O que esperar da Rio+20? Pelo menos, que ela não sirva apenas como uma mera comemoração pelos vinte anos da Eco-92. Que não se perca ali uma oportunidade de se travar um debate de avanço na seara climática. A repetição do país e da cidade sede do evento dos anos noventa não pode significar a perpetuação da mentalidade daquela época. Ao contrário, a reunião de 2012 deve estar de acordo com os novos ditames da política climática mundial. Afinal, não se pode falar em desenvolvimento sustentável sem se atentar para a quantidade de emissões de gases de efeito estufa (GEE’s) pelos países emergentes – justamente aqueles que não possuem metas de redução desses gases estipuladas no plano internacional.
É que pela Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (QCNUMC), os países que não fazem parte do Anexo I (composto pelos Estados considerados desenvolvidos), não possuem metas de redução de GEE’s no âmbito do Protocolo de Kyoto, instrumento jurídico que estabelece, dentre outros aspectos importantes, o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). Em outras palavras, no atual contexto internacional grandes poluidores estão livres de qualquer obrigação nesse mister, unicamente por serem considerados “em desenvolvimento”.
O critério do grau de desenvolvimento dos países, utilizado quando da adoção do Protocolo de Kyoto, em 1997, além de não mais refletir a realidade da década de 1990, deveria ser trocada para quantidade de emissão de GEE’s.
Assim, um país como o Brasil, quarto maior emissor mundial, passaria a fazer parte do rol de países com metas obrigatórias estabelecidas em um tratado internacional. Seria uma flexibilização do Princípio da Participação Comum, Porém Diferenciada, presente no Direito Internacional do Clima desde a reunião de Estocolmo (1972). Dessa forma, a equidade seria de fato alcançada, posto que o binômio grau de desenvolvimento versus quantidade de emissões há muito se encontra desequilibrado, posto que muitas vezes um país Não Anexo I (sem metas) encontra-se no topo dos maiores emissores de gases nocivos.
Em verdade, a fixação de metas obrigatórias no cenário internacional para o Brasil significaria apenas um ajuste às suas metas voluntárias, inseridas no ordenamento jurídico pátrio, em 2009, pela Lei da Política Nacional sobre Mudança do Clima (nº 12.187). No entanto, para outros emergentes que também seriam afetados, como a China – maior emissora em números absolutos e próxima de ultrapassar os Estados Unidos quando analisadas as emissões per capita –, significaria mudanças profundas no sistema econômico.
É justamente aí que reside toda a peleja quanto ao Protocolo, sua prorrogação, ou sua substituição por um novo acordo climático: enquanto grandes emissores, a exemplo dos Estados Unidos, não ratificaram Kyoto e não se mostram inclinados a gestos mais afirmativos nesse sentido num futuro próximo, países emergentes, ressentidos com esta postura dos desenvolvidos, utilizam esse imbróglio como desculpa para a não celebração de um novo protocolo que venha substituir Kyoto.
Ainda que os países do Anexo I relutem em definir-se pela prorrogação de Kyoto ou por sua substituição por um novo acordo, é certo que os emergentes não poderão perpetuar sua condição de países sem metas, pelo altíssimo grau de poluição que apresentam. Apesar de a reunião Rio+20 não ser específica sobre o tema mudanças climáticas, certo é que as discussões ali havidas não poderão ignorá-lo. A perspectiva, inclusive, é de que a reunião do Rio de Janeiro seja mais produtiva na discussão sobre um novo Kyoto que a própria COP-17, a se realizar em dezembro deste ano em Durban, na África do Sul.
Nesse diapasão, os países emergentes deverão ser os grandes protagonistas de um novo tratado internacional sobre mudança do clima, que contemple a nova ordem mundial e estabeleça para esses Estados metas de redução de GEE’s, ainda que diferenciadas das dos países do Anexo I.
* Gustavo Vilas Bôas é consultor, advogado e mestre em Regulação da Indústria de Energia – [email protected].
** Publicado originalmente no site CarbonoBrasil.