grandes projetos, o que colocou centenas de empresários nas listas negras dos bancos por sua incapacidade de pagarem seus compromissos”. E acrescentou que os “subsídios europeus e do Golfo são vitaminas e analgésicos. Seria melhor que injetassem no Egito investimentos reais, porque os resultados seriam mais sustentáveis do que os pagamentos em dinheiro”.

“A dívida interna excedeu todos os limites seguros desde antes da revolução de 25 de janeiro de 2011, e todos os gabinetes que governaram desde a queda de Hosni Mubarak (1981-2011) dependeram de atrasar e reprogramar os pagamentos”, apontou Fayez à IPS. “Nenhum dos governos sucessivos tentou enfrentá-lo, e isso é visto como uma importante carga para as futuras gerações”, enfatizou.

Para Fayez, “a única diferença entre os dois governos, o da Irmandade Muçulmana e o atual, é que o primeiro dependeu da ajuda do Catar e da Turquia, enquanto o segundo depende da assistência dos Emirados Árabes Unidos, Kuwait e Arábia Saudita”. Envolverde/IPS