Eleições, embargos e aniversários
Miami, Estados Unidos, fevereiro/2012 – Deve ser porque há eleições no horizonte ou porque acabaram de acontecer. O caso é que ciclicamente o tema de Cuba se ergue no cenário e provoca uma série de declarações, condenações, desejos e, frequentemente, disparates.
Miami, Estados Unidos, fevereiro/2012 – Deve ser porque há eleições no horizonte ou porque acabaram de acontecer. O caso é que ciclicamente o tema de Cuba se ergue no cenário e provoca uma série de declarações, condenações, desejos e, frequentemente, disparates. Por trás desse novo episódio, que tem como duplo epicentro as cidades de Miami e Havana está um conjunto extremamente curioso de ingredientes. Se compõe das sequência da recente mudança de governo na Espanha, o começo da longa campanha de eleições primárias nos Estados Unidos para escolha do adversário de Obama, e uma coincidente série de aniversários incômodos com relação ao embargo norte-americano e a chamada “posição comum” da União Europeia (UE) sobre Cuba.
O primeiro ato foi protagonizado pelo novo chanceler da Espanha, José Manuel García Margallo, ao prometer emendar a diretriz de seu antecessor Miguel Angel Moratinos, em sua teimosia para eliminar a Posição Comum da UE sobre Cuba. Assim, condiciona-se um “pleno” tratamento da relação comunitária à execução de uma série de medidas de abertura por parte do regime cubano. Desde 1995, quando o então primeiro-ministro José María Aznar conseguiu a aprovação dessa medida (única perante países latino-americanos), que não é nem “posição”, nem “comum”, se desenvolveu um interminável balé nas duas margens do Atlântico, no qual o governo cubano brilhou com luz própria ao equiparar a “posição” com o embargo norte-americano.
Assim, tentou demonstrar que enfrenta “dois impérios” e poder justificar numerosas carências nos campos econômico e social, e justificar a manutenção do férreo sistema ditatorial. Nenhum governo europeu colocou obstáculos às suas empresas que operam em Cuba nem às férias de seus cidadãos na ilha.
Em busca de votos necessários, o congressista fundamentalista Newt Gingrich prometeu, se eleito, reativar a “lei Helms Burton”, como uma sentença de morte do regime cubano. Não se sabe bem se está se referindo ao Capítulo III, que é uma ameaça contra os investidores estrangeiros em Cuba, ou ao II, que foi qualificado como nova Emenda Platt, que codifica o final do embargo ao fim da ditadura. Se Gingrich se refere ao III, estaria abrindo uma nova guerra comercial com a União Europeia, catástrofe que evitaram Clinton, Bush e Obama, ao suspendê-la sistematicamente desde 1996. Se a referência for ao II, seria repetitivo, porque, teoricamente, está sem efeito. Contudo, acontece que apesar do embargo e de seus suplementos, os Estados Unidos se converteram no terceiro ou quinto (conforme o critério) sócio comercial de Cuba.
Simultaneamente, surge a coincidência temporal de aniversários, um tanto esquecidos ao longo da celebração ou condenação (segundo alguns) do 50º aniversário da Revolução Cubana em 1999. Entre final de janeiro e começo de fevereiro, se coloca a lembrança do meio século desde que Cuba foi expulsa da Organização dos Estados Americanos (OEA). Ao fim de febris negociações em busca de votos, o ministro de relações norte-americano Dean Rusk conseguiu a “colaboração” de Papa Doc do Haiti, graças ao pagamento da construção de um aeroporto em Porto Príncipe. Desde então, os Castros têm como grande orgulho a expulsão. Em recente tentativa de retorno, todos os protagonistas do hemisfério estavam de acordo… Menos Cuba e Estados Unidos.
Alguns dias depois, em 3 de fevereiro de 1962, Kennedy assinava uma lei, baseada em legislação da I Guerra Mundial referente a um embargo contra o “inimigo”, dando o toque final a um embargo total contra Cuba, que até então vinha sendo escalonadamente parcial, desde os anos de Eisenhower. Assim, Washington respondeu a cada uma das provocações de Cuba com relação ao confisco de propriedades.
Por sua vez, Castro “ajudou” Washington nas represálias, já que justamente enquanto era preparada a invasão da Baía dos Porcos se declarou marxista por toda a vida. Como fez em 1996, quando a lei Helms-Burton não estava certa de receber o voto congressista e decidiu derrubar os aviões da organização Irmãos no Resgate, que se aventuraram em lançar panfletos sobre Havana. Clinton respondeu de acordo com a partitura. Não se sabe bem o que acontecerá nas três frentes mencionadas (eleições, embargo e posição da UE), mas certamente algum dos protagonistas saberá tirar vantagem (Raúl Castro?, que não tem o peso de eleições) e alguém nos Estados Unidos cobrirá as costas.
De todo modo, não se acredita que Obama chegue ao sarcasmos extremo de Kennedy. Algumas horas antes de assinar uma nova escalada de embargo parcial em pleno ano de 1961, pouco tempo depois da Baía dos Porcos, Kennedy ordenou ao seu secretário de imprensa, Pierre Salinger, que lhe comprasse mil charutos cubanos. Legalmente falando, não burlou a lei. Envolverde/IPS
* Joaquín Roy é catedrático Jean Monnet e diretor do Centro da União Europeia da Universidade de Miami (jroy@Miami.edu).




